Dia internacional da Enfermagem

'Tive muito medo': quando os pacientes são os colegas de trabalho

Por Carolina Marins

Pela segunda vez, o dia internacional da enfermagem --comemorado hoje-- se dá em meio à pandemia da covid-19. Em mais de um ano, passa de 6.000 o número de profissionais de enfermagem contraíram a doença, segundo dados do Ministério da Saúde até março deste ano. Esta é a profissão com maior registro da infecção por coronavírus.
Rovena Rosa/Agência Brasil
Neste contexto, em que quem cuida vira o paciente, enfermeiros, auxiliares e técnicos relatam os desafios de cuidar dos seus próprios colegas de trabalho. O medo e o estresse são os sentimentos mais presentes naqueles que cuidam, enquanto aos pacientes resta apenas confiar que seus colegas poderão ajudar a salvá-los.
Tatiana Fortes/Governo do Ceará
Aluizio Thomé é enfermeiro no Hospital do Servidor Público Estadual, em São Paulo, há 15 anos. Ele ficou internado 23 dias com covid-19, sendo 11 deles intubado. Durante esse tempo ele conta que não sentiu medo, pois confiava demais nos colegas que estavam ao seu lado.
Arquivo pessoal

O meu caso foi bem grave, mas eu confiei nos meus colegas. Recebi muito carinho, correntes de oração, todo mundo dando força. Houve uma sensibilização muito grande lá no hospital

Aluizio Thomé,
Enfermeiro no Hospital do Servidor Público Estadual
Mario Castello/Cedidas ao UOL
Com mais de 95% do pulmão comprometido, Aluízio foi acompanhado por sua amiga e colega Tatiane Pinheiro. Ela conta que, quando soube que o amigo estava internado, ficou com o coração apertado e se colocou no lugar do colega na hora de cuidar dele.
Arquivo pessoal

Me senti frágil e angustiada de vê-lo daquela forma, sedado, intubado, pronado. Mais ainda de ser um colega nosso, de trabalho, que há uma semana estava trabalhando junto, dividindo o plantão

Tatiane Pinheiro,
Enfermeira na Hospital do Servidor Público Estadual
iStock
Wagner Paulo Ferreira foi internado duas vezes com covid-19: a primeira em agosto de 2020 e a segunda em janeiro de 2021. Em nenhuma delas precisou ser intubado. Mas diz que ficou com muito medo diante dos desfechos ruins que via. Porém, se sentiu gratificado por ter a ajuda dos colegas e depois poder retribuir cuidando deles.
Arquivo pessoal

Já sou hipertenso e quando tive a doença, fiquei com medo de morrer. Depois que você entrou no hospital, não tem mais atendimento da família. Com a sensação de morte e ainda longe da família, você sente medo mesmo

Wagner Paulo,
Auxiliar de enfermagem
Mario Castello/Cedida ao UOL
Era aniversário da auxiliar de enfermagem Daniela Ferreira quando ela recebeu a notícia de que Wagner estava internado. Ela diz que o coração disparou de preocupação e ela logo foi providenciar um leito em seu setor.
Arquivo pessoal

Eu fazia questão de cuidar dele no meu plantão à noite. Quando eu ia embora pela manhã, sentia até uma dor no coração de ter que deixar ele lá sozinho

Daniela Ferreira,
Auxiliar de enfermagem
AFP
A técnica Joselita Dias Dantas trabalha há dez anos com Rosimary Forni no setor de pediatria. Ela sabia que a colega era paciente de risco para covid-19 devido ao lúpus e por isso ficou preocupada quando o resultado dela veio positivo, ainda mais em um cenário então desconhecido da doença.
Arquivo pessoal

Eu não cuidei da assistência direta da Rosimary, mas fiquei no apoio psicológico e também acabei fazendo o que a família não conseguia fazer. Levei materiais de higiene, consegui levar medicação

Joselita Dias Dantas,
Técnica de enfermagem
Mario Castello/Cedida ao UOL
Sandra Bomfim acompanhou de perto o boletim médico da colega Ana Maria Ramos, muito querida no hospital, e repassava as notícias aos demais. Ela ficou muito apreensiva durante o tratamento, já que Ana Maria é paciente renal e faz hemodiálise. "Os pacientes renais não evoluíam muito bem", desabafa.
Arquivo pessoal

Quando ela estava intubada e seu estado ficou crítico, os colegas queriam informação, mas eu não passei que ela tinha piorado. Não tive coragem

Sandra Bomfim,
Enfermeira
Mario Castello/Cedida ao UOL
Nesta semana, os profissionais receberam uma homenagem do Hospital do Servidor Público Estadual, com uma exposição contando as histórias daqueles que cuidaram e foram cuidados, incluindo daqueles que não se recuperaram, como Dilva Barbosa.

"A equipe toda ficou abalada. Dilva era muito querida", conta Tatiane Pinheiro.

Mario Castello/Cedida ao UOL

Nós, enfermeiros, somos muito importantes. O cuidado é importante. Eu acho que se não fosse a parte da enfermagem nesse período de pandemia, muito mais pessoas teriam morrido

Wagner Paulo Ferreira,
Enfermeiro
Danish Siddiqui/Reuters
Publicado em 12 de Maio de 2021.
Edição Vanessa Alves Baptista