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Brasileiro conta a saga para entrar na China em plena pandemia de coronavírus

Imagem aérea das ruas de Wuhan, na China - STR/AFP
Imagem aérea das ruas de Wuhan, na China Imagem: STR/AFP

Vivian Oswald, correspondente da RFI em Londres

01/04/2020 06h25

Se os chineses garantem ter contido novos casos de contaminação doméstica por coronavírus, o alvo de Pequim agora são os importados. Devido à pandemia da Covid-19, a China fechou temporariamente suas fronteiras para a maioria dos estrangeiros, inclusive para aqueles com vistos de entrada ou autorização de residência válidos.

A China pretende evitar a reincidência da disseminação em massa do vírus no país. Mas cruzar as fronteiras já não era fácil, antes mesmo da decisão do governo.

O designer gráfico Luciano Drehmer certamente estará em uma das últimas levas de forasteiros admitidos no país. Ele entrou antes da proibição, mas ainda não conseguiu chegar ao seu futuro endereço em Shenzhen.

A metrópole moderna de quase 13 milhões de habitantes, que liga Hong Kong ao continente chinês, é conhecida como o Vale do Silício da China, e está a duas horas de trem-bala de Wuhan, o primeiro epicentro da crise do coronavírus.

Ele está de quarentena até 5 de abril. E foi do hotel onde cumpre o período de 14 dias de confinamento imposto pelas autoridades para todos quem vêm de fora que contou para a RFI a saga do seu retorno à China, país onde morou por um par de anos até 2018.

A decisão de se mudar aconteceu há pouco mais de dois meses, quando acertou os detalhes finais da empresa que abria com um sócio chinês. Quando já estava na Tailândia, a caminho da nova casa, explodiram os casos de contaminação na China, e ele decidiu esperar. Foi até a Alemanha para aguardar a situação melhorar. "Eu não sabia o que ia acontecer. Agora que resolvi vir de vez estou mais tranquilo. Me sinto mais seguro aqui! Um pouco claustrofóbico, é verdade", afirmou por telefone.

Desta vez, o brasileiro entrou por Hong Kong, onde desembarcou de avião e foi atrás de um visto chinês. Não havia quase ninguém na fila, que costumava ser disputada. Passou por todos os check-ups de praxe na entrada em tempos de coronavírus.

Temperatura checada constantemente

Para o continente, seguiu de carro. Achou que seria só cruzar a fronteira e chegar no hotel que havia reservado. Logo na entrada de Shenzhen havia um novo check-point, onde teve a temperatura corporal medida por profissionais protegidos por roupas especiais, máscaras e luvas. Foi enviado para uma fila onde deveria apresentar por escrito uma declaração dos lugares por onde havia passado até chegar ali, com números de voos e assentos em todos os trajetos, a outro funcionário devidamente paramentado contra o vírus. Respondeu a uma série de perguntas, afirmou que não tinha qualquer sintoma da doença. Dali, as autoridades pediram que esperasse o carro do governo sem maiores detalhes.

Depois de passar por três hotéis, onde, aparentemente, não havia vagas, Luciano foi levado a um outro, de quatro estrelas, onde ficaria por dois dias. Nenhum deles era o hotel que havia reservado. Recebia telefonemas regulares da recepção, em que os funcionários perguntavam se tinha sintomas.

Médicos também eram enviados ao quarto para conferir a sua temperatura e eventuais sintomas. Ao final de dois dias, o designer fez o teste para a Covid-19, que deu negativo. Foi transferido de hotel, porque havia aberto uma vaga na área onde moraria.

Os chineses determinaram os hotéis onde os estrangeiros em quarentena seriam colocados e os distribuíram por regiões. A conta do primeiro nunca apareceu. "Eu perguntei muitas vezes na recepção, para os médicos, para todos. Nunca tive resposta", conta. Já no segundo foi-lhe apresentada a fatura logo de cara. Repetiram-se os telefonemas e as visitas dos médicos.

"Existe uma afobação e obsessão notórias. Mas é importante. Eles conseguiram filtrar os casos", disse. Luciano conta que, no hotel onde ficará até o final da quarentena, é possível pedir comida de restaurantes pela internet. Seu sócio conseguiu fazer chegar às suas mãos um chip de telefone. Do pequeno quarto onde está, com uma televisão e um celular, vai acompanhando as notícias que vêm de fora. Claro, com os filtros impostos pelos chineses à internet. A janela não abre e, por questões sanitárias, não há ar-condicionado.

Mas, em breve, o designer começa a nova vida chinesa. "Sei que a vida aqui está voltando ao normal. As ruas e os restaurantes estão abertos. Os shoppings também", destaca. Sua empresa é responsável pelo design da marca e embalagem, além da logística para exportações online de produtos cosméticos.

A China deixou de ser o epicentro da pandemia do coronavírus. Foi deixada para trás pela Itália e, nos últimos dias, pelos Estados Unidos.

Em comunicado oficial, Pequim afirmou que a decisão "é uma medida provisória que o país foi forçado a adotar para evitar uma situação de repique da epidemia".

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