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OPINIÃO

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Trégua ameaçada: melhor nem mostrar o novo Datafolha ao presidente

Colunista do UOL

16/09/2021 19h16

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Já repararam? Completamos hoje uma semana sem ameaças golpistas do governo nas manchetes, mas a trégua entre Jair Bolsonaro e o Judiciário, costurada pelas mãos ágeis de Michel Temer, está outra vez ameaçada, com a divulgação de novos números do Datafolha nesta quinta-feira, o primeiro após o 7 de Setembro do "ultimato" ao STF.

Melhor nem lhe mostrar a pesquisa para não despertar a ira presidencial. Só tem más notícias ali para o valentão do "cercadinho" do Alvorada, que ficou mais manso depois de ser enquadrado pelos outros Poderes.

Com o Datafolha indo a campo nos dias 13 a 15 deste mês, ainda não deu tempