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Balaio do Kotscho

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Vacinado! Viva o SUS, o Butantan e o governo de São Paulo. Viva a vida!

Ricardo Kotscho toma a primeira dose de vacina contra a covid - Samir Salman/Hospital Premier
Ricardo Kotscho toma a primeira dose de vacina contra a covid Imagem: Samir Salman/Hospital Premier

Colunista do UOL

23/03/2021 17h49

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Poucas vezes na vida fiquei tão feliz e aliviado, com vontade de sair abraçando todo mundo, e dar uma banana aos negacionistas antivacina.

Mal consegui dormir na véspera, não vendo a hora de tomar a bendita vacina.

Acordei bem cedo e, como não sabia a que horas as vacinadoras chegariam ao hospital, fiquei o dia todo de plantão na porta do quarto, atento a qualquer movimento.

Eu não queria morrer na praia, depois de ver tanta gente morrendo na televisão, com a pandemia batendo trágicos recordes diários.

Era a minha vingança contra todos os idiotas que boicotaram a compra de vacinas até onde puderam.

Justiça seja feita: se não fosse o governo de São Paulo, o Instituto Butantan e o SUS, até hoje não teríamos iniciado a vacinação no Brasil.

Depois de rejeitar todas as propostas feitas pelos maiores laboratórios do mundo desde o ano passado, o Ministério da Saúde do general e do capitão aloprados só se mexeu quando o governo paulista marcou para o dia 25 de janeiro o início da vacinação em São Paulo.

Desde então, passei a contar nos dedos os dias que faltavam para chegar o 15 de fevereiro, data inicialmente marcada no programa de imunização de São Paulo para a minha faixa etária (demorou um pouco mais, mas chegou).

Minha vida passou a girar em torno disso: quando a vacina chegar, tudo vai ser diferente, vamos sair do sufoco, me aguardem.

Tentaram de todas as formas impedir que São Paulo rompesse a inércia do governo federal para aplicar as primeiras doses da "vacina comunista do Doria", que Bolsonaro desdenhou, referindo-se assim à parceria entre o Instituto Butantã e o laboratório chinês Sinovac para produzir a Coronavac, responsável pela vacinação de mais de 90% dos brasileiros até agora. .

Somos o único país do mundo em que o governo central combateu não a pandemia, mas todas as tentativas dos governos estaduais para adotar o isolamento social como única forma de evitar o colapso sanitário, que agora assola os brasileiros, com as vacinas chegando a conta-gotas.

Dimas Covas, o valente guerreiro do Butantan, cansou-se de avisar que os lotes de Coronavac já estavam prontos nas prateleiras do Butantan, em dezembro do ano passado, quando o entrevistei aqui no UOL, só esperando a autorização da Anvisa. Covas se emocionou quando lhe perguntei qual a primeira pessoa que gostaria de vacinar. "Minha mãe", respondeu, e mais não disse.

Quantas vidas poderiam ter sido salvas se a vacinação em massa no Brasil tivesse começado antes?

E quantos pacientes continuam sendo empilhados nas UTIs dos hospitais ou morrem nas filas porque não puderam ser vacinados a tempo?

Um dia os tribunais do futuro terão que fazer esta conta e criminalizar os cloroquineiros irresponsáveis.

Mesmo tendo a fantástica rede do SUS, maior sistema de saúde pública do mundo, capaz de imunizar dois milhões de pessoas por dia, o Brasil ainda se arrasta para prover os postos de saúde com vacinas para todos.

Fiquei pensando em tudo isso enquanto esperava chegar a minha vez.

Pouco antes das quatro da tarde desta terça-feira, quando a técnica de enfermagem Ellen finalmente entrou sorridente no meu quarto, com uma seringa de Coronavac na mão, eu nem acreditei.

O momento tão esperado durou apenas alguns segundos. Quando fui ver, já estava vacinado, livre dessa praga, e agora posso esperar mais tranquilo pela segunda dose, marcada para o próximo dia 13.

Entre uma e outra, vou iniciar semana que vem um tratamento oncológico, na certeza de que escaparei de mais essa cilada do destino, com a ajuda de médicos e enfermeiras que me enchem de esperança.

Quando fui operado pela primeira vez, de um tumor na cabeça, eu tinha apenas oito meses de vida e, segundo um médico disse a meus pais, as chances de sobrevida eram pequenas. Minha mãe alemã, refugiada de guerra, já tinha perdido três filhos antes de eu nascer. Fui o primeiro brasileiro da família.

Para minha sorte, de lá para cá, a medicina evoluiu muito, como sabemos, apesar da luta em contrário dos terraplanistas que cultivam a morte.

Viva a vida!

Vida que segue.

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