Presidente da CCJ diz ter apoio no STF para discutir anistia pelo 8/1
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O presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e vice-líder do governo no Senado, Otto Alencar (PSD-BA), disse à coluna que ministros do Supremo com quem tem conversado "não veem como afronta" a aprovação, pelo Congresso, de um projeto de anistia para os golpistas do 8 de Janeiro.
Ele admite pautar o projeto, desde que haja apoio da maioria dos líderes ou de senadores. A posição é importante porque a CCJ é o primeiro passo para um projeto tramitar no Congresso. Como presidente do colegiado, o senador poderia engavetar o tema se quisesse.
O senador afirma que reconhece no ministro Alexandre de Moraes o responsável por "respirarmos a democracia" hoje, mas afirma que "não existe Deus intocável nos tribunais" a ponto de não serem contestados. Para o parlamentar, as penas de até 17 anos para quem quebrou vidros, pichou a estátua com batom ou quebrou o relógio do século XVII estão exageradas.
A seguir, a conversa do senador com a coluna:
UOL - A Anistia tem alguma chance de ser votada?
Otto Alencar - Se tiver requerimento de urgência para votar, sim. Não sei como o Davi (Alcolumbre, presidente do Senado) vai se comportar. Vou conversar com ele. Do ponto de vista pessoal, não estou falando pelo presidente da CCJ, sou contra. Mas é uma decisão coletiva.
UOL - É o senhor quem faz a pauta da CCJ. Não engavetaria a proposta por ser contra?
Otto Alencar - Não dá para segurar quando os líderes fazem um acordo e encaminham requerimento de urgência para votar. Aí você segue o Regimento (conjunto de normas que rege as atividades do Congresso). Quando o presidente de qualquer comissão foge do regimento, ele perde a voz. Agora, se vem só um requerimentozinho de um grupo pequeno, que não significa a maioria, aí não pauto.
UOL - São dois projetos tramitando: um no Senado, do Hamilton Mourão, e outro na Câmara, do Major Victor Hugo. O Senado tem maioria conservadora. Pode aprovar mais rápido?
Otto Alencar - Estou vendo que vai entrar pela Câmara, mas depende dos líderes. Aí tem que conversar com o (Jaques) Wagner (líder do governo no Senado pelo PT-BA), com os líderes do PT, do PSD... Vamos ver se existe um entendimento de ordem parlamentar que forme a maioria para pressionar para isso aí.
UOL - O senhor vê ambiente para o Congresso discutir anistia?
Otto Alencar - Eu não posso responder pelo todo. Houve a iniciativa da PGR (Procuradoria Geral da República), que fez acordo com vários dos réus, e também a decisão do ministro (do Supremo) Luiz Fux (que expôs sua posição pela revisão da dosimetria no caso da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos). É preciso diferenciar a pena das pessoas que foram induzidas e doutrinadas para executar a depredação do patrimônio público daquelas que tinham consciência do que estavam fazendo.
UOL - Qual seria o critério para diferenciação?
Otto Alencar - Uma coisa é a moça que usou o batom para pichar a estátua, o cara que quebrou o vidro, o outro que derrubou o relógio. Na minha opinião, essas pessoas não conhecem a Constituição, não sabiam da gravidade do problema, que o relógio tinha aquela representação histórica. Outra coisa são os generais que tiveram as estrelas enlameadas, querendo dar golpe militar ao lado do presidente, conscientes do que estavam fazendo.
A ministra Carmen Lúcia (do Supremo) disse que a ditadura mata, tá certo? Eu convivi com isso. Eu tinha 16 anos quando invadiram a minha sala de aula e levaram um colega meu, que nunca mais apareceu. A ditadura não perdoa. Quem queria fazer isso e estava consciente, deve ter a penalidade que está prescrita na lei.
UOL - O senhor defende discutir a dosimetria da pena. É diferente da anistia, certo?
Otto Alencar - O que fizeram na época da Lava Jato não deu certo (refere-se a penas elevadas). Tem que se aplicar a lei. Eu acho que foi exagerado (as penas para os presos no 8 de janeiro). A lei não foi aplicada nesses casos. O cárcere, quando o cidadão do PCC vai para lá, ele sabe que está pagando pelo que fez. Mas para quem é inocente, é a maior justiça que pode ser feita. Então, esse é o problema.
UOL - A anistia livraria todos os que estavam lá no dia 8 de Janeiro?
Otto Alencar - Cada caso é um caso. Não vai ter regra geral para isso, como é na justiça.
UOL - Ministros do Supremo entendem a anistia como afronta. Como lidar com isso?
Otto Alencar - Eu tenho conversado com ministros lá, com quem tenho uma relação pessoal, que não entendem como afronta. Não existe Deus intocável nos tribunais, não. Absolutamente.
UOL - O senhor está falando do ministro Alexandre de Moraes, relator do processo?
Otto Alencar - Embora o ministro tenha sido ofendido gravemente pelo ex-presidente Bolsonaro, não vejo sentimento de ódio do Alexandre, nem de ressentimento, de mágoa, vingança. Tanto que ele foi flexível com a moça aí (do batom). Ele (Moraes) é uma pessoa muito correta. Eu converso com ele institucionalmente. Eu tenho uma admiração muito grande por ele. Todos os brasileiros que estão hoje respirando democracia, todos devem ao Alexandre. Ele que sustentou isso aí.
UOL - Quando o senhor fala que não existe Deus intocável, o senhor está falando de quem?
Otto Alencar - Não, não existe Deus nos tribunais. É isso que eu falei. Não tem ninguém ali que não pode ser questionado. Quem questiona juiz é advogado, com bons argumentos jurídicos, claro, observando o que está escrito no Código Penal, na legislação.
UOL - O Congresso, se votar uma anistia, também estará contestando o Supremo?
Otto Alencar - Não acho. A não ser que o Congresso não tenha mais liberdade para fazer leis. O Congresso toma decisões coletivas e por maioria. Não faz nada no singular.
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