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O que há por trás da ascensão da extrema-direita na Finlândia e o efeito no resto da Europa

A extrema-direita ficou em segundo lugar nas eleições, por uma margem muito pequena de diferença em relação ao Partido Social Democrata - Reuters/BBC
A extrema-direita ficou em segundo lugar nas eleições, por uma margem muito pequena de diferença em relação ao Partido Social Democrata Imagem: Reuters/BBC

15/04/2019 11h21

A Finlândia está vivendo um momento político complexo, com repercussões que podem ir além de suas fronteiras.

O país celebrou no fim de semana a vitória do Partido Social Democrata (SPD), com 17,7% dos votos, nas eleições parlamentares.

"Pela primeira vez desde 1999, somos o partido mais votado na Finlândia", declarou o líder do SPD, Antti Rinne.

Mas a vitória foi apertada: o partido dos Verdadeiros Finlandeses, de extrema-direita, ficou em segundo lugar com 17,5% dos votos, conseguindo recuperar o apoio popular que havia perdido.

Com isso, a expectativa é que os Verdadeiros Finlandeses - que defendem o movimento anti-imigração - tenham apenas um assento a menos que o SPD no Parlamento finlandês, formado por 200 membros.

O número de votos no partido de extrema-direita foi mais alto do que o projetado pelas pesquisas e, embora seja improvável que vá fazer parte do governo, especialistas acreditam que sua voz terá peso na política do país e provavelmente na Europa.

As legendas que atualmente formam a coalizão do governo, o Partido do Centro, do primeiro-ministro finlandês, Juha Sipilä, e o partido conservador Kokoomus, permaneceram com 13,8% e 17% dos votos, respectivamente.

Esta é a primeira vez em um século que nenhum partido conquista mais de 20% dos votos nas eleições gerais, o que indica uma negociação complicada para formar o próximo governo de coalizão.

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Como a Finlândia chegou até aqui?

O sistema de saúde e bem-estar social do país, pilar do modelo social nórdico, foi um dos temas principais desta eleição.

Os partidos de esquerda defendem preservá-lo por meio do aumento de impostos, enquanto o de centro-direita está inclinado a fazer cortes em decorrência do alto custo.

No mês passado, Sipilä pediu demissão do seu governo após fracassar em aprovar as reformas.

Preocupado com o alto custo do sistema diante do envelhecimento da população, Sipilä estabeleceu como uma de suas principais metas reduzir a dívida do país, por meio de reformas para economizar 3 bilhões de euros em uma década.

As medidas de austeridade - redução de serviços sociais ou congelamento de pensões - tiveram efeito: a Finlândia reduziu sua dívida pública pela primeira vez em uma década no ano passado, mas as reformas foram muito impopulares e politicamente controversas.

Neste contexto, o Partido Social Democrata, de centro-esquerda, que é fortemente ligado aos sindicatos do país, viu sua popularidade aumentar, dado o crescente sentimento de insegurança entre os eleitores mais velhos e de baixa renda.

O que aconteceu com a extrema-direita?

Já um dos motivos da ascensão dos Verdadeiros Finlandeses, destacado pela imprensa local, foi a chegada do deputado Jussi Halla-aho, de uma ala mais radical, à liderança do partido em 2017.

Nas eleições deste fim de semana, Halla-aho, que foi multado pela Suprema Corte em 2012 por ter feito comentários em um blog relacionando o Islã à pedofilia e os somalis ao roubo, se manteve como o político mais popular no país, segundo a agência de notícias Reuters.

Depois de dois anos em um governo de coalizão que impôs duros cortes aos benefícios sociais em 2015 e enfrentou a pior crise migratória no país, os Verdadeiros Finlandeses apostaram na liderança de Halla-ho, que promoveu a guinada do partido para a extrema-direita.

Ao assumir o posto, ele pediu uma estratégia "mais agressiva" da União Europeia em relação à imigração, e suas divergências com o primeiro-ministro levaram à expulsão dos Verdadeiros Finlandeses da coalizão de governo.

