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O que é a 'Teoria do Louco' que Trump pode estar usando com a Coreia do Norte - e quais são seus riscos

AFP
Imagem: AFP

Gerardo Lissardy

BBC Mundo, Nova York

26/09/2017 10h32

Muitos acreditam que o presidente dos EUA, Donald Trump, usa a "Teoria do Louco" ("Madman Theory", em inglês) para lidar com a Coreia do Norte. Se isso for verdade, o fato de ter sido chamado de "mentalmente perturbado" pelo líder norte-coreano Kim Jong-um pode ter representado uma conquista para o líder americano.

A ideia da "Teoria do Louco" é se colocar como alguém imprevisível ou disposto a encarar um enfrentamento a qualquer custo na tentativa de dissuadir o inimigo. Se um dos lados acredita genuinamente que o outro é capaz dar início a um combate, pode ceder às demandas dele para evitar o pior, como, por exemplo, um ataque nuclear.

A "Teoria do Louco" prevê que o comportamento supostamente irracional seja deliberado, ou seja, o comportamento supostamente imprevisível - que passa a impressão de que uma loucura pode ser cometida a qualquer momento - não é verdadeiro, mas crível o suficiente para enganar o lado oposto. Assim, nunca se sabe ao certo se a pessoa está se passando por louca ou se realmente é um indivíduo instável.

As especulações de que Trump tenha seguido essa estratégia em sua política externa surgiram antes mesmo dele assumir a Presidência dos EUA em janeiro. Ainda durante a campanha, ele lançou mão da carta da imprevisibilidade ao se posicionar sobre temas internacionais.

"Temos que ser imprevisíveis", respondeu Trump no ano passado, quando o jornal The Washington Post lhe perguntou sobre o que pretendia fazer em relação à expansão chinesa. "Somos muito previsíveis, e o previsível é ruim."

Mas as suspeitas de que Trump aplica a Teoria do Louco na política externa aumentaram no mês passado, quando prometeu responder com "fogo e fúria" a ameaças Coreia do Norte.

Os motivos para acreditar que o norte-americano é adepto da estratégia da imprevisibilidade ganharam ainda mais força esta semana quando Trump foi à Assembleia Geral das Nações Unidas e disse que os EUA estão preparados para "destruir totalmente" a Coreia do Norte.

No sábado, um dia após o segundo lançamento, pelo regime de Kim Jong-un, de um míssil intercontinental, a tensão escalou quando bombardeiros B-1B americanos, escoltados por jatos de combate, sobrevoaram a península coreana - no que o Pentágono classificou de "demonstração de força".

Mas será que Donald Trump realmente quer que Pyongyang o veja como louco? Qual o risco de enfrentar um regime tão fechado que alega ter armas nucleares?

Precedente

A imagem do ex-presidente Richard Nixon (1969-1974) há anos é associada à Teoria do Louco. Ele foi o primeiro presidente dos EUA a quem se atribuiu o uso da estratégia, supostamente para intimidar a União Soviética e também a Coreia do Norte. A ideia era fazer com que os membros do bloco comunista pensassem que o então presidente americano era inconstante e irracional.

H.R. Haldeman, que foi chefe de gabinete de Nixon, escreveu que o ex-presidente lhe falou sobre a teoria quando disse querer que os vietnamitas do norte pensassem que ele poderia fazer "qualquer coisa" para por um fim à Guerra do Vietnã, sabendo que tinha nas mãos o "botão nuclear".

Trump tem salientado que também controla ferramenta similar. Fez isso no dia seguinte ao comentário em que prometeu "fogo e fúria", palavras que integrantes do governo norte-americano descreveram como espontâneas.

Enquanto o secretário de Estado, Rex Tillerson, tranquilizava aliados negando que houvesse uma ameaça iminente à Coreia do Norte, Trump usou sua conta no Twitter para afirmar que sua primeira ordem como presidente foi "renovar e modernizar" o arsenal nuclear dos EUA.

"Espero que nós nunca precisemos usar esse poder, mas nunca haverá um tempo em não sejamos a nação mais poderosa do mundo", postou em 9 de agosto.

Diversos analistas americanos comentam abertamente sobre a possibilidade de Trump estar seguindo a linha de Nixon para tentar amedrontar os norte-coreanos.

"Pode ser que você ache que a Teoria do Louco é a teoria certa aqui", disse David Brooks, colunista do jornal The New York Times no programa PBS Newshour. "Eu acho que pode ser muito eficaz, desde que você não esteja realmente louco."

Como se trata de uma estratégia que não é anunciada, sempre haverá dúvidas sobre o uso da "Teoria do Louco".

Pode ser que Trump realmente esteja sendo direto quando alerta para o risco de uma guerra devastadora com a Coreia do Norte se os EUA forem obrigados a, como disse na Assembleia da ONU, "se defender ou a defender seus aliados".

Lógica da rua

Joan Hoff, uma historiadora que publicou livros sobre Nixon e sobre a polícia exterior dos EUA, sustenta que não há certeza de que o então presidente realmente empregara a Teoria do Louco como sugerira Haldeman.

"Sempre se fala isso sobre Nixon, mas Nixon sabia muito sobre política externa para adotar um enfoque tão simplista", disse Hoff à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC.

Contudo, ela diz que a teoria "provavelmente se aplica a Trump, porque ele nada sabe sobre relações internacionais".

Diante da dúvida se a postura de Trump é intencional ou não, há o receio de que essa suposta "imprevisibilidade" do atual presidente possa ser perigosa.

"Pode haver algum mérito na Teoria do Louco desde que você esteja numa crise", disse David Petraeus, general da reserva dos EUA, em um debate na Universidade de Nova York há alguns dias.

"Você não quer que o outro lado pense que você pode ser irracional o suficiente para conduzir um primeiro ataque ou fazer algo impensável", advertiu.

Muitos também acreditam que o líder norte-coreano Kim Jong-un também segue a "Teoria do Louco" para se fazer respeitar em sua região e nos Estados Unidos.

No Twitter, o próprio Trump definiu Jong-un como "um louco que não se importa em morrer de fome ou matar seu povo".

No entanto, outros o veem de forma diferente.

"Kim Jong-um não é um louco, é muito calculista", disse Howard Stoffer, especialista em segurança nacional que trabalhou por 25 anos no serviço diplomático dos EUA. "Lança comunicados que são bombásticos e beligerantes, mas ele não lançou mísseis contra os Estados Unidos ou a Coreia do Sul."

Na sua opinião, falar duro e ser imprevisível quando se tem um cargo com tantas responsabilidades vai contra os interesses globais.

"É uma lógica de rua, que funciona quando você é um garoto do bairro e há gangues. Isso não funciona na diplomacia internacional", disse Stoffer à BBC Mundo. "O mundo funciona se tiver estabilidade e todos são previsíveis."