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Qual pode ser a estratégia de Kim Jong-un em sua visita surpresa à China?

Líder norte-coreano, Kim Jong-un, e o presidente chinês, Xi Jinping, brindam durante jantar no grande salão do povo em Pequim - KCNA/AFP
Líder norte-coreano, Kim Jong-un, e o presidente chinês, Xi Jinping, brindam durante jantar no grande salão do povo em Pequim Imagem: KCNA/AFP

28/03/2018 17h42

A visita do líder norte-coreano, Kim Jong-un, ao presidente chinês, Xi Jinping, em Pequim, causou surpresa na comunidade internacional e levantou questionamentos sobre quais os próximos passos de Kim para lidar com a crescente pressão externa contra seu programa nuclear.

Após dois dias de especulação, a China e a Coreia do Norte confirmaram que Kim viajou à capital chinesa, Pequim, para uma visita não oficial, entre o último domingo (25) e esta quarta-feira (28). É a primeira viagem internacional conhecida de Kim desde que ele assumiu o poder, em 2011.

O encontro marca uma reaproximação entre a Coreia do Norte e o país que é seu grande parceiro econômico, além de pavimentar o caminho para uma eventual reunião entre Kim e o presidente dos EUA, Donald Trump.

Mas o que a visita significa para a Coreia do Norte e para o resto do mundo, e como ela se insere na estratégia de Kim? Veja a análise dos especialistas e correspondentes da BBC:

Imagem divulgada pela agência norte-coreana mostra Kim Jong-un partindo de trem em estação de Pequim - AFP PHOTO / KCNA VIA KNS  - AFP PHOTO / KCNA VIA KNS
Imagem divulgada pela agência norte-coreana mostra Kim Jong-un partindo de trem em estação de Pequim
Imagem: AFP PHOTO / KCNA VIA KNS

Aquecer relações com a China

O encontro em Pequim parece ser uma tentativa de reatar laços com a China em um momento crucial.

Durante meses, Pyongyang e Pequim tiveram as relações estremecidas, sobretudo quando Xi Jinping apoiou as sanções internacionais à Coreia do Norte e vetou as importações de carvão norte-coreano (o maior produto de exportação do país). Em resposta, o regime norte-coreano chegou a dispensar um enviado chinês que tentou visitar Pyongyang no ano passado.

Mas há estimativas de que a China responda por 90% de todo o comércio internacional norte-coreano. Vem da China a maioria dos mantimentos, combustível e maquinário consumidos na Coreia do Norte.

Além de maior parceiro comercial, trata-se também do único aliado de Pyongyang - portanto, um agente crucial perante as tentativas de Kim de se impor na arena internacional.

Recentemente, Kim havia convidado o presidente sul-coreano, Moon Jae-in, e Donald Trump para encontros bilaterais. A visita a Pequim pode ser uma tentativa de compensar a ausência de um convite também à China.

O lado de Pequim

Ao mesmo tempo, para Pequim, a Coreia do Norte envolve muitas questões complexas.

Por um lado, não convém um colapso econômico ou político da Coreia do Norte, sob o risco de milhões de refugiados norte-coreanos acabarem cruzando a fronteira chinesa.

Por outro, especula-se que uma parte crescente da elite chinesa veja os laços entre China e Coreia do Norte como um impedimento à ambição chinesa de consolidar-se como a grande superpotência global.

Para completar, as sanções internacionais a Pyongyang também são uma questão dúbia na China: segundo a ONU, muitos empresários chineses ignoram as restrições e seguem praticando trocas comerciais com a Coreia do Norte.

A questão nuclear

Ante as tensões multilaterais, é significativo que Kim tenha feito sua primeira viagem internacional à China, antes dos encontros com Moon e Trump.

Segundo a imprensa chinesa, no encontro, Kim disse a Xi que, como a "situação estava evoluindo muito rapidamente", achou melhor ir a Pequim pessoalmente "por camaradagem e responsabilidade moral".

E, o que é mais crucial, quando Xi afirmou que a China mantém o objetivo da "desnuclearização da península coreana", Kim respondeu que "é nossa posição consistente ser comprometido com a desnuclearização".

Isso soa contraditório ante os diversos testes nucleares realizados por Kim, mas o argumento defendido por ele é de que, se os agentes envolvidos se sentissem suficientemente seguros, não haveria necessidade de ter um programa nuclear.

A frase dita por Kim a Xi pode demonstrar que os norte-coreanos estão pavimentando o caminho para um desarmamento que trabalhe a favor de sua reputação.

Kim Jong-Un e Donald Trump - Reprodução/crna.gora.me - Reprodução/crna.gora.me
Imagem: Reprodução/crna.gora.me

Relações com os EUA

No que diz respeito aos EUA, vale lembrar que Trump recentemente apontou dois nomes linha-dura para a política externa - o ex-chefe da CIA Mike Pompeo vai assumir o Departamento de Estado e o diplomata John Bolton passará a chefiar o Conselho de Segurança Nacional.

Nesse cenário, é possível que Kim calcule que um encontro com Trump resulte em um ultimato para que o norte-coreano abandone seu programa nuclear.

Ao se reunir antes com Xi Jinping, Kim quer demonstrar que não está sozinho - e que tem um aliado de peso que pode ajudar a acalmar os ânimos caso o encontro termine mal.

Nos bastidores, há uma grande expectativa com o encontro por parte dos negociadores americanos.

Os detalhes, porém, ainda estão sendo definidos. Trump costuma deixar em aberto sua estratégia e seus limites de negociação, e o mesmo deve ocorrer na reunião com Kim.