A imigração também foi uma questão crucial nessas eleições após várias denúncias de abuso sexual de menores por homens estrangeiros.

Como resultado, a popularidade dos Verdadeiros Finlandeses, que prometiam reduzir a imigração e implementar regras mais rígidas para conceder asilo, aumentou nos últimos meses.

Halla-aho defendeu no passado que os finlandeses haviam gasto demais com problemas como a imigração e a mudança climática, outro tema importante da campanha, à custa do bem-estar de seus cidadãos.

Enquanto outros partidos chegaram a defender medidas ambiciosas, como deixar de consumir todos os tipos de hidrocarbonetos nos próximos 20 anos, os Verdadeiros Finlandeses adotaram uma retórica mais cética sobre as novas regulamentações ambientais.

A posição do partido a este respeito - que é contra o imposto proposto sobre o consumo de carne, por exemplo - atrai especialmente os eleitores das áreas rurais, preocupados com o aumento dos preços da gasolina e refratários a qualquer mudança no que consideram "o tradicional modelo de vida finlandês", informou a agência Reuters.

"A Finlândia não é capaz de salvar o mundo. Já fizemos a nossa parte", defendeu o líder do partido, se referindo às políticas de combate às mudanças climáticas.

Os Verdadeiros Finlandeses são o único grupo no país - que, segundo a Organização Mundial de Saíde (OMS), apresenta a melhor qualidade de ar do mundo -, que defende que o próximo governo não deveria acelerar a redução das emissões de carbono para combater a mudança climática.

Como pode afetar a Europa?

O resultado das eleições na Finlândia também pode ter impacto para além de suas fronteiras.

O país se prepara para ocupar a presidência da União Europeia no próximo mês de julho, e a ascensão dos Verdadeiros Finlandeses, de tendência eurocética, pode afetar a formulação de políticas no bloco.

Soma-se a isso as eleições para o Parlamento Europeu que acontecem em menos de dois meses, para as quais os Verdadeiros Finlandeses já anunciaram uma aliança com os partidos de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD), Partido Popular Dinamarquês (DPP) e Liga italiana.

Competindo por diferentes países, seu objetivo é formar um grupo parlamentar, a Aliança Europeia dos Povos e das Nações, para desafiar o poder dos partidos de centro.

"O objetivo é ser o grupo europeu mais numeroso. Temos o objetivo de vencer e mudar a Europa", disse o líder da Liga, Matteo Salvini, na apresentação do plano em Milão, em 8 de abril.

Da esquerda para a direita: Olli Kotro (VG), Jörg Meuthen (AfD), Matteo Salvini (Liga) e Anders Vistisen (DPP) - AFP/BBC - AFP/BBC
Da esquerda para a direita: Olli Kotro (VG), Jörg Meuthen (AfD), Matteo Salvini (Liga) e Anders Vistisen (DPP)
Imagem: AFP/BBC

Apesar da iniciativa, não se sabe se os partidos nacionalistas concordam em muitos aspectos.

Embora sejam contra a imigração ilegal, seus pontos de vista em relação à política económica e à política externa podem ser muito diferentes.

No atual Parlamento Europeu, estes partidos estão divididos em vários grupos.

A AfD pertence hoje ao grupo Europa da Liberdade e da Democracia Direta (EFDD), enquanto o Partido Popular Dinamarquês e os Verdadeiros Finlandeses fazem parte dos Conservadores e Reformistas Europeus (ECR).

A Liga de Salvini, por sua vez, está no grupo Europa das Nações e das Liberdades (ENF), junto ao partido francês Frente Nacional (FN), de Marine Le Pen.

"Somos parte de famílias políticas diferentes (...) Mas o importante é que estamos ampliando as alianças, estamos trabalhando para tornar realidade um novo sonho europeu, embora para alguns em Bruxelas isso seja um pesadelo", declarou Salvini.

No evento em Milão, no entanto, foi sentida a ??ausência de partidos de tendência similar na Europa, incluindo o liderado por Le Pen na França e pelo primeiro-ministro Viktor Orban na Hungria.