Andreza Matais

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Reportagem

Pé-de-Meia não pode ser prejudicado, diz ministro da Educação

O ministro da Educação, Camilo Santana, defendeu o Pé-de-Meia em entrevista ao UOL no sábado (1), após o programa virar alvo de bate-boca durante a eleição de Davi Alcolumbre (UB-AP) para a Presidência do Senado.

O Pé-de-Meia, que paga uma bolsa para estimular a permanência no Ensino Médio, teve R$ 6 bilhões bloqueados após reportagens do UOL revelarem que o governo opera o programa com um "orçamento paralelo" e sem qualquer transparência. Não é possível saber de onde são os alunos beneficiados, por exemplo, apesar de a legislação exigir a divulgação.

O ministro, que é senador licenciado, falou com o UOL ainda no plenário do Senado, quando disse esperar que o "bom senso" prevaleça. O bloqueio do pagamento foi determinado pelo plenário do TCU (Tribunal de Contas da União) que confirmou as ilegalidades reveladas pelo UOL. Com isso, não há mais recursos para pagar a mesada aos estudantes a partir deste mês.

"Segundo os técnicos da Fazenda, não há nenhum erro [no Pé-de-Meia]", insistiu. "O programa não pode ser prejudicado por essa questão."

Com certeza o governo vai garantir a continuidade do programa. Espero que o bom senso prevaleça.
Camilo Santana, ministro da Educação

As explicações do governo, contudo, não convenceram a totalidade dos ministros do TCU.

TCU viu ação fora do orçamento

O governo utilizou dinheiro do Fies (Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior) para bancar o Pé-de-Meia, sem pedir autorização para o Congresso, o que fere a Lei de Responsabilidade Fiscal, a Constituição e a própria lei do Pé-de-Meia. Cabe ao Congresso autorizar ou não a despesa com políticas públicas.

O relator o processo é o ministro Augusto Nardes.

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Com base na decisão do TCU, parlamentares da oposição fizeram um requerimento que já reúne 100 assinaturas pedindo o impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por crime de responsabilidade. Até congressistas de partidos da base aliada, com ministérios na Esplanada, assinaram o pedido. O movimento acendeu o alerta no Palácio do Planalto que escalou três ministérios para tentar reverter a decisão - Casa Civil, Fazenda e AGU (Advocacia Geral da União).

As reportagens do UOL que motivaram o processo do TCU começaram a ser publicadas em outubro de 2024.

A AGU argumenta que a suspensão do dinheiro faria o programa parar. O Pé-de-Meia atende 4 milhões de alunos, segundo o governo. O número, contudo, não pode ser checado devido a falta de transparência no programa imposta pelo MEC.

Camilo Santana disse ao UOL que a transferência dos R$ 6 bilhões do fundo do Fies para o Pé-de-Meia foi autorizada pelo Congresso. Para o ministro, o dinheiro não poderia ter sido bloqueado pelo TCU.

Aziz chamou Nardes de "golpista"

O bate-boca no Senado no sábado começou quando o senador Omar Aziz (PSD-AM), vice líder do governo, subiu à tribuna e defendeu o Pé-de-Meia.

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Faltavam alguns minutos para começar a votação que elegeria Davi Alcolumbre para a Presidência do Senado. Naquele momento, as falas na tribuna estavam reservadas a defender as candidaturas.

Com o ministro da Educação no plenário do Senado, Aziz criticou o bloqueio do programa federal determinado pelo TCU e o pedido de impeachment de Lula feito pela oposição.

"Sabe qual é a discussão? É se houve ou não pedalada. Vindo [a início da discussão] de um cidadão que hoje está no TCU e é um golpista — é golpista", criticou Aziz, se referindo a Nardes.

E aí eu não vejo nenhum senador aqui pedir o impeachment do ministro do TCU, mas vai chegar o momento dele, sim, vai chegar o momento.
Omar Aziz, senador

No cafezinho do Senado, depois que desceu da tribuna, Aziz confirmou ao UOL que falava do ministro Nardes.

