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Balaio do Kotscho

De onde brotam esses jovens nazistas no Recife?

Alunos de escola particular do Recife fazem saudação nazista durante campanha para orador de turma - Reprodução/Redes Sociais
Alunos de escola particular do Recife fazem saudação nazista durante campanha para orador de turma Imagem: Reprodução/Redes Sociais

Colunista do UOL

06/03/2020 12h07

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Fiquei intrigado com essa notícia que li no online da Folha quinta-feira, em meio ao derretimento do mercado (ver comentário sobre isso no final do texto):

"Alunos de escola do Recife fazem saudação nazista em sala e postam imagem em rede social — Direção da escola diz que assim que tomou conhecimento dos fatos suspendeu estudantes".

Como filho de uma família que foi perseguida pelos nazistas durante a Segunda Guerra, ainda me assusto quando leio essas coisas, ainda mais acontecendo no meu país, 75 anos depois do Holocausto.

E me pergunto como surgem essas aberrações, de um dia para outro, numa cidade civilizada, que sempre cultivou a democracia e a hospitalidade, berço de líderes libertários perseguidos pela ditadura militar, um dos mais importantes centros culturais do país.

Reportagem de João Valadares relata que "um grupo de 11 alunos, com idades entre 16 e 17 anos, do colégio particular Santa Maria, um dos mais tradicionais do Recife, fez saudações nazistas em sala de aula durante campanha de um deles para ser orador da turma".

De onde esses jovens tiraram a inspiração? De algum professor ou pai de aluno, das milícias digitais mantidas por discípulos do olavismo, de algum livro, da pregação feita por algum amigo mais velho?

Convenhamos que, por mais barbaridades que aconteçam todo dia em nosso país, e logo são "naturalizadas", isso não é normal.

As imagens foram postadas pelos próprios estudantes na quarta-feira e apagadas algumas horas depois. "A conta @militância.2020 também foi removida", conta Valadares.

Vê-se um aluno de casaco preto no lugar do professor, enquanto os outros alunos, perfilados diante dele, repetem a saudação nazista. O texto do post, ao apresentar o candidato a orador, faz citações diretas ao nazismo. Os estudantes foram suspensos das aulas.

Gostaria muito de conversar com esses jovens para saber o que se passa na cabeça deles, o que eles sabem e pensam sobre o nazismo, o que pretendem fazer na vida.

Temo que outros grupos como esse estejam brotando neste momento em outras escolas do país e não se manifestam nas redes sociais, a gente nem fica sabendo.

Em tempos normais, caberia ao Ministério da Educação investigar essa história a fundo, mas não tenho esperança de que isso possa acontecer.

Em carta publicada no Painel do Leitor da Folha, Roque Alves, de São Paulo, também se mostrou surpreso com a notícia:

"Nazistas brasileiros? Tudo aqui é caricato e burlesco. Nós, um dos povos mais miscigenados da Terra, com veleidades 'arianas'? Tento imaginar quem são os heróis tropicais desses garotos e de seus pais".

É muito sério isso no momento em que se anuncia a instalação de escolas cívico-militares por todo o país, sem que a gente nada saiba sobre o currículo, a bibliografia e a metodologia que serão nelas adotadas, e quem vai comandar esse processo.

Me lembro dos meus pais me contando como o povo alemão não estava se dando conta do perigo que corria com as pequenas mudanças implementadas gradativamente no país, após a ascensão ao poder de um oficial subalterno, que foi eleito. Quando eles começaram a perceber a escalada autoritária, já era tarde demais.

No nosso país, é bom lembrar, a apologia ao nazismo constitui crime. Urge cortar esse mal pela raiz, enquanto é tempo.

***

Mercados: muita calma nesta hora

Aos leitores que me criticaram duramente na coluna anterior sobre as causas internas (o "pibinho" do Guedes e o show presidencial das bananas) que apontei para a da alta do dólar e as quedas na Bolsa, com a perda de confiança dos investidores, recomendo dar uma olhada com calma no gráfico publicado hoje na capa da Folha.

Muitos argumentaram que o fenômeno do derretimento dos mercados era mundial e não só brasileiro, por conta unicamente da epidemia do coronavírus.

Mas não é bem assim: sob o título "Real é a moeda que mais se desvaloriza em 2020", ficamos sabendo que, ante o dólar, o real perdeu 16% do seu valor este ano, mais do que o lilangeni da Suazilândia, o dólar da Namíbia e o loti do Lesoto, que registraram queda de 11%.

E nenhuma Bolsa do mundo civilizado teve uma queda maior do que a do Brasil (4,65% no fechamento).

É verdade que não entendo muito de economia, mas sei ler números, e não brigo com os fatos.

Vida que segue.