Economia e instabilidade instigam rebelião no sudeste da Ucrânia

Arturo Escarda.

Donetsk, (Ucrânia), 17 abr (EFE).- A rebelião vivida nestes dias na região de Donetsk, no sudeste da Ucrânia, conta com um notável apoio de sua população, que olha com inveja a relativa estabilidade econômica da vizinha Rússia enquanto suas próprias contas crescem sem parar.

"O animal faminto morrerá em silêncio, mas o homem faminto, não: roubará, matará, mas não morrerá de fome", disse à Agência Efe Yuri, desempregado, instantes depois que uma massa enfurecida de manifestantes tomou a sede do Ministério do Interior na cidade de Gorlovka, a cerca de 40 quilômetros de Donetsk.

Konstantin, um corpulento mineiro desta cidade industrial, afirma que a revolta de Slaviansk, tomada e rodeada por milicianos armados com fuzis Kalashnikov, tem como suas raízes o crescente desemprego e o temor de que Kiev termine por se associar com a União Europeia (UE).

"Não queremos a União Europeia. Nosso parceiro é a Rússia, que compra tudo o que produzimos. A UE não vai comprar nada nosso e terminaremos ainda pior do que já estamos", disse visivelmente exaltado, enquanto os homens que o rodeiam aplaudem suas palavras e lhe dão palmadas nas costas.

Nestes dias que o coração industrial e minerador da Ucrânia está a um passo do caos e do desgoverno, muitos meios de comunicação e políticos ucranianos, e em menor medida alguns ocidentais, identificam os rebeldes que participam da tomada de edifícios oficiais como separatistas e inclusive terroristas, instigados pela Rússia.

Mas o amplo apoio popular à revolta contra as novas autoridades ucranianas tem em primeiro lugar motivos econômicos, muito mais mencionados pelos cidadãos de Donetsk e da vizinha região de Lugansk, do que a suposta mudança de Kiev rumo a um nacionalismo radical que é associado ao fascismo.

"Lutamos pela Ucrânia, que é nossa pátria, mas por uma Ucrânia na qual se possa viver bem. Como é possível que haja tanta miséria em um país que está no coração da Europa?", lamentou Igor, outro mineiro de Gorlovka.

Em pouco menos de dois meses, desde os trágicos distúrbios nas ruas de Kiev e a derrocada do presidente Viktor Yanukovich, a moeda nacional ucraniana se desvalorizou quase 50%, ao mesmo tempo em que as tarifas domésticas e industriais do gás, da calefação e da eletricidade subiram vertiginosamente.

Duas mulheres de idade muito avançada abordam quase com violência os jornalistas em frente à sede do governo desta região mineira, onde o protesto chamado por muitos pró-Rússia ganhou nova força na semana passada com o ataque e tomada do edifício, transformado hoje em quartel-general da autoproclamada República Popular de Donetsk.

"Deixem de mentir, não somos delinquentes nem separatistas. Somos pessoas que estão fartas. Como podemos viver com uma pensão de mil grivnas (US$ 80) se este governo aumenta as nossas contas e os preços vão lá em cima?", se queixou uma delas.

A moeda ucraniana, que em meados de 2013 era cotada em cerca de 8 grivnas por dólar, hoje é cotada acima das 12,3 grivnas por cada dólar.

Além disso, o governo da Ucrânia subiu em mais de 50% as tarifas dos serviços e anunciou cortes na despesa social, tudo isso por exigências do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Alguns meios de comunicação de Kiev, cada vez mais aborrecidos com boa parte da população no sudeste de origem russa, não culpam o Executivo de Arseni Yatseniuk pela má situação econômica e jogam a responsabilidade sobre o deposto Yanukovich.

"Não queríamos Yanukovich, mas com ele tivemos certa estabilidade. É verdade que roubava, mas pelo menos a coisa não piorava como agora, embora também não melhorasse" disse Eduard, um oficial reservista de Infantaria Aerotransportada que ganha a vida como taxista.

Como ele, são muitos em Donetsk e Luganks que compartilham uma má lembrança da Revolução Laranja (2004) e do governo de Yulia Tymoshenko, que associam com o brusco agravamento da situação econômica e social.

"Estes que estão agora na capital, se chamem como se chamem, Yatseniuk ou Turchinov, são marionetes de Yulia (Tymoshenko), fazem o que ela diz. E com Tymoshenko e os seus no poder, será difícil que o sudeste aceite a autoridade de Kiev", concluiu Eduard.

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