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Biolarvicida obtido do bagaço da cana mata larvas de Aedes aegypti

Elton Alisson

Da Agência Fapesp

10/06/2016 08h44

Pesquisadores da Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo (EEL-USP) desenvolveram um biolarvicida a partir do bagaço da cana-de-açúcar capaz de eliminar as larvas do mosquito Aedes aegypti – transmissor dos vírus da dengue, zika e chikungunya – ao dificultar a respiração e destruir a cutícula (exoesqueleto) que as revestem.

“Constatamos que o produto [um surfactantes] é capaz de matar as larvas do mosquito Aedes aegypti até 24 horas após ser diluído na água e destruí-las após 48 horas”, disse Silvio Silvério da Silva, professor da EEL-USP e coordenador do projeto, à Agência Fapesp.

Utilizados largamente na indústria, principalmente em produtos de limpeza, como detergentes, por sua capacidade emulsionante – de unir substâncias que não se misturam, como a água e o óleo –, a maioria dos surfactantes encontrados hoje no mercado é derivada de petróleo e pode causar graves problemas no meio ambiente, principalmente em ecossistemas aquáticos, explicou Silva.

“Alguns estudos apontam que em ambientes com excesso de surfactantes nota-se acúmulo de espuma nos rios, diminuição de oxigênio dissolvido na água e da permeabilidade da luz. Além disso, esses compostos interferem em processos biológicos, como o ciclo do nitrogênio, e sua degradação pode causar a mortandade de organismos”, afirmou.

Ao tentar desenvolver uma alternativa de surfactante proveniente de uma fonte renovável e com toxicidade baixa ou nula, Silva e o pesquisador Paulo Franco conseguiram obter o produto a partir do bagaço da cana-de-açúcar, com as mesmas propriedades de um surfactante sintético, produzido por síntese química.

“Conseguimos obter o composto, que chamamos de surfactante ‘verde’ ou biossurfactante de segunda geração, a partir de leveduras que produzem a substância durante o processo de fermentação dos açúcares presentes no hidrolisado hemicelulósico do bagaço da cana”, afirmou Silva.

Testes com Aedes aegypti

Os resultados dos testes no combate ao Aedes aegypti indicaram que o biosurfactante causa a morte de larvas do mosquito. Isso porque o composto interage com o sifão respiratório das larvas, deixando a região suscetível à interação com a água. Com isso, as larvas do mosquito sofrem asfixia.

Além disso, a presença do biossurfactante na água onde o mosquito depositou seus ovos altera e dificulta o equilíbrio hidrostático das larvas, o que as leva a ter um gasto energético exacerbado e à morte por afogamento. “As larvas não conseguiram respirar e morreram por asfixia até 24 horas depois de entrarem em contato com o biossurfactante”, afirmou Silva.

Os pesquisadores também observaram um fato inédito na aplicação do produto: em até 48 horas após o contato inicial com as larvas, o biossurfactante desintegrou o exoesqueleto do inseto nesse estágio de desenvolvimento.

Outras doenças

Os pesquisadores realizaram testes com o produto na forma líquida e avaliaram a dosagem ideal para aplicação em criadouros de Aedes aegypti. Agora, pretendem desenvolver o produto na forma sólida (pó) e verificar algumas propriedades físico-químicas da formulação e a melhor forma de aplicação.

“Iremos realizar novos testes a fim de desenvolver o produto em sua forma sólida, avaliar novamente a dosagem, além de qual a melhor formulação – se em líquido ou pó –, fazer a caracterização físico-química do biossurfactante em pó e analisar qual a periodicidade ideal de aplicação, de modo a resultar em um produto que possa ser feito em escala industrial”, disse Silva.

A pretensão deles também é desenvolver outros biossurfactantes e usá-los para o combate de outras doenças tropicais negligenciadas, como a leishmaniose e a esquistossomose.