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O falso fator medo

Paul Krugman

01/10/2011 00h01

A boa notícia: após um ano e meio falando sobre déficits, déficits, déficits, quando devíamos estar falando sobre empregos, empregos, empregos, nós finalmente voltamos a discutir o assunto correto.

A má notícia: os republicanos, auxiliados e com a cumplicidade de muitos intelectuais conservadores, estão concentrados em uma visão sobre o que está bloqueando a criação de empregos que se encaixa em seus preconceitos e atende aos interesses dos ricos que os apoiam, mas sem nenhuma relação com a realidade.

Escute os discursos de qualquer pré-candidato presidencial republicano e você ouvirá afirmações de que o governo Obama é responsável pelo fraco crescimento dos empregos. Como? A resposta, repetida incansavelmente, é que as empresas têm medo de expandir e criar empregos, porque elas temem regulamentações caras e impostos mais altos. Não são apenas os políticos dizendo isso. Economistas conservadores repetem a alegação em artigos de opinião, e diretores do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), repetem isso para justificar sua oposição até mesmo a esforços modestos para ajudar a economia.

A primeira coisa que você precisa saber, então, é que não há nenhuma evidência apoiando esta alegação e muita evidência mostrando que é falsa.

O ponto de partida para muitas alegações de que políticas antinegócios estão prejudicando a economia é a afirmação de que a fraca recuperação da economia após a recessão é sem precedente.

Mas, como um novo artigo de autoria de Lawrence Mishel, do Instituto de Políticas Econômicas, documenta extensamente, isso não é verdade. Períodos prolongados de “recuperação sem criação de empregos” após recessões foram a regra nas últimas duas décadas. Na verdade, a geração de empregos no setor privado desde a recessão de 2007-2009 foi melhor do que após a recessão de 2001.

Nós poderíamos acrescentar que as grandes crises financeiras são quase sempre seguidas por um período de baixo crescimento, e a experiência americana é mais ou menos o que deveria se esperar, dada a seriedade do choque de 2008.

Ainda assim, não há algo estranho com o fato das empresas estarem tendo grandes lucros e estarem sentadas sobre tanto dinheiro, mas não estarem gastando esse dinheiro para expandir sua capacidade e os empregos?

Não.

Afinal, por que as empresas deveriam expandir quando não estão usando toda a capacidade que elas já dispõem? O estouro da bolha imobiliária e o excesso de dívida dos lares deixaram o consumo deprimido e muitas empresas têm mais capacidade do que precisam, de modo que não há motivo para acrescentar mais. O investimento das empresas sempre responde fortemente ao estado da economia, e diante de quão fraca a economia permanece, não é de se estranhar que o investimento permaneça baixo. Mas os gastos das empresas estão mais fortes do que alguém poderia prever, diante de um crescimento tão baixo e de um desemprego tão alto.

Mas as empresas não estão se queixando dos fardos dos impostos e regulamentações? Sim, mas não mais do que o habitual. Mishel aponta que a Federação Nacional das Empresas Independentes pesquisa pequenas empresas há quase 40 anos, pedindo para que citem seus principais problemas. Impostos e regulamentação sempre estiveram no topo da lista, mas o que se destaca agora é o aumento das empresas citando baixas vendas –o que sugere fortemente que a falta de demanda, e não o medo do governo, está freando as empresas.

Assim, as afirmações dos republicanos sobre quais são os males da economia são pura fantasia, contrariando todas as evidências. Nós deveríamos ficar surpresos?

Em um nível, é claro que não. Os políticos que sempre atendem aos interesses dos ricos dizem que a recuperação econômica depende de atender os interesses dos ricos. Quem poderia imaginar isso?

Mas me parece que há algo diferente sobre o atual estado da discussão econômica. Os partidos políticos frequentemente se unem em torno de ideias econômicas dúbias –lembra da curva de Laffer?– mas não consigo recordar de um tempo em que a doutrina econômica de um partido esteve tão divorciada da realidade. E me impressiona o quanto os economistas de inclinação republicana –que deveriam saber melhor– estão dispostos a emprestar sua credibilidade para as ilusões oficiais do partido.

Em parte, sem dúvida, isso reflete o mergulho mais amplo do partido em seu próprio universo intelectual isolado. Grandes segmentos do Partido Republicano rejeitam a ciência climática e até mesmo a teoria da evolução, então por que esperar que evidências importem para as visões econômicas do partido?

Além disso, é claro, reflete a necessidade política da direita de transformar tudo de ruim nos Estados Unidos em culpa do presidente Barack Obama. Não importa que a bolha imobiliária, que a explosão da dívida e a crise financeira ocorreram durante o governo de um presidente conservador, defensor do livre mercado; é aquele democrata que está agora na Casa Branca que recebe toda a culpa.

Mas o que é bom para a política pode resultar em políticas muito ruins. A verdade é que estamos neste apuro porque tínhamos muito pouca regulamentação, não demais. E agora um de nossos dois principais partidos está determinado a duplicar os erros que causaram o desastre.