Fernando Collor, o primeiro e o último
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A prisão de Fernando Collor de Mello, determinada pelo Supremo Tribunal Federal, encerra mais um capítulo na trajetória política do ex-presidente que marcou a história recente do Brasil.
O tema é um dos destaques do episódio desta semana do A Hora, podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo, disponível nas principais plataformas. Ouça aqui.
"O primeiro presidente eleito pelo voto direto após a ditadura, o primeiro a renunciar para evitar o impeachment, o primeiro a ser julgado e condenado e o último a ser preso", resume Toledo, destacando os marcos da trajetória de Collor. "O último porque é o mais recente", completa.
Toledo, que cobriu a carreira de Collor desde o início, recorda o surgimento do político no cenário nacional em 1989, como "um fenômeno midiático e marqueteiro, coisa que a gente não tinha visto até então na política brasileira". O colunista destaca que Collor era "candidato jovem, tinha 40 anos, atlético, falava direto para câmera, sabia se relacionar com a câmera, andava de jet ski, posava de kimono como praticante de artes marciais, era vendido em suma como a cara da modernidade da época".
Essa imagem moderna, no entanto, escondia raízes tradicionais do poder político brasileiro. "Por trás dessa embalagem vistosa, tinha uma estrutura tão velha quanto as oligarquias que dominavam o Brasil e que produziram o Collor", analisa Toledo. "Collor era filho do ex-senador Arnon de Mello, a família era dona de um império regional de comunicação, lá em Alagoas, jornais, rádio, retransmissão da TV Globo. E usou tudo isso para se projetar nacionalmente."
O contexto político de 1989, com o desgaste do governo Sarney e o temor das elites em relação à ascensão da esquerda, representada por Lula e Brizola, criou o ambiente perfeito para a candidatura de Collor. "Ele era o candidato com a roupa certa, na hora certa", define Toledo.
O colunista lembra que Collor se apresentava como alternativa a Ulysses Guimarães, então com 73 anos, "que carregava todo o desgaste da imagem do governo Sarney e, na época, tomava lítio para controlar os efeitos da doença de Parkinson, que estava começando". Em contraste, Collor "assumiu um discurso ultraliberal, que não era moda na época", defendendo privatizações e o que chamava de "choque de capitalismo".
O populismo de Collor tinha como principal bandeira o combate aos "marajás" do serviço público. "Era um clássico do populismo de direita, que é o discurso moralista, mas no fundo elitista e muito performático", analisa Toledo. Ironicamente, observa ele, "o Collor foi embora, está preso e os marajás continuam aí, passando muito bem, obrigado. Aliás, nunca foram tantos".
Toledo destaca momentos da relação conflituosa de Collor com a imprensa, especialmente com veículos críticos a seu governo, como a Folha de São Paulo, onde o colunista trabalhava. "Collor hostilizava os veículos que eram críticos a ele e chegou a processar a Folha de São Paulo, quatro jornalistas da Folha de São Paulo, entre eles o diretor de redação, Otávio Frias Filho."
O jornalista, que na época editava o Painel da Folha, foi incumbido pelo próprio Frias de fazer o que chamou de "diplomacia institucional entre o jornal e o governo", o que o levou a participar de jantares com a presença do então presidente. Nesses encontros, Toledo pôde observar o comportamento de Collor, que descreve como "um cara rancoroso".
Para Toledo, Collor personifica o personagem do romance "O Leopardo" (Il Gattopardo), de Giuseppe Tomasi di Lampedusa: "Ele foi vendido como algo novo, mas reciclava só as práticas mais antigas da política. O governo dele misturou personalismo, propaganda e captura do Estado, porque teve muita corrupção, e terminou no impeachment."
A trajetória do ex-presidente, na visão de Toledo, corrobora a célebre frase do livro: "Se quisermos que tudo continue como está, é preciso que tudo mude. O Collor encarnou isso, ele era a mudança para não mudar nada."
A ironia final, observa Toledo, está no argumento usado pela defesa de Collor para evitar a prisão: a alegação de que toma lítio por sofrer de mal de Parkinson, "exatamente o que usou como, não explicitamente, mas foi um dos argumentos contra o Ulysses na campanha que lançou o Collor à presidência em 1989". Como conclui o colunista do UOL: "Terminou como começou, mas ao contrário."
Podcast A Hora, com José Roberto de Toledo e Thais Bilenky
A Hora é o podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo. O programa vai ao ar todas as sextas-feiras pela manhã nas plataformas de podcast e, à tarde, no YouTube. Na TV, é exibido às 16h. O Canal UOL está disponível na Vivo TV (canal nº 613), Sky (canal nº 88), Oi TV (canal nº 140), TVRO Embratel (canal nº 546), Zapping (canal nº 64) e no UOL Play.
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