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CPI da Covid: quem é Francisco Maximiano, que mantém silêncio em depoimento sobre caso Covaxin

Maximiano é sócio-administrador da Precisa Medicamentos, representante da Bharat Biotech no Brasil - Wallace Martins/Futura Press/Estadão Conteúdo
Maximiano é sócio-administrador da Precisa Medicamentos, representante da Bharat Biotech no Brasil Imagem: Wallace Martins/Futura Press/Estadão Conteúdo

19/08/2021 13h27Atualizada em 19/08/2021 15h46

As investigações da CPI da Covid em torno do contrato de aquisição da vacina indiana Covaxin têm um capítulo importante nesta quinta-feira (19), com o depoimento do empresário Francisco Maximiano. Até o momento, no entanto, ele tem se recusado a responder a diversas perguntas, amparado por um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Maximiano é sócio-administrador da Precisa Medicamentos, representante no Brasil da Bharat Biotech, fabricante da vacina — até o momento, com o preço mais alto entre as adquiridas pelo governo federal na pandemia, embora o contrato esteja suspenso no momento.

O tema se tornou prioritário na CPI desde o depoimento dos irmãos Luis Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde, e Luis Miranda, deputado federal pelo DEM no Distrito Federal.

Segundo Luis Ricardo, as invoices (ou notas fiscais internacionais) emitidas em março para a compra das vacinas divergiam do contrato firmado pelo Ministério da Saúde nas seguintes questões: na quantidade de doses a serem entregues ao Brasil, na exigência de um pagamento antecipado de US$ 45 milhões e na inclusão de uma empresa até então externa às negociações — a Madison Biotech —, em vez da Bharat ou da Precisa Medicamentos.

Segundo mensagem que consta dos documentos entregues pelos Miranda, a Precisa explicou que a Madison Biotech tem o mesmo quadro societário que a Bharat e é usada em todas as suas exportações.

Ao mesmo tempo, Luis Ricardo também disse ter recebido uma pressão atípica para autorizar as invoices — e que recebeu diversas ligações, inclusive uma do próprio Francisco Maximiano, para agilizar o processo.

Além disso, ele afirmou que chamou sua atenção o prazo de validade das vacinas: o lote prometido pela empresa inicialmente (e que nunca chegou a ser enviado, uma vez que não houve autorização da Anvisa para tal) expiraria em abril e maio.

As suspeitas de irregularidades nessas negociações embasaram uma notícia-crime protocolada no Supremo Tribunal Federal na última terça-feira (28) por três senadores.

O caso também é considerado central para o chamado "superimpeachment", que é a proposta de aglutinação dos mais de 120 pedidos de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro. Isso porque os irmãos Miranda disseram ter levado suas suspeitas ao conhecimento de Bolsonaro em 20 de março (leia mais abaixo).

O presidente afirmou que o caso vai ser investigado; posteriormente, disse: "não tenho como saber o que acontece nos ministérios. Vou na confiança em cima de ministros e nada fizemos de errado".

O relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou aos jornalistas que "essa negociação da Covaxin é completamente eivada de irregularidades e fraudes, em todo sentido. É a vacina com menor tempo de validade e com maior preço. É a única aquisição que tinha um atravessador, a Precisa. Esse atravessador pediu adiantamento e indicou para receber esse adiantamento empresa constituída em paraíso fiscal, para claramente burlar o controle e a fiscalização".

Já senadores governistas acusam os irmãos Miranda de usar a primeira invoice da Madison Biotech como base para acusações de irregularidades. A invoice sofreu correções nos dias seguintes.

"(Houve) uma situação normal de correção de dados do dia 22 para 23 (de março), tudo sanado. Mas eles (Miranda) vão à mídia com um documento que havia sido corrigido e já se sabia que estava corrigido. Com que motivação? Para gerar constrangimento?", afirmou o senador Marcos Rogério (DEM-RO).

Em seu depoimento, os Miranda afirmaram que a invoice só foi corrigida porque eles acionaram o presidente da República e afirmaram que a pressão sofrida por Luis Ricardo não havia ocorrido com nenhum outro contrato de vacina - só com o da Covaxin.

'Mesmo preço de outros países'

A Precisa Medicamentos, por sua vez, diz que a compra foi legal e seguiu os padrões da Bharat. Em nota enviada à BBC News Brasil, a empresa afirmou que a dose "vendida para o governo brasileiro tem o mesmo preço praticado a outros 13 países que também já adotaram a Covaxin".

"O valor é estabelecido pelo fabricante, no caso a Bharat Biotech. No mercado internacional, o imunizante tem sido oferecido entre US$ 15 e US$ 20", diz ainda o comunicado.

Segundo a Precisa Medicamentos, a vacina foi vendida por valor menor ao governo indiano devido aos investimentos estatais feitos no seu desenvolvimento.

"A estrutura para produção da vacina com vírus inativo é maior, e isso acaba refletindo no custo final do produto. O governo federal indiano investiu no desenvolvimento do estudo clínico e do produto, antecipando o pagamento de 100 milhões de doses da Covaxin. Face a esse investimento, a fabricante estipulou em US$ 2 o valor da dose especificamente para o governo federal indiano", afirmou a nota.

Em comunicado publicado em seu site, a Precisa declarou que "as tratativas entre a empresa e o Ministério da Saúde seguiram todos os caminhos formais e foram realizadas de forma transparente junto aos departamentos responsáveis" e se colocou "à disposição dos senadores da CPI e órgãos de controle para prestar todos os esclarecimentos necessários".

No dia 29 de junho, o Ministério da Saúde informou que o contrato da Covaxin, que previa a compra de 20 milhões de doses, está temporariamente suspenso, por recomendação da Controladoria-Geral da União (CGU).

Segundo a pasta, a CGU não encontrou irregularidades no contrato, mas ele passará por "uma análise mais aprofundada do órgão de controle". O ministério também afirmou que até o momento "não pagou nem um centavo pela Covaxin".

O elo com Ricardo Barros

Quando levaram as suspeitas a Jair Bolsonaro, os irmãos Miranda disseram ter ouvido do presidente que o suposto esquema seria "coisa do Ricardo Barros", deputado federal do Paraná pelo Progressistas (PP) e um dos principais nomes do Centrão, bloco informal da Câmara que garante a sustentação política do presidente hoje.

Barros foi ministro da Saúde no governo de Michel Temer e hoje é investigado pelo Ministério Público por causa da compra supostamente fraudulenta de R$ 20 milhões em medicamentos para doenças raras da empresa Global Gestão de Saúde.

Essa empresa também é presidida por Francisco Maximiano. O empresário teve seu sigilo bancário e telefônico quebrado pela CPI, decisão que foi mantida pelo STF, além de ter sido convocado para depor.

O depoimento estava previsto para ocorrer inicialmente em 23 de junho, mas o empresário alegou ter chegado recentemente de uma viagem à Índia e, por isso, estava em quarentena por duas semanas. Seu depoimento foi remarcado para esta quinta-feira.

O empresário pediu um habeas corpus ao STF para poder ficar em silêncio e se retirar da sessão "caso seja alvo de condutas vexatórias no decorrer de sua inquirição". Seu pedido foi acatado, parcialmente, pela ministra Rosa Weber, "para assegurar ao paciente o direito ao silêncio, de não responder a perguntas potencialmente incriminatórias (...) e de não sofrer constrangimentos".

Com isso, poderia, na prática, ficar em silêncio, assim como fez o empresário Carlos Wizard durante praticamente toda a sessão desta quarta-feira.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.