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OPINIÃO

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Verde e amarelo: Collor teve a mesma ideia, Bolsonaro pode ter o mesmo fim

Então candidato à Presidência, Fernando Collor faz comício em Arapiraca (AL) em 1989 - Jorge Araújo/Folhapress
Então candidato à Presidência, Fernando Collor faz comício em Arapiraca (AL) em 1989 Imagem: Jorge Araújo/Folhapress

Colunista do UOL

01/09/2021 17h37Atualizada em 01/09/2021 18h32

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13 de agosto de 1992.

Quase 30 anos atrás, alvo de um processo de impeachment no Congresso, Fernando Collor de Mello aproveitou um evento com motoristas de táxi no Palácio do Planalto para convocar a população a sair às ruas de verde e amarelo no domingo seguinte.

"A minoria atrapalha, a maioria trabalha. Vamos mostrar que já é hora de dar um basta a tudo isso. Vamos inundar o Brasil de verde e amarelo!"

Empolgado com as próprias palavras, Collor deu socos no púlpito e, aos gritos, convidou todo o Brasil a ir às ruas em sua defesa vestindo as cores da bandeira.

Dois dias depois, reforçou o apelo em cadeia nacional de rádio e televisão.

Naquele domingo, o povo foi em massa às ruas, sim, mas vestido de preto, a mesma cor das bandeiras que enfeitavam carros e prédios.

Ali foi o começo do fim do mandato do primeiro presidente eleito em votação direta depois da ditadura de 1964.

No desfile de 7 de Setembro daquele ano, em Brasília, nenhum chefe de Poder estava ao lado de Collor no palanque oficial, coalhado de militares.

O movimento pelo impeachment ganhou mais força e, no dia 29 de setembro, a Câmara aprovou por 441 votos a favor e 38 contra, a abertura do processo de impeachment.

Multiplicaram-se os comícios por todo o país pedindo a saída do presidente. Foi o tempo das ruas tomadas pelos estudantes "caras pintadas" e as principais lideranças políticas do país nos palanques, defendendo o impeachment.

Manifestação pelo impeachment do então presidente Fernando Collor, em 18 de setembro de 1992 -  Eder Chiodetto/Folhapress -  Eder Chiodetto/Folhapress
Manifestação pelo impeachment do então presidente Fernando Collor, em 18 de setembro de 1992
Imagem: Eder Chiodetto/Folhapress

Foi tudo muito rápido. Em dezembro, antes de o Senado aprovar a perda do mandato, Collor renunciou ao cargo. Saiu do Planalto por uma porta lateral, acompanhado de poucos assessores e seguranças.

Não é a primeira vez que Bolsonaro imita Collor.

No primeiro 7 de Setembro do seu mandato, o capitão eleito em 2018, já enfrentando o isolamento político, também convocou o povo a ir às ruas de verde e amarelo no Dia da Independência.

O pretexto para o apelo patriótico foi a defesa da soberania nacional, depois de um discurso infeliz do presidente da França, Emmanuel Macron, que falou em "internacionalização da Amazônia" para salvar a floresta.

"Um presidente lá do outro lado do Atlântico resolveu falar uma coisa que tocou a nós, falar em soberania relativa da Amazônia. Mexeu conosco. Isso serviu para acordar muita gente no Brasil que nem sabia o que era Amazônia".

O discurso de Bolsonaro foi feito durante evento, no Palácio do Planalto: o lançamento da "Semana do Brasil", uma campanha publicitária para incentivar descontos e promoções entre os dias 6 e 15 de setembro.

Com o desfile oficial cancelado pelo Ministério da Defesa por conta da pandemia, este ano Bolsonaro resolveu convocar o povo para o seu 7 de Setembro particular, em defesa do "voto impresso" e da "liberdade de expressão", e contra os tribunais superiores ainda que tentam conter seu ímpeto golpista.

A grande mobilização nas redes sociais começou no final de julho, quando Bolsonaro resolveu dar "o último recado" aos tribunais, com uma grande manifestação na avenida Paulista, em São Paulo.

Nos últimos dias, entre visitas a templos e quartéis, motociatas e solenidades militares, o presidente largou o governo e tem feito propaganda dos atos pró-Bolsonaro todos os dias, uma verdadeira operação militar, como se o país estivesse se preparando para enfrentar uma guerra.

Ao transformar a campanha pela reeleição numa disputa de vida ou morte, o capitão paralisou o país, afundado nas maiores crises sanitária, energética e econômica da sua jovem democracia, um cenário muito mais dramático do que aquele de Collor em 1992.

Depois da compra do Centrão, e do governo cada vez mais ocupado por militares, já nem se fala mais em impeachment, mas Bolsonaro poderá ter o mesmo fim inglório de Collor, sem completar o mandato, se o seu desesperado projeto golpista não der certo, o que é mais provável.

Cada vez mais improvável, é ele conseguir se manter no poder pelo voto, por mais devotos que coloque nas ruas no 7 de Setembro.

Só tem um jeito dele se acalmar: é proibir todas as pesquisas e tirar o nome de Lula das urnas eletrônicas.

Vida que segue.