"A brincadeira do Augusto Nardes em dizer que há 'pedalada'. 'Pedalada' tá na cabeça dele!", protestou o senador. "A imprensa divulgou mais isso do que a importância do Pé-de-Meia", acrescentou. "Estão pedindo o impeachment do Lula por causa disso: 108 deputados".

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A decisão, entretanto, foi referendada por todos os ministros do TCU e não apenas por Nardes.

Em 2016, Nardes foi o relator das contas do governo Dilma Rousseff e incluiu o resultado de uma auditoria realizada pelo então ministro da Corte, José Múcio Monteiro (atual ministro da Defesa), que apontou "pedaladas fiscais" (manobra contábil feita pelo Poder Executivo para cumprir as metas fiscais, fazendo parecer que haveria equilíbrio entre gastos e despesas nas contas públicas).

O Congresso entendeu que houve crime de responsabilidade e aprovou o impeachment da petista.

Enquanto Aziz falava na tribuna, foi interrompido pelo colega Esperidião Amim (PP-SC).

"Isso não é correto. Esta sessão não pode admitir esta pregação facciosa que o meu querido amigo Omar Aziz está fazendo. Eu penso diferente dele, mas não quero politizar e partidarizar a reunião", rebateu.

Ainda na presidência do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), interferiu: "Esse é o encaminhamento acerca das candidaturas. Eu peço apenas que fiquemos adstritos a esse escopo da manifestação."

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Amin explicou sua ação ao UOL : "Eu interferi porque acho que ele [Aziz] estava exorbitando. Eu fiz certo."

Leia entrevista com Camilo:

O TCU bloqueou R$ 6 bilhões do Pé-de-Meia porque que o programa recebeu recursos do Fies sem passar pelo Orçamento...
A lei é clara. Ela determinou que os recursos do fundo do Fies, que é privado, fossem para outro fundo, do Pé-de-Meia. Segundo os técnicos da Fazenda, não há nenhum erro nessa operação. O programa não pode ser prejudicado por essa questão.

O senhor disse que a lei autorizou transferir dinheiro do fundo do Fies para o do Pé-de-Meia. Mas o Fies tem inadimplência de alguns bilhões de reais. Por que o governo transferiu R$ 6 bilhões do Fies ao Pé-de-Meia mesmo assim?
Mas o fundo do Fies é só para garantir as operações que foram feitas [os empréstimos para estudantes pagarem suas faculdades]. Não houve nenhum comprometimento do Fies. A inadimplência é outra coisa. Quem assume a inadimplência no Fies deve ser o próprio governo federal. Inclusive, nós estamos mudando o Fies. Agora estamos cruzando as informações. Você consegue fazer a cobrança [do empréstimo] de acordo com a renda da pessoa. Tem gente que não paga porque não pode. E tem gente que não paga porque não quer. Não é justo isso.

Em fevereiro, está previsto o primeiro pagamento do Pé-de-Meia para os beneficiários após a decisão do TCU.
Só dia 24. Só paga depois que o ano letivo começar. São 10 parcelas no ano.

Qual a estratégia do governo Lula para pagar o Pé-de-Meia de fevereiro, enquanto a disputa não se resolve no plano jurídico? O governo Lula tem outras fontes de recursos para usar no Pé-de-Meia?
Com certeza o governo vai garantir a continuidade do programa. Espero que o bom senso prevaleça.

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Com base na decisão do TCU, parlamentares pediram o impeachment do presidente Lula. Como o senhor vê isso?
Não existe isso. É um discurso de oposição, não tem o menor sentido. Os próprios congressistas aprovaram a lei [do Pé-de-Meia].

O pedido de impeachment tem parlamentares da base, como de partidos que têm três ministérios...
[Santana faz cara de reprovação e silencia. Assessor do ministro brinca: "Você vem com essas perguntas..."]

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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