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Brasileiro está pessimista com o país, mas otimista consigo mesmo

Uma pesquisa exclusiva do Ipsos-Ipec revela um fenômeno curioso na opinião pública brasileira: enquanto os cidadãos demonstram pessimismo coletivo sobre o futuro do país, mantêm-se otimistas em relação às suas situações pessoais. Os dados expõem uma contradição que pode definir os rumos políticos do Brasil.

O tema é um dos destaques do episódio desta semana do A Hora, podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo, disponível nas principais plataformas. Ouça aqui.

"O brasileiro está de mau-humor, só que ele só está de mau-humor coletivamente. Individualmente, ele continua um otimista", explica Toledo ao apresentar os resultados da pesquisa sobre confiança do consumidor. "Comigo tá tudo bem, o problema são os outros", resume o colunista sobre a mentalidade predominante.

Os números são reveladores dessa dualidade. Quando questionados sobre o desemprego nos próximos seis meses, 50% dos entrevistados acreditam que a situação vai piorar, contra apenas 20% que esperam melhora. Em relação à inflação, o pessimismo é ainda mais acentuado: 66% preveem alta dos preços, enquanto apenas 11% apostam em redução.

Porém, ao avaliar a situação financeira pessoal, o cenário se inverte completamente. "31% diz que está melhor, 43% diz que está igual e só 25% diz que está pior", detalha Toledo. "Só um quarto dos brasileiros acham que a situação financeira hoje é pior do que era três meses atrás."

O endividamento pessoal segue a mesma lógica paradoxal. Apesar das estatísticas oficiais mostrarem aumento do comprometimento da renda com dívidas, 41% dos entrevistados afirmam estar menos endividados ou sem dívidas, contra 27% que admitem maior endividamento.

A pesquisa também revelou diferenças políticas significativas. Entre eleitores de Bolsonaro, 34% dizem estar mais endividados, enquanto apenas 29% se consideram menos endividados. Já entre os eleitores de Lula, os números se invertem: 22% admitem maior endividamento e 50% se veem em melhor situação financeira.

"Tem uma divisão política de percepção e também de comportamento. Provavelmente, o eleitor do Bolsonaro é um cara que toma mais risco e, portanto, se endivida mais", analisa Toledo, destacando que esse grupo também demonstra maior pessimismo geral.

Para o futuro, a confiança individual se mantém. Sobre a renda nos próximos seis meses, 23% esperam aumento contra 19% que preveem redução, com 55% apostando na estabilidade. No consumo de bens duráveis, apenas 15% antecipam redução, enquanto 34% projetam crescimento.

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"Dá para ler que tem um eleitorado que está meio mal-humorado, mas, de alguma forma, confiante que a vida vai ficar nos trilhos", interpreta Toledo. Segundo ele, essa percepção oferece "alguma margem de manobra para o governo" em termos eleitorais.

"Esse eleitor dá alguma esperança para o governo de que ele tem alguma chance na eleição. Porque se o pessimismo fosse não apenas com o país, com os outros, mas consigo próprio, aí eu te digo que a eleição já estava definida antes de começar", pondera o colunista.

A análise ganha relevância especial considerando que, conforme Toledo, esse índice de confiança do consumidor "tem a maior correlação com avaliação do presidente da república" e "nada oscila tão junto da avaliação que a população faz de um governante".

Diante desse cenário, o governo Lula tem demonstrado urgência em ações que possam converter o otimismo individual em aprovação política. Um exemplo foi o anúncio improvisado de um programa de crédito para reforma de casas durante a Marcha dos Prefeitos, onde o presidente foi vaiado.

"Ele rasgou o discurso" e anunciou uma política que ainda não estava pronta, conta Thais Bilenky. "Vamos anunciar uma política de crédito para a reforma de casa", disse Lula no evento, misturando programas diferentes em desenvolvimento e criando expectativas sobre medidas ainda em elaboração.

O episódio ilustra como "o governo está improvisando em cima da necessidade de fazer alguma coisa para melhorar", nas palavras de Bilenky. Para Toledo, a mensagem é clara: "Tem chance? Tem. Mas ele precisa fazer alguma coisa para mudar. Do jeito que está, não dá a reeleição."

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A pesquisa Ipsos-Ipec expõe, assim, um Brasil dividido entre a descrença coletiva e a esperança individual - uma contradição que pode ser decisiva para definir não apenas o humor nacional, mas também o futuro político do país.

Podcast A Hora, com José Roberto de Toledo e Thais Bilenky

A Hora é o podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo. O programa vai ao ar todas as sextas-feiras pela manhã nas plataformas de podcast e, à tarde, no YouTube. Na TV, é exibido às 16h. O Canal UOL está disponível na Claro (canal nº 549), Vivo TV (canal nº 613), Sky (canal nº 88), Oi TV (canal nº 140), TVRO Embratel (canal nº 546), Zapping (canal nº 64), Samsung TV Plus (canal nº 2074) e no UOL Play.

Escute a íntegra nos principais players de podcast, como o Spotify e o Apple Podcasts já na sexta-feira pela manhã. À tarde, a íntegra do programa também estará disponível no formato videocast no YouTube. O conteúdo dará origem também a uma newsletter, enviada aos sábados.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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