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Dívida dá chance a republicanos de sequestrar economia dos EUA

Paul Krugman

18/05/2011 00h45

Seis meses atrás, o presidente Barack Obama enfrentou uma situação de sequestro. Os republicanos ameaçaram impedir a prorrogação dos cortes de impostos para a classe média, caso Obama não estendesse os cortes para os ricos também. E o presidente essencialmente cedeu, dando ao Partido Republicano tudo o que queria.

Agora, previsivelmente, os sequestradores estão de volta: a chantagem funcionou bem em dezembro, então, por que não tentar novamente? Desta vez, os republicanos da Câmara dizem que vão se recusar a aumentar o teto da dívida –um passo que pode infligir maior dano econômico- se Obama não concordar com grandes cortes de gastos, enquanto eliminam qualquer aumento de impostos. E a questão se torna o que levará o presidente a dizer não.

O próprio teto da dívida é uma característica estranha da lei norte-americana: como o Congresso tem que votar para autorizar os gastos e a fatia dos impostos, por que necessita de uma segunda votação para autorizar o endividamento que esses gastos e impostos implicam? Na prática, contudo, os congressistas historicamente se dispuseram a aumentar o teto da dívida quando necessário, então essa curiosidade em nosso sistema não importou muito, até agora.

O que mudou? A resposta é a radicalização do Partido Republicano. Normalmente, um partido que não controla nem a Casa Branca nem o Senado admite que não está em posição de impor seu programa sobre a nação. Mas o Partido Republicano moderno não acredita em seguir as regras normais.

Então, o que vai acontecer se o teto não for elevado? Virou moda na direita afirmar que não seria grande problema. No sábado, a página editorial do “Wall Street Journal” ridicularizou os que se preocupam com as consequências de se atingir o teto como o “lobby do Armageddon”.

É difícil saber se esses tipos que se recusam a se preocupar acreditam no que estão dizendo ou se estão apenas se colocando em posição de negociação. De qualquer forma, quase certamente estão errados: se o teto da dívida não for elevado, as consequências serão seriamente danosas.

Porque, se atingirmos o teto, o governo será forçado a parar de pagar quase um terço de suas contas, ou seja, a parte dos gastos atualmente financiada pela dívida. Assim, vai parar de pagar aposentadorias? Vai parar de pagar médicos e hospitais para tratar pacientes do Medicare? Vai parar de pagar os fornecedores de combustível e munição para nossos militares? Ou vai parar de pagar os juros da dívida?

Não diga “nenhuma das opções anteriores”. Como escrevi antes, o governo federal é basicamente uma empresa de seguro com um exército, então acabo de descrever todos os principais componentes dos gastos federais. Ao menos um, e provavelmente vários desses componentes vão enfrentar interrupção no pagamento se o endividamento federal for cortado.

E o que essas interrupções de pagamentos fariam à economia? Nada de bom. Os gastos dos consumidores provavelmente desmoronariam, quando os idosos nervosos começassem a se perguntar como pagar o aluguel e a comida. As empresas que dependem das compras do governo iam cortar as folhas de pagamento e cancelar investimentos.

Além disso, os mercados podem entrar em pânico, especialmente se os pagamentos de juros forem interrompidos. E as consequências de minar a fé na dívida dos EUA podem ser especialmente severas porque essa dívida tem um papel crucial em muitas transações financeiras.

Então, atingir o teto da dívida seria uma coisa muito ruim. Infelizmente, pode ser inevitável.

Por quê? Porque esta é uma situação de sequestro. Se o presidente e seus aliados operarem sobre o princípio que é impens ável não elevar o teto da dívida, que isso seria um fracasso a ser evitado a qualquer custo, então terão cedido todo o poder aos que querem esse resultado. Com efeito, eles terão rasgado a Constituição e dado o controle do governo a um partido que apenas controla uma das casas do Congresso, mas alega estar disposto a derrubar a economia se não tiver o que quer.

Agora, há boas razões para acreditar que o Partido Republicano não está tão disposto a queimar a casa quanto alega. O empresariado deixou claro que está horrorizado com a perspectiva de atingir o teto da dívida. Até a Câmara de Comércio, que é virulentamente contra Obama, exortou o Congresso a aumentar o teto “o mais rápido possível”. E um confronto em torno dos gastos somente ressaltaria o fato que os republicanos ganharam no ano passado em grande parte prometendo proteger o Medicare, e depois prontamente votaram pelo desmantelamento do programa.

O presidente, contudo, não pode enfrentar o blefe dos extorsionários se não estiver disposto a confrontá-los, e a aceitar os riscos associados.

De acordo com Harry Reid, líder da maioria no Senado, Obama disse aos democratas para não traçarem um “limite na areia” nas negociações da dívida. Bem, me incluam entre os que acham essa estratégia completamente desconcertante. Em algum ponto –mais cedo do que tarde- o presidente tem que traçar um limite. De outra forma, seria o mesmo que se mudar da Casa Branca e entregar as chaves para o Tea Party.