Personagem da semana

Ernesto Araújo se segura em meio a pressão

A vida não está fácil para o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Ficou com a culpa do atraso na importação dos insumos vindos da China devido a uma briga diplomática com o país. Depois, viu o antigo aliado Donald Trump ser derrotado pelo democrata Joe Biden, que tomou posse nesta semana. Pressionado, vê sua manutenção no cargo em risco.
Edu Andrade/Fatopress/Estadão Conteúdo

Ideologia na veia

Araújo foge aos padrões da chancelaria brasileira. É responsável por uma mudança radical na histórica tradição de pragmatismo do Itamaraty e inseriu uma agenda altamente ideológica, muito criticada por seus colegas.
Reuters

Biografia

Formou-se em letras em 1988 e entrou para o Instituto Rio Branco em 1990, quando começou sua carreira diplomática. Atuou em locais como Bruxelas, Berlim, Ottawa e Washington. Em 2018, foi promovido a embaixador, embora nunca tenha chefiado uma embaixada.
Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

3º escalão

Sua indicação por Jair Bolsonaro como ministro foi criticada na época por quebrar as tradições hierárquicas do ministério. Por ter sido promovido apenas um ano antes, era considerado muito inexperiente para virar chanceler. Era ainda apenas um diplomata de terceiro escalão.
Eric Baradt - 11.set.2019/AFP

Olavista

Sua nomeação, no entanto, foi proposital. O diplomata foi apresentado a Bolsonaro por três pessoas muito importantes dentro de seu círculo: seu filho e deputado Eduardo Bolsonaro, o secretário Filipe Martins e o guru Olavo de Carvalho.
Arthur Max/ Divugação/ MRE

Carta de apresentação

Olavo de Carvalho conheceu Araújo devido a um texto que o diplomata escreveu intitulado "Trump e o Ocidente", no qual analisava três discursos do então presidente americano. O guru recomendou o texto e foi assim se aproximando do futuro presidente do Brasil.
Reprodução/Twitter

Teorias da conspiração

As posições de Araújo agradaram a Bolsonaro. Ele compõe o que restou da chamada ala ideológica do governo federal, atuando basicamente na defesa de valores conservadores, cristãos, nacionalistas e teorias da conspiração.
MATEUS BONOMI/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO

Isolamento

Sua "nova política externa brasileira" é o alinhamento automático aos EUA e uma ideologização na diplomacia. No passado, o Brasil era convidado a mediar conflitos na ONU devido à sua postura neutra. Hoje, o país se vê isolado.
Reuters

Aliados ideológicos

A nova política externa trouxe um afastamento de países antigos aliados, como os latinos-americanos, e buscou se aproximar de países ideologicamente próximos, como Israel de Benjamin Netanyahu e os EUA de Donald Trump.
Reprodução/Twitter

Globalismo

Diz lutar contra o chamado "globalismo", conceito inventado que seria uma teoria de dominação mundial com base em religião, cultura e fim das soberanias nacionais. Os maiores representantes desse movimento seriam entidades como a ONU e suas ramificações.
GABRIELA BILÓ/ESTADÃO CONTEÚDO

[O globalismo] essencialmente é um sistema anti-humano e anticristão. A fé em Cristo significa, hoje, lutar contra o globalismo, cujo objetivo último é romper a conexão entre Deus e o homem, tornando o homem escravo e Deus irrelevante.

Ernesto Araújo,
em seu blog Metapolítica17
Aloisio Mauricio/Fotoarena/Estadão Conteúdo

Negacionismo

Foi com base no antiglobalismo que Araújo conduziu a política externa brasileira: se aproximando de países cristãos, rechaçando a globalização e até mesmo negando a existência do novo coronavírus, que, em sua concepção, é apenas uma forma de dominação mundial.
Aloisio Mauricio/Fotoarena/Estadão Conteúdo

Controlar a linguagem para matar o espírito, eis a essência do comunismo atual, esse comunismo que de repente encontrou no coronavírus um tesouro de opressão.

Ernesto Araújo,
em seu blog Metapolítica17
Ricardo Moraes/Reuters

Rusgas com a China

No mesmo texto, o chanceler se refere ao coronavírus como "comunavírus", resgatando a origem do vírus, que surgiu em Wuhan, na China. Essa atitude e outros atritos encabeçados por Eduardo Bolsonaro e o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub provocaram rusgas nas relações entre China e Brasil
Mikhail KLIMENTYEV / AFP

"Climatismo"

Além de negar a pandemia, Araújo também nega o aquecimento global, é contra a ideologia de gênero, a imigração, o politicamente correto e até o que ele chama de cientificismo.
Bruno Kelly/Amazônia Real

Sai Trump, entra Biden

Suas atitudes tiveram consequências recentes. No último dia 20, Donald Trump saiu da Casa Branca para dar lugar ao novo presidente, Joe Biden, que é alinhado com o combate ao aquecimento global e um crítico da atual agenda climática brasileira.
Pool/Getty Images

Insumos chineses

O Brasil também se vê em meio a um impasse frente à China. O país necessita de insumos para produzir as vacinas nacionalmente, que são produzidos pelo país atacado pela chancelaria brasileira durante os últimos dois anos.
ADRIANA TOFFETTI/ESTADÃO CONTEÚDO

Pressão interna

Bolsonaro passou a pressionar o chanceler por um melhor diálogo com o país asiático. Bolsonaro soube no último dia 20 que Araújo estava sem conversar com a embaixada da China desde o ano passado.
AFP

Doses da Índia

Outro impasse se deu com doses da vacina Oxford/Astrazeneca que seriam importadas da Índia. O país não tinha dado sua autorização e a diplomacia teve de atuar novamente para resolver a questão. Ontem, 2 milhões de doses chegaram ao Brasil.
Divulgação/Ministério da Saúde

Fritura no cargo

Embora tenha participado de uma live ao lado do presidente na última quinta-feira (21), na qual recebeu elogios, o clima é de pressão e "saída honrosa". Pode ser o início da queda de mais um ministro do governo Bolsonaro.
Marcos Corrêa/Presidência da República
Publicado em 23 de janeiro de 2021.
Reportagem e texto: Carolina Marins