Cartórios, China e a grande Faria Lima
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O deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) enfrenta um processo de cassação que avança rapidamente na Câmara dos Deputados após denunciar esquemas de distribuição de emendas parlamentares.
O tema é um dos destaques do episódio desta semana do A Hora, podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo, disponível nas principais plataformas. Ouça aqui.
O caso remonta a abril de 2024, quando Braga se envolveu em um confronto físico com um militante do MBL (Movimento Brasil Livre) no saguão da Câmara. Esse episódio, caracterizado como "empurrão" ou "chute", foi o motivo formal para o processo disciplinar contra o deputado.
O relator do caso no Conselho de Ética é o deputado Paulo Magalhães (União Brasil-BA), que em 2001 foi acusado de agredir um jornalista na própria Câmara. Entre os parlamentares que votaram pela cassação estão figuras controversas como Alexandre Ramagem, investigado por tentativa de golpe, e Marcos Pollon, articulador do movimento pró-armas.
"Ele comprou briga com quase todos os colegas, especialmente com o Arthur Lira, que era o grande piloto das emendas", explica Thais Bilenky, contextualizando o isolamento político de Braga.
A origem do processo parece estar mais relacionada à atuação de Braga contra o esquema de distribuição de emendas parlamentares. Em 2024, o deputado questionou publicamente se havia pressão indevida do então presidente da Câmara, Arthur Lira, sobre as emendas de comissão, que se tornaram "herdeiras do orçamento secreto". Essa denúncia levou a uma investigação pela Polícia Federal e ao congelamento de mais de 4 bilhões em emendas de comissão pelo ministro Flávio Dino.
Governo dá lavada inédita na oposição graças à isenção do IR
Thais Bilenky e José Roberto de Toledo

O projeto de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil representa uma rara vitória de comunicação para o governo Lula. A proposta, que beneficia cerca de 15 milhões de brasileiros e taxa apenas 141 mil pessoas mais ricas, conquistou ampla aprovação e deixou a oposição sem argumentos.
"Eu nunca tinha visto isso para o lado do governo. Tem comunicações boas, tem cortes de pessoas defendendo os textos de uma maneira clara", destacou um especialista consultado por José Roberto de Toledo sobre a repercussão do projeto nas redes sociais. Segundo o colunista, "foi uma lavada mesmo impressionante" na comunicação governamental.
A proposta, capitaneada pelo ministro Fernando Haddad, saiu do "corner" onde estava sendo pressionado nas semanas anteriores. O projeto prevê isenção para quem ganha até R$ 5 mil e um abatimento para rendas de até R$ 7 mil, além da criação de um imposto adicional para os super-ricos, apelidados por Thais Bilenky de "Grande Faria Lima".
O que você precisa saber sobre a China, segundo Haddad
Jose Roberto de Toledo

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem demonstrado especial interesse em entender a ascensão econômica chinesa. No podcast A Hora desta semana, José Roberto de Toledo compartilhou uma lista de leituras recomendadas pelo ministro, que abrange desde análises históricas até interpretações contemporâneas sobre o gigante asiático.
"A China não é novidade nenhuma, só está retomando um papel histórico se você pensar milenarmente e não apenas nos últimos dois ou três séculos", explica Toledo ao apresentar os livros que formam a biblioteca chinesa de Haddad. Entre as obras citadas está "Adam Smith em Pequim", do sociólogo italiano Giovanni Arrighi, que já em 2008 previu essa nova hegemonia chinesa na economia mundial.
Outro livro importante na lista é "Reorient", do economista alemão André Franck, que desafia a visão eurocêntrica da história econômica ao argumentar que até o século 18 quem mandava na economia mundial, ou era o maior e principal ator, era a Ásia e não o Ocidente. Dentro da Ásia, o poder era a China.
Toledo destaca ainda "Duas Revoluções: Rússia e China", do historiador britânico Perry Anderson, que compara as diferentes trajetórias desses países após transformações em seus sistemas comunistas, e "Capitalismo, Apenas", de Branko Milanovic, que aborda o capitalismo político chinês.
O livro que parece ter mais impactado o ministro, segundo Toledo, é "Como a China Escapou da Terapia de Choque", da economista alemã Isabella Weber. A obra analisa como a China rejeitou as prescrições neoliberais do Consenso de Washington que foram seguidas pela Rússia com resultados ?catastróficos?, optando por criar o seu próprio mercado.
A curiosidade de Haddad sobre a China pode estar relacionada ao atual cenário geopolítico, com a guerra comercial entre China e Estados Unidos impactando a economia global. Como Toledo mencionou na conversa com o ministro, essas tensões podem até ter "uma coisa positiva para o Brasil, como, por exemplo, a transferência de fábricas, de plantas industriais chinesas para o Brasil."
O interesse de Haddad por entender os fundamentos do sucesso econômico chinês reflete uma preocupação estratégica com o posicionamento brasileiro em um cenário internacional em transformação, onde a China emerge como potência econômica dominante após séculos de hegemonia ocidental.
Quem é o ideólogo por trás do líder chinês Xi Jinping
Thais Bilenky e José Roberto de Toledo

Wang Huning, um nome pouco conhecido no Ocidente, é apontado como o principal ideólogo do Partido Comunista Chinês e ghostwriter dos três últimos líderes do país, incluindo o atual presidente Xi Jinping. Trata-se de um intelectual cuja trajetória e influência merecem atenção especial para quem deseja entender o pensamento político chinês contemporâneo.
"Ele é um personagem de livro, de literatura, porque ele era um acadêmico chinês, dava aula em uma das principais universidades chinesas", explica José Roberto de Toledo ao apresentar Wang Huning. Especializado na história da ciência política ocidental, Wang viajou para os Estados Unidos entre o final dos anos 1980 e início dos 1990, onde permaneceu por seis meses como professor convidado.
Ao contrário de muitos intelectuais que retornam de temporadas no exterior adotando ideias estrangeiras, Wang voltou à China e escreveu "America Against America" (América Contra Ela Própria), uma crítica contundente ao "liberalismo exacerbado nos Estados Unidos" e ao que ele chamou de "decadência moral" da sociedade americana.
Após essa experiência, Wang abandonou a academia e ingressou na burocracia do Partido Comunista Chinês, onde teve uma ascensão meteórica. "Ele acaba sendo nomeado para o comitê permanente do Politburo, que são os sete que mandam na China: o Xi Jinping mais seis. Ele é um dos seis", destaca Toledo, evidenciando a importância deste personagem na estrutura de poder chinesa.
Segundo Kerry Brown, estudioso britânico citado por Toledo, Wang é responsável pela prevalência do "neoconservadorismo ou do neoautoritarismo chinês" na ideologia do Partido Comunista. Esta visão defende a cultura chinesa contra a influência ocidental, principalmente americana, e reforça a predominância do Partido Único, do Partido Comunista, centralismo democrático, unidade na luta.
Toledo ressalta a importância de compreender figuras como Wang em um contexto de crescente influência global chinesa: "Enquanto o Trump e o Elon Musk gritam nas redes sociais, o Wang Huning sussurra no ouvido do imperador, que por enquanto é da China, mas sabe-se lá do imperador do que será."
A influência de Wang Huning representa um contraponto ideológico aos valores ocidentais e ajuda a explicar a resistência chinesa à americanização, mesmo em tempos de intensa globalização econômica. Seu papel como arquiteto intelectual das políticas de Xi Jinping o torna uma figura essencial para compreender a China contemporânea e suas ambições geopolíticas.
Cartórios vão ganhar mais com novo Código Civil, e você paga por isso
Thais Bilenky e José Roberto de Toledo

A reforma do Código Civil em tramitação no Senado prevê um aumento significativo nos poderes e nas competências dos cartórios brasileiros, o que deve resultar em mais despesas para a população, especialmente a de baixa renda. A proposta elaborada pela Comissão de Juristas traz mudanças que vão além de simples atualizações legislativas.
"Hoje, um imóvel com valor igual ou maior a 30 salários mínimos precisa de escritura lavrada em cartório para ser comprado ou vendido. O texto estabelece que qualquer compra de qualquer imóvel de qualquer valor passe necessariamente a ter que ter escritura em cartório", destaca Bilenky ao explicar uma das mudanças mais relevantes que afetaria diretamente pessoas de menor poder aquisitivo.
Outra alteração significativa diz respeito aos divórcios e dissoluções de união estável, que atualmente podem ser feitos em cartório apenas se forem consensuais. Com o novo texto, esse procedimento poderia ser realizado "mesmo unilateralmente", sem a necessidade de acordo entre as partes. O mais alarmante é que a proposta permite que até mesmo a guarda de filhos menores seja definida em cartório, retirando do Judiciário uma responsabilidade tradicionalmente sua.
Quando questionado sobre essas mudanças, o relator geral do texto no Senado, Flávio Tartuce, defendeu que as alterações "desburocratizam" e apenas consolidam práticas já adotadas pelos tribunais. "Ah, mas sempre é possível recorrer ao Judiciário se houver algum problema", respondeu Tartuce quando questionado sobre a retirada de uma "camada de proteção importante".
"Isso onera, sobretudo, a população de mais baixa renda", aponta Bilenky sobre a obrigatoriedade de escritura para qualquer imóvel, independentemente do valor. José Roberto de Toledo ironizou a justificativa da desburocratização: "Você levar alguma coisa para o cartório e desburocratiza. Essa é nova, né? Isso realmente é original."
Apesar de Tartuce afirmar que algumas dessas propostas não foram ideias da comissão, mas de "entidades" não especificadas, a colunista do UOL lembrou que existe uma "bancada de deputados e senadores que são donos de famílias donas de cartórios", além de um "lobby organizado dos cartórios" que atuaria nos bastidores.
O novo Código Civil já foi apresentado oficialmente, com autoria do senador Rodrigo Pacheco, em um evento que contou com a presença de ministros do Supremo Tribunal Federal, do governo Lula e dos presidentes da Câmara e do Senado, Hugo Motta e Davi Alcolumbre. A expectativa é que a comissão temática para debater o texto no Senado seja instalada em breve, começando formalmente a tramitação de uma legislação que, tradicionalmente, é feita para durar um século.
Podcast A Hora, com José Roberto de Toledo e Thais Bilenky
A Hora é o podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo. O programa vai ao ar todas as sextas-feiras pela manhã nas plataformas de podcast e, à tarde, no YouTube. Na TV, é exibido às 16h. O Canal UOL está disponível na Vivo TV (canal nº 613), Sky (canal nº 88), Oi TV (canal nº 140), TVRO Embratel (canal nº 546), Zapping (canal nº 64) e no UOL Play.
Escute a íntegra nos principais players de podcast, como o Spotify e o Apple Podcasts já na sexta-feira pela manhã. À tarde, a íntegra do programa também estará disponível no formato videocast no YouTube. O conteúdo dará origem também a uma newsletter, enviada aos sábados.
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