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Viva o Obamacare

Jacquelyn Martin/AP
Imagem: Jacquelyn Martin/AP

Paul Krugman

27/06/2015 00h01

Se eu estava sentado na beirada da cadeira, enquanto esperava a decisão do Supremo Tribunal de Justiça sobre os subsídios ao Obamacare? Não, eu estava andando pela sala, nervoso demais para me sentar, temendo que a Justiça fosse usar uma frase redigida de forma descuidada para privar milhões de seguro de saúde, condenar dezenas de milhares à ruína financeira e enviar milhares à morte prematura.

Mas não. Com isso, as grandes distrações -os problemas iniciais do site, as tentativas objetivamente ridículas, mas ainda assim ameaçadoras, de sabotagem legal- ficaram para trás, e podemos nos concentrar na realidade da reforma de saúde. A Lei de Saúde Acessível está agora em seu segundo ano de pleno funcionamento. E como está se saindo?

A resposta é: melhor do que até mesmo muitos de seus defensores percebem.

Comecemos com propósito mais básico do ato, cobrir aqueles que antes não tinham seguro. Os opositores da lei insistiram que, de fato, ela ia reduzir a cobertura; na realidade, cerca de 15 milhões de americanos conseguiram um seguro depois da lei.

Mas esse não é um sucesso muito parcial, com milhões ainda descobertos? Bem, muitos dos que ainda não são segurados estão nessa posição porque seus governos estaduais se recusaram a permitir que o governo federal os inscrevesse no Medicaid.

Mas, além disso, você precisa compreender que a lei não tinha o propósito de cobrir toda a população. Imigrantes sem documentos não podem participar, e qualquer sistema que não inscreva os usuários automaticamente perderá algumas pessoas pelas brechas. O Estado de Massachusetts tem cobertura de saúde garantida há quase uma década, mas 5% de sua população adulta não idosa permanece sem seguro.

Suponha que usemos esse número de 5% sem seguro como referência. Quanto progresso fizemos nessa direção? Nos Estados que implementaram o ato na íntegra e expandiram o Medicaid, o número dos não segurados caiu de mais de 16% para apenas 7,5% -ou seja, em dois anos já avançamos 80% do caminho, segundo dados do Instituto Urban. E a maior parte com a Lei de Saúde Acessível!

Mas quão boa é a cobertura? Planos mais baratos ao abrigo da lei têm relativamente grandes franquias e as pessoas têm de pagar somas significativas do próprio bolso. Ainda assim, são muito melhores do que nenhuma cobertura ou aquelas tão básicas que se tornaram ilegais. Os recém-segurados tiveram uma queda acentuada na incidência de dificuldades financeiras relacionadas à saúde e relatam um alto grau de satisfação com a sua cobertura.

E quanto aos custos? Em 2013 houve advertências sinistras de que haveria um “choque de tarifas”; em vez disso, os prêmios foram bem abaixo das expectativas. Em 2014 os suspeitos de sempre declararam que haveria enormes altas em 2015; o aumento real foi de apenas 2%. Houve outra enxurrada de histórias assustadoras sobre aumento de tarifas no início deste ano, mas, à medida que chegam mais informações, parece que, em 2016, os acréscimos serão maiores do que neste ano, mas ainda modestos para os padrões históricos -o que significa que os prêmios permanecem muito inferiores ao esperado.

E também houve uma forte desaceleração no crescimento das despesas globais com saúde, provavelmente devida às medidas de controle de custos em grande parte destinadas ao Medicare, que também foram uma parte importante da reforma de saúde.

E quais são os efeitos econômicos colaterais? Um dos muitos votos republicanos contra o Obamacare envolvia a aprovação de algo chamado Revogação da Lei de Saúde que Mata Empregos, e os adversários advertiram repetidamente que ajudar os americanos a pagarem pela saúde provocaria uma desgraça econômica. Mas os dados não estão apresentando destruição de postos de trabalho: a economia dos EUA adicionou em média mais de 240 mil empregos por mês desde que o Obamacare entrou em vigor, em seus maiores ganhos desde os anos 1990.

Por fim, quanto às alegações de que a reforma da saúde faria com que o deficit orçamental explodisse: na realidade, o deficit tem continuado a diminuir, e o Departamento de Orçamento do Congresso reafirmou recentemente a sua conclusão de que uma possível revogação do Obamacare iria aumentar, e não reduzir, o deficit.

Coloque todas estas coisas juntas e o que você tem é um retrato de uma política de sucesso -uma lei que, apesar de tudo que seus adversários fizeram para miná-la, está atingindo seus objetivos, custando menos do que o esperado e tornando a vida de milhões de americanos melhor e mais segura.

Agora, talvez você se pergunte por que uma lei que funciona tão bem e é tão boa é objeto de tanto veneno político -veneno que, aliás, ficou em evidência na opinião dissidente do juiz Antonin Scalia, com suas queixas contra as “trapaças interpretativas”. Mas o que os conservadores sempre temeram em relação à reforma de saúde é a possibilidade de que pudesse ter sucesso e assim lembrar os eleitores que, por vezes, a ação do governo pode melhorar a vida dos americanos comuns.

É por isso que a direita foi com tudo para destruir o plano de saúde de Clinton em 1993 e tentou fazer o mesmo com a Lei de Saúde Acessível. Mas o Obamacare sobreviveu, está aqui e está funcionando. O grande pesadelo conservador tornou-se realidade. E é uma coisa linda.

Tradução: Deborah Weinberg