Governo aciona blindagem para restringir CPI a Congresso

Ana Flor

Em Brasília

Ministros e líderes aliados trabalham para blindar o governo dos reflexos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que vai apurar no Congresso o envolvimento de agentes públicos com o empresário Carlos Augusto Ramos, conhecido como Carlinhos Cachoeira, acusado de comandar uma rede de jogos ilegais.

Deputados e senadores chegaram a um acordo nesta quinta-feira em torno do texto para a abertura da CPI mista, que será controlada pelo PT e pelo PMDB, os dois principais partidos da coalizão que comanda o governo federal.

O esforço governista é para focar o trabalho da CPI, que toma como base duas operações da Polícia Federal, nas relações do senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) com Cachoeira e desqualificar indícios que possam atingir o governo -como o envolvimento da construtora Delta, que mais recebeu recursos do governo federal nos últimos anos, com o empresário.

Nesta quinta, a ministra Miriam Belchior, responsável pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), afirmou a jornalistas que o governo irá investigar acusações contra a Delta. "Qualquer irregularidade terá que ser corrigida, como a gente sempre faz", disse.

Defendida pelo PT, a CPI já atinge o governador petista do Distrito Federal, Agnelo Queiroz. O presidente do PT, Rui Falcão, disse que não há elementos concretos da participação de Agnelo e que a base da CPI são gravações que "têm como centro uma única pessoa, chama-se senador Demóstenes Torres".

Falcão desmentiu que tentou, em vídeo divulgado pelo PT na quarta-feira, ligar a CPI aos adversários políticos que atacaram o PT no caso do mensalão. Na gravação, entretanto, ele afirma que as bancadas do PT no Congresso defendem "uma CPI para apurar este escândalo dos autores da farsa do mensalão".

A fala irritou o Planalto, de acordo com um assessor ouvido pela Reuters e que falou sob condição de anonimato. Dentro do PT, a fala também foi vista com estranheza, já que o discurso dos parlamentares do partido, em especial senadores, era de que a CPI contrariava a imagem de corporativismo do Senado.

Em um argumento comum entre governistas e oposição, o presidente da Câmara, Marco Maia, sugeriu avaliar a CPI "a partir de um outro viés".

"Eu acho que esta é uma oportunidade que a Câmara dos Deputados e o Senado têm de investigar a fundo este poder paralelo que se estabeleceu no país através da lista de contatos do contraventor Cachoeira", disse ele.

Enquanto o PT foi enfático na defesa da CPI e em sua instalação na próxima semana, integrantes do PMDB defendem cautela, sugerindo estender o prazo de instalação para "esfriar" o assunto que agitou o Congresso nos últimos dias.

O receio de parlamentares da base aliada é de que, além de Demóstenes e deputados da oposição, nomes de governistas e de integrantes do governo apareçam nas mais de mil horas de gravações das duas operações da Polícia Federal.

"Ampla, geral e irrestrita"

Com o governo na mira, a oposição anunciou que o texto-base da CPI abre espaço para uma investigação "ampla, geral e irrestrita" -o que parlamentares governistas tentam evitar com medo de que o PT seja atingido.

O líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA), disse que o texto permite que "absolutamente todas as irregularidades que envolvem o senhor Carlinhos Cachoeira" sejam investigadas e abre possibilidade de "aditamento de fatos" que se liguem ao objeto principal.

O líder do PSDB na Câmara, Bruno Araújo (PE), foi ainda mais direto e citou a inclusão na CPI de apurações sobre denúncias de envolvimento entre Cachoeira e o ex-assessor da Casa Civil Waldomiro Diniz, em 2004, ainda no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Tudo começou com Cachoeira. Passados oito anos, nós estamos de volta com Cachoeira. Então eu acho que nós vamos viver um remake, vamos viver um 'Vale a Pena Ver de Novo'. Nomes que o Brasil já conhecia vão voltar ao cenário. Esperamos que dessa vez possa haver um encaminhamento mais objetivo", disse.

Cachoeira, que está preso desde fevereiro, vem sendo defendido pelo criminalista Márcio Thomaz Bastos, que foi ministro da Justiça de Lula e é próximo de lideranças petistas. O empresário seria um dos primeiros nomes convocados para depor na CPI.

Para ser instalada a CPI, é preciso reunir pelo menos 171 assinaturas na Câmara e 27 no Senado -os partidos devem indicar integrantes para a comissão, formada por 15 senadores e 15 deputados. Uma vez estabelecida, a CPI terá 180 dias para funcionar, mas poderá ser estendida.

Na negociação de quem irá ocupar a relatoria da comissão - cargo que deve ficar com a bancada petista da Câmara, deputados alegaram temer pela segurança ao rejeitar a indicação, ainda informal.

"Eu tenho filhos para criar", disse um deles à Reuters, afirmando que a investigação vasculharia ações de arapongas, ex-policiais e pessoas ligadas a práticas ilícitas.

(Reportagem adicional de Maria Carolina Marcello e Hugo Bachega)

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