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Políticos que não querem defesa do consumidor nos EUA são amigos da fraude

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Imagem: Thinkstock

06/02/2013 00h01

Como muitos defensores da reforma financeira, eu fiquei um pouco decepcionado com o projeto de lei que finalmente foi divulgado. Dodd-Frank (lei de regulamentação financeira) deu às autoridades reguladoras o poder de controlar muitos dos excessos financeiros – mas, se não tínhamos certeza antes, agora ficou ainda menos claro se as futuras autoridades reguladoras usarão esse poder. Como mostra a história, a riqueza e a influência do setor financeiro podem facilmente transformar aqueles que deveriam atuar como fiscais em amigos coniventes.

Uma parte da reforma, no entanto, é um brilhante exemplo de como fazer a coisa certa: a criação do Departamento de Defesa Financeira do Consumidor, uma agência independente e com financiamento próprio que ficará responsável por proteger os consumidores contra fraudes e abusos financeiros. E, com certeza, os republicanos do Senado estão fazendo de tudo para tentar acabar com esse novo departamento.

Por que a proteção financeira dos consumidores se faz necessária? Porque fraudes e abusos acontecem.

Não vale dizer que os consumidores letrados e bem-informados são capazes de cuidar de si mesmos, pois nem todos os consumidores são letrados e bem-informados. Edward Gramlich, funcionário do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos Estados Unidos) que alertou em vão sobre os perigos dos empréstimos subprime (crédito concedido a tomadores que não possuem um bom histórico ou não têm condições de quitar seus empréstimos), fez a famosa pergunta: “por que os financiamentos mais arriscados são vendidos aos tomadores menos sofisticados?”. E ele prosseguiu: “a pergunta responde a si própria – os tomadores menos sofisticados provavelmente são enganados e levados a adquirir esses produtos”.

E até mesmo adultos bem-educados podem ter dificuldade em entender os riscos e as recompensas associados aos negócios financeiros – um fato a respeito do qual operadores desonestos estão muito conscientes. Se considerarmos uma área na qual a agência já fez um excelente trabalho, quantos de nós sabemos o que realmente está contido em nossos contratos de cartão de crédito?

Mas você pode ficar tentado em dizer que, embora nós precisemos de proteção contra fraudes financeiras, não há necessidade de criar mais burocracia. Por que não deixar isso para as autoridades reguladoras que já temos? A resposta é: as agências reguladoras existentes estão basicamente preocupadas em fortalecer os bancos. Como uma questão cultural e de natureza prática, elas sempre colocarão a proteção do consumidor em segundo plano – assim como fizeram quando ignoraram os alertas Gramlich sobre os títulos subprime.

Por isso, o departamento de defesa do consumidor tem uma função vital. Mas, como eu disse, os republicanos do Senado estão tentando acabar com ele.

Como eles podem fazer isso, uma vez que a reforma já foi transformada em lei e os democratas têm a maioria no Senado? Aqui, como em outros lugares, eles estão recorrendo à extorsão – ameaçando obstruir a nomeação de Richard Cordray, chefe interino do departamento e, assim, impedir o departamento de funcionar. Cordray, cujo trabalho tem atraído elogios até mesmo dos banqueiros, não é claramente o alvo. O alvo é a derrubada da lei, que eles pretendem atingir por meio de uma tentativa explícita de usar o mero obstrucionismo para esse fim.

O que os republicanos estão exigindo, basicamente, é que o Departamento de Defesa Financeira do Consumidor perca a sua independência. Eles querem que suas ações fiquem sujeitas ao poder de veto de outras autoridades reguladoras do setor financeiro vinculadas aos bancos, garantindo mais uma vez que os consumidores sejam negligenciados. E eles também querem eliminar o financiamento próprio assegurado à agência, o que a deixaria vulnerável à pressão de grupos de interesse. Essas mudanças iriam transformar o departamento em uma entidade mais ou menos inútil – mas esse, naturalmente, é o ponto.

Como é que o Partido Republicano pode se mostrar tão determinado em transformar os Estados Unidos em um local seguro para que se cometam fraudes financeiras, considerando-se que a crise de 2008 ainda está tão fresca em nossa memória? Em parte, isso se deve ao fato de os republicanos se encontrarem em profunda negação do que realmente aconteceu com o nosso sistema financeiro e a nossa economia. Para a direita, a culpada agora é a ortodoxia total adotada por benfeitores liberais – especialmente o ex-deputado Barney Frank –, que de alguma forma causou o desastre financeiro, obrigando banqueiros indefesos a emprestar para “Aquelas Pessoas”.

Na realidade, essa história é uma besteira que tem sido amplamente refutada. Eu sempre fiquei impressionado com a crença de que um congressista democrata com um cargo no governo no momento em que os republicanos dominavam despoticamente o Congresso teria, de alguma forma, o poder místico de distorcer todo o nosso sistema bancário. Mas essa é uma história na qual muitos conservadores preferem acreditar em vez de encararem a difícil realidade – de que sua fé na perfeição dos mercados livres se mostrou falsa. 
E, como sempre, temos que seguir o dinheiro. Historicamente, o setor financeiro concedeu muito dinheiro para ambos os partidos – com apenas uma modesta vantagem para os republicanos. Na última eleição, no entanto, o setor apostou todas as suas fichas nos republicanos, dando-lhes mais do que o dobro dos recursos entregues aos democratas (e favorecendo Mitt Romney em detrimento do presidente numa proporção de quase três para um). Todo esse dinheiro não foi suficiente para comprar a eleição – mas foi, sem dúvida, suficiente para comprar um grande partido político.

No momento, todo o foco da mídia está voltado às questões óbvias de maior relevância – imigração, armas, o sequestro (o corte de gastos automático que deve ocorrer em face do déficit orçamentário), e assim por diante. Mas vamos tentar não deixar que isso passe despercebido: apenas quatro anos após banqueiros fugitivos terem colocado a economia mundial de joelhos, os republicanos do Senado estão usando todos os meios à sua disposição e violando todas as normas tradicionais da política nesse processo na tentativa de dar os banqueiros a oportunidade de fazer tudo de novo.