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Visita de Obama reacende divisão na dissidência interna em Cuba

13/03/2016 14h37

Sara Gómez Armas.

Havana, 13 mar (EFE).- A visita do presidente americano Barack Obama a Cuba reacendeu as diferenças entre a dissidência interna no país, dividida entre os que são a favor de aproveitar o novo contexto com os Estados Unidos para promover mudanças e aqueles que veem todo diálogo com o governo cubano como uma forma de legitimação do regime.

Destaques como o ex-prisioneiro político José Daniel Ferrer e o opositor moderado Manuel Cuesta Morúa estão no grupo dos otimistas que acreditam em conseguir uma abertura democrática no país com o apoio dos EUA. Já as Damas de Branco, lideradas por Berta Soler, entre outros, são críticos com a nova política americana rumo a Cuba.

A ida de Obama a território cubano, a primeira de um governante dos EUA em 88 anos, colocará em evidência essas diferentes posturas, em meio ao previsível encontro entre representantes da dissidência com o líder, que pretende aproveitar essa viagem para focar na necessidade de melhorar a situação dos direitos humanos.

Entre as vozes que querem aproveitar o novo contexto está Cuesta Morúa, do moderado Arco Progressista, que opina que o degelo com os EUA "abre mais oportunidades para que a comunidade pró-democracia tenha mais espaço e um ambiente mais tranquilo para fazer o que é preciso na democracia, que é dialogar".

Segundo sua opinião, Cuba se encontra em um momento para dar mais espaços e escutar a sociedade civil, como consequência do "desgaste do regime que não tem discurso nem retórica" e do próprio "cansaço da população, que não vê esperança de melhoras".

Para Cuesta Morúa, a oposição interna deve usar os resquícios do sistema para promover mudanças "de dentro" e encaminhar uma transição somando apoios dos cidadãos; postura também defendida pelo ex-preso político José Daniel Ferrer, à frente da dissidente União Patriótica de Cuba (UNPACU).

O líder da UNPACU afirmou que o restabelecimento de relações com os EUA resultará mudanças a longo prazo em Cuba, "que já começaram a ser notadas".

Sobre a visita de Obama, Ferrer espera alguma "mensagem solidária" ao povo cubano e aos ativistas que são reprimidos por defenderem os direitos humanos.

"Apoiamos este processo e temos esperanças. A imensa maioria da população também o apoia e não seríamos coerentes em nosso objetivo de sermos voz do conjunto da sociedade cubana se nos opuséssemos à nova relação com os EUA", detalhou.

Ambos são os nomes mais conhecidos por trás do projeto #Outro18 - em referência a 2018, ano em que o atual presidente Raúl Castro deixará o poder -, que pretende, com a iniciativa cidadã, promover mudanças democráticas aproveitando a nova fase com os EUA.

Entre suas propostas figuram uma nova lei eleitoral que permita a candidaturas livremente, sem a necessidade de um vínculo com o Partido Comunista de Cuba, uma lei de associações que elimine as restrições da atual e a criação de um registro eleitoral público.

No outro lado estão os grupos que integram a iniciativa #TodosMarchamos, entre os quais destacam as Damas de Branco, que convoca manifestações pacíficas a cada domingo para pedir a libertação de todos os presos políticos e o respeito aos direitos humanos e politicamente defendem uma "mudança radical" frente às reformas.

Em declarações à Agência Efe, a líder das Damas de Branco, Berta Soler, denunciou um aumento da repressão nos últimos meses contra "manifestantes pacíficos", que são vítimas de "roubos e humilhações" por parte da segurança do Estado.

"Estamos preocupadas porque o presidente Obama disse que só viria a Cuba se visse avanços em matéria de direitos humanos, algo que não aconteceu", afirmou Soler, que deseja que o líder se reúna com ativistas para conhecer de primeira mão a repressão, acentuada nos últimos meses.

Segundo a Comissão Cubana de Direitos Humanos e Reconciliação Nacional, apenas nos dois primeiros meses do ano ocorreram pelo menos 2.555 detenções por motivos políticos. Esse grupo, liderado por Elizardo Sánchez e o único que apura esses incidentes, aponta uma mudança na estratégia repressiva do governo de Raúl Castro, baseada em um aumento das detenções de ativistas, em muitos casos com violência, mas só por algumas horas.

"Este novo método de repressão serve de alerta para o resto da população, mas por não haver julgamentos sem garantias nem longas penas, o governo cubano não compromete sua imagem à comunidade internacional neste momento de abertura ao exterior e diálogo com cada vez mais países", afirmou a jornalista independente Miriam Leiva.