Amanda Cotrim

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Inspirada em Trump, Argentina vai taxar educação e saúde para estrangeiros

O presidente da Argentina, Javier Milei, publicou decreto hoje que muda a legislação migratória de 2004 e endurece as condições para a entrada e permanência de estrangeiros e a obtenção de cidadania. Com a nova norma, hospitais nacionais vão cobrar de imigrantes que não tenham residência permanente. Além disso, as universidades públicas nacionais poderão cobrar mensalidade de alunos com residência temporária ou provisória.

Por razões humanitárias, diz o decreto, os serviços de saúde vão manter atendimento gratuito de situação de emergência a estrangeiros que entraram irregularmente ou que não contem com a residência permanente.

O decreto só pode ser derrubado pelo Senado e Câmara e segue vigente até a análise das duas casas. O texto publicado hoje no diário oficial do país referencia a política migratória de Donald Trump para justificar a reforma migratória argentina. O texto do decreto se refere a "um novo risco derivado da política de deportações que está promovendo o governo dos Estados Unidos" (...) "que já deportou mais de 1.250.000 imigrantes nacionais de países americanos, dos quais mais de 138.000 são de países sul-americanos". Por esse motivo, diz o decreto, é "necessário implementar mecanismos que fortaleçam a capacidade do Estado Nacional de questionar os fluxos migratórios de maneira eficiente, melhorar o controle nas fronteiras e assegurar que a chegada de estrangeiros contribui ao bem estar geral e não comprometa a segurança e nem a estabilidade social da Nação".

Segundo dados do Censo de 2022, 2 milhões dos 46 milhões de habitantes argentinos são estrangeiros. Desses, apenas 365 mil têm acesso ao sistema educacional público e mais da metade utiliza a medicina particular.

20 mil brasileiros são estudantes na Argentina

A educação é uma das mudanças mais significativas, já que a lei de imigração de 2004 permitia acesso a todos os níveis educacionais de modo público e gratuito a qualquer estrangeiro em território nacional, independente de seu status migratório. A justificativa de Milei para que as universidades passem a cobrar de estrangeiros é "tornar a vida do cidadão argentino mais sustentável".

"Durante anos, houve um fluxo de estrangeiros entrando no país e solicitando residência com o único propósito de cursar graduação gratuitamente em universidades públicas na Argentina. Isso ocorre porque, em seus países de origem, as instituições universitárias são particulares e têm custos elevados, ou têm capacidade limitada de acesso gratuito", diz o decreto.

O governo também justificou que a precária situação do orçamento público para setores de educação e ciência, que levou milhões de argentinos às ruas protestar contra o governo, se deve aos estrangeiros que não pagam pelos de educação universitária. "Em virtude das reclamações do setor para maiores recursos para as universidades, é necessário implementar uma medida que, sem colocar em risco o equilíbrio fiscal, permita que as universidades nacionais cubram suas despesas e garantam o bom funcionamento do serviço educacional".

O acesso público, gratuito e sem vestibular como o que se conhece no Brasil, atraiu durante anos milhares de brasileiros que tinham o sonho do nível superior. Atualmente, dos 90 mil brasileiros residentes na Argentina, cerca de 20 mil são estudantes, segundo dados do Itamaraty.

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De acordo com o governo Milei, o número de estudantes estrangeiros em universidades estaduais cresceu de 35.202 em 2015 para 82.797, em 2023. No mesmo período, o número de estrangeiros em universidades particulares cresceu 58%. De acordo com dados publicados no DNU, a Universidade de Buenos Aires (UBA), a maior da Argentina, tem atualmente 325.421 estudantes de graduação, dos quais 38.185 são estrangeiros.

Os principais alvos do governo argentino são os estudantes de medicina. Segundo os dados do decreto, as universidades estatais que oferecem o curso receberam 25% mais estrangeiros em 2023. "É um absurdo que o regime atual garanta acesso gratuito às universidades públicas aos imigrantes".

Acordo bilateral facilita residência a brasileiros

Por conta de um acordo bilateral com o Brasil, vigente desde 2005, os brasileiros que decidem morar na Argentina solicitam a residência permanente diretamente, sem a necessidade de obter a residência provisória, como outros estrangeiros.

Desde que Milei assumiu a presidência, a Argentina passou a exigir o visto de estudante a todos os estrangeiros que desejavam cursar faculdade no país, seja ao nível de graduação ou pós-graduação, independente de ser brasileiro.

Endurecimento para obter a residência permanente na Argentina

Entre as mudanças presente do decreto está a obrigação de apresentar comprovantes econômicos suficientes para "sobreviver no país". Essa exigência não era feita em anos anteriores. Antes, o solicitante precisava apenas apresentar antecedentes penais no país de origem e na Argentina, além de arcar com as taxas migratórias. A nova norma migratória não permitirá, entre outros, que nenhum estrangeiro condenado ou com antecedentes por delitos dolosos contra a vida, a integridade sexual ou poderes públicos e ordem constitucional, sejam admitidos na Argentina.

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A nova normativa também diz que os estrangeiros deportados dos EUA representam um grande sinal de alerta para a Argentina, pois se pressupõe que se entraram de modo irregular em outro país, farão o mesmo agora.

"Dado seu status de deportados, esses imigrantes teriam um histórico de entrada ilegal em outro país, então é razoável supor que sua entrada em nosso território não foi legítima, mas sim irregular", diz o decreto.

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