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Opinião: Nada de novo na Venezuela

Ofelia Harms Arruti

21/05/2018 06h28

A amplamente contestada vitória de Maduro, com abstenção recorde, desperta apenas desespero e um sentimento de impotência entre os venezuelanos. Quem pode foge; quem fica é obrigado a fechar os olhos.Esse tipo de comemoração os venezuelanos já conhecem bem demais: "A tendência é irreversível", disse a chefe da autoridade eleitoral por volta das 22h, após quatro horas de espera. O altamente moderno e digitalizado sistema de votação, afirmou, deu 68% dos votos para Nicolás Maduro. O velho presidente é também o novo.

Um "recorde histórico", declarou o vencedor: nunca antes um candidato presidencial havia vencido com tão expressiva votação, uma distância de 47 pontos percentuais para o adversário. No discurso de vitória, também não perdeu a chance de, mais uma vez, atacar seu rival: o candidato opositor Henri Falcón vira, na boca de Maduro, "Falsón".

O estilo de Maduro não é novidade para ninguém. Ele não hesita em mandar outros chefes de Estado "ao inferno" e não se envergonha de responder a cartas críticas da população com obscenidade. Seu descaramento pode despertar um sorriso amarelo de quem assiste de longe, mas logo deixa de ser engraçado, quando se pisa em seu país: a Venezuela está desmoronando.

Se sob a terra estão as maiores reservas de petróleo do mundo, em cima crianças de três anos reviram lixeiras em busca de comida. A fome é tão grande, que elas roem restos de osso de pedaços de carne jogados fora. Crianças de oito a dez anos viajam até duas horas aos bairros riscos em busca de um lixo "melhor". Várias vezes por dia são expulsas pela polícia. Com um salário de um mês, aposentados mal conseguem comprar uma maçã ou um litro de leite.

Mesmo assim, muitos chavistas se gabam de supostos progressos do "socialismo do século 21": com o salário de um mês, podem abastecer o carro por um ano. Parece não lhes interessar que seus concidadãos famintos não podem comer a gasolina subvencionada. Argumentam que a crise em seu país é causada pelas sanções internacionais e pelos baixos preços do petróleo.

O aparato de propaganda do governo é tão poderoso, que consegue convencer os chavistas a aceitarem o resultado como se apresenta. Mesmo tendo eles mesmos notado o extremamente baixo comparecimento eleitoral, mesmo jamais tendo visto as zonas eleitorais tão vazias. Mas essa impressão foi rapidamente corrigida pelas autoridades eleitorais: assim, quem duvida logo fechará os olhos novamente. Pois, melhor que esse governo não reconhecido internacionalmente não há.

União Europeia, Estados Unidos e vários estados latino-americanos não vão reconhecer o resultado. Mas só resta a eles novas sanções como instrumento de pressão. E, se funcionarem, elas atingirão também o povo venezuelano. Isso significa: mais pobreza, mais fuga.

No romance Nada de novo no front, Erich Maria Remarques descreve a desesperança dos soldados nas trincheiras da Primeira Guerra. Assim devem se sentir os venezuelanos nesta segunda-feira (21/05) aos lerem as declarações de seu presidente.

Ofelia Harms Arruti é correspondente da DW na América Latina.

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