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Alberto Bombig

REPORTAGEM

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Fux ajuda Bolsonaro na guerra eleitoral de narrativas

O presidente do STF, ministro Luiz Fux - Fellipe Sampaio/SCO/STF
O presidente do STF, ministro Luiz Fux Imagem: Fellipe Sampaio/SCO/STF

Colunista do UOL

15/06/2022 04h01Atualizada em 15/06/2022 14h28

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A declaração de Luiz Fux de que a anulação de processos pela Justiça "não apaga a corrução" foi entendida nos bastidores da política e da própria corte máxima como uma mão estendida pelo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) na direção de Jair Bolsonaro (PL), que enfrenta dificuldades para emplacar um discurso consistente eleitoralmente contra Lula (PT).
Estrategistas das principais campanhas preveem um recrudescimento dos ataques de Bolsonaro ao ex-presidente no tema "corrupção". Nos últimos dias, o atual presidente e seus filhos passaram a se referir preferencialmente a Lula como "o ex-presidiário".

A estratégia bolsonarista é aumentar a rejeição ao líder das pesquisas de intenção de voto e diminuir a possibilidade de ele vencer no primeiro turno. Em linhas gerais, segundo um auxiliar direto do presidente da República e outros integrantes do estafe bolsonarista, é possível dizer que Fux forneceu ao presidente e seus apoiadores o verniz jurídico necessário para os ataques a Lula e o combate à narrativa eleitoral do PT, alicerçada na tese da perseguição implacável ao petista e na inocência dele, líder isolado nas pesquisas de intenção de voto.

Ou seja, Fux deu a Bolsonaro alguma chance de sair das cordas na disputa de narrativas após Lula ter obtido sucessivas vitórias jurídicas, como a anulação de suas condenações, a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro e a declaração do Comitê da ONU de que a Lava Jato violou os direitos políticos do petista e não garantiu a ele um julgamento justo.

"Tive oportunidade, nesses dez anos de Supremo Tribunal Federal, de julgar casos referente à corrupção que ocorreu no Brasil. Ninguém pode esquecer que ocorreu no Brasil, no mensalão, na Lava Jato, muito embora tenha havido uma anulação formal, mas aqueles 50 milhões eram verdadeiros, não eram notas americanas falsificadas. O gerente que trabalhava na Petrobras devolveu 98 milhões dólares e confessou efetivamente que tinha assim agido", disse Fux, na sexta-feira (10) passada, em palestra no Pará.

Coordenador do grupo de advogados e juristas Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, filiado ao PT e próximo a Lula, diz que as declarações de Fux "são, no mínimo, inoportunas e indelicadas com a própria corte que ele preside". "O STF reacreditou o nosso sistema de justiça ao declarar, por maioria, a nulidade dos processos que envolviam o ex-presidente Lula e ao lhe devolver os seus direitos políticos e a condição de inocente. O que se espera do ministro Fux é uma autocrítica sobre o seu papel na alimentação do monstro do lavajatismo que pariu o bolsonarismo. Seria bom para a credibilidade do Supremo e das nossas instituições", disse.

Após a declaração, Fux foi saudado nas redes sociais por próceres do chamado lavajatismo (movimento de apoiadores da Lava Jato), como o ex-procurador Deltan Dallagnol e o ex-juiz Moro, líderes da operação, e a deputada estadual paulista Janaina Paschoal (PRTB), também entusiasta das ações jurídicas e policiais que levaram à prisão de Lula em 2018.

Em sua conta no Twitter, Moro escreveu: "Palavras fortes do ministro Fux. Todo o roubo ou o saque dos cofres públicos está sendo infelizmente esquecido. A crise é acima de tudo moral". Em junho de 2021, o plenário do Supremo confirmou, por 7 votos a 4, a decisão da 2ª Turma que declarou o ex-juiz suspeito para julgar Lula no caso do tríplex do Guarujá (SP). Com o resultado, as acusações contra o ex-presidente foram anuladas.

DIVISÃO NA CORTE
Na segunda-feira, o ministro Gilmar Mendes, crítico aos métodos utilizados pela Lava Jato, fez questão, durante um almoço com empresários no Rio, de comentar as declarações de Fux. "Ninguém discute se houve, ou não, corrupção. O que se cobra é que isso seja feito seguindo o devido processo legal. Não se combate crime cometendo crime. Se você usou a prisão provisória alongada para obter delação, isso tem outro nome. Se chama tortura. Estamos vivendo a discussão sobre delatores que dizem que foram forçados a fazerem delação em relação a este ou aquele", disse ele.

Nos bastidores da corte, persistem dúvidas sobre a posição de Fux na crise entre Bolsonaro e o Supremo, agravada após o presidente da República ter concedido, em abril passado, o indulto ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ). Por isso, a declaração do ministro sobre a corrupção foi vista com preocupação pelo grupo dos chamados "progressistas" e por aqueles que costumam ser alvo dos ataques do presidente da República.