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O troca-troca maranhense no governo

A política do Maranhão ganhou destaque nacional após a demissão do ministro das Comunicações, Juscelino Filho, revelando uma complexa teia de alianças e rivalidades que influencia o cenário político federal.

O tema é um dos destaques do episódio desta semana do A Hora, podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo, disponível nas principais plataformas. Ouça aqui.

Os colunistas dissecaram as peculiaridades da política maranhense, que segundo eles, é "imbatível" em termos de complexidade.

"A política brasileira é muito boa, mas a política maranhense... é imbatível", afirmou Bilenky, traçando um panorama histórico que começa com a quebra da hegemonia da família Sarney no estado. "O clã Sarney comandou o Maranhão durante décadas. 50 anos de Sarney", destacou a colunista.

A eleição de Flávio Dino como governador em 2014 e sua reeleição em 2018 marcaram uma mudança de paradigma na política local. Mas essa ruptura não significou o fim das antigas práticas políticas.

Na reeleição de Dino em 2018, sua coligação reuniu 16 partidos, abrigando tanto aliados quanto ex-adversários. "Tinha gente que era ligada ao Sarney, que foi para ele. Tinha gente que era oposição ao Sarney, que foi para ele. Todo mundo vai para o governo", relata Bilenky, mencionando nomes importantes que fariam parte do atual governo federal, como o próprio Juscelino Filho e André Fufuca.

Apesar de estarem todos sob o mesmo guarda-chuva político, a convivência era apenas aparentemente harmoniosa. "Eles convivem pacificamente, sorriem para foto. Mas quando o fotógrafo sai de cena, é cada um por si", descreve.

As divisões começaram a ficar mais evidentes nas eleições de 2022, quando Dino, já sem possibilidade de reeleição, lançou seu vice, Carlos Brandão, como candidato a governador e disputou uma vaga no Senado. Nesse momento, Juscelino Filho e o senador Weverton Rocha romperam com Dino, enquanto outros aliados, como André Fufuca e Pedro Lucas Fernandes, permaneceram no grupo.

Toledo ressalta a relevância da pasta das Comunicações, ocupada até recentemente por Juscelino Filho: "Para você ter uma ideia, no governo Sarney, justamente, ele estava na mão do Antônio Carlos Magalhães, que era o principal líder do Partido da Frente Liberal. E no governo Fernando Henrique Cardoso, foi do Sérgio Motta, que era o braço direito político do Fernando Henrique", lembra o colunista.

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A importância do ministério, segundo Toledo, está no controle sobre as concessões de radiodifusão. "Ele tem uma importância particular para os políticos, porque ele é quem comanda a radiodifusão. As emissoras de rádio e televisão saem desta cadeira, as concessões. E para os políticos, ainda mais estados como Maranhão e outros muitos estados, Nordeste, Norte do país", explica.

Bilenky lembra que, apesar da aparente substituição de um deputado maranhense por outro do mesmo partido na pasta das Comunicações, há uma rivalidade entre Juscelino Filho e Pedro Lucas Fernandes, o mais cotado para assumir o ministério. "Ambos da União Brasil, mas vindo de grupos diferentes, porque eles representam seus grupos familiares no estado, que compõem com o governo do estado, porque é assim que a banda toca", diz ela.

A presença maranhense em Brasília era significativa antes da queda de Juscelino. "Você tem o Dino no Ministério da Justiça, o André Fufuca no Ministério dos Esportes, o Juscelino Filho no Ministério das Comunicações e ainda a Sônia Guajajara do PSOL no Ministério dos Povos Indígenas. Tinha quatro maranhenses em Brasília, em posições de comando", contabiliza Bilenky.

O resultado dessa influência, segundo Toledo, é mensurável: "Ao ponto de, em 2024, o Maranhão estar no topo do ranking de emenda per capita do Brasil inteiro."

A queda de Juscelino Filho, após resistir a inúmeras denúncias, é vista por Toledo como um reflexo da mudança no cenário político brasileiro. "Hoje em dia o cara caiu por denúncia de corrupção. E ninguém, tirando as pessoas que estão mais com foco na política brasiliense, prestaram atenção", diz ele.

O colunista comparou a situação atual com a postura do primeiro governo Dilma Rousseff. "Logo no primeiro ano de governo, ela faz a famosa faxina... E começa a mandar ministro para casa com base na mera notícia de uma denúncia contra o cara. E agora o Lula esperou, conseguiu esperar dois anos e meio praticamente de denúncia na cabeça do Juscelino", opina.

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Para Toledo, isso demonstra como as prioridades do eleitorado mudaram: "Quando a corrupção está em primeiro lugar, o governante não pode ignorar uma denúncia, nem sequer uma notícia de denúncia, contra o seu auxiliar. Quando a corrupção está em terceiro, quarto, quinto lugar no ranking das preocupações e quando as emendas parlamentares consomem cinco, dez vezes mais do que consumiam 15 anos atrás, o jogo é outro."

Como uma ironia do destino, Bilenky destacou que Flávio Dino, após deixar o Ministério da Justiça para assumir uma cadeira no Supremo Tribunal Federal, acabou se tornando relator do processo contra seu antigo aliado e depois adversário, Juscelino Filho. "O Maranhão é um caso que precisa ser estudado por cientistas e não digo nem cientistas políticos e sociais, acho que precisa ser uma coisa assim, quânticos para entender", conclui ela.

Toledo encerra a análise com uma observação bem-humorada: "Quem joga xadrez 4D são os maranhenses, está aí provado."

Podcast A Hora, com José Roberto de Toledo e Thais Bilenky

A Hora é o podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo. O programa vai ao ar todas as sextas-feiras pela manhã nas plataformas de podcast e, à tarde, no YouTube. Na TV, é exibido às 16h. O Canal UOL está disponível na Vivo TV (canal nº 613), Sky (canal nº 88), Oi TV (canal nº 140), TVRO Embratel (canal nº 546), Zapping (canal nº 64) e no UOL Play.

Escute a íntegra nos principais players de podcast, como o Spotify e o Apple Podcasts já na sexta-feira pela manhã. À tarde, a íntegra do programa também estará disponível no formato videocast no YouTube. O conteúdo dará origem também a uma newsletter, enviada aos sábados.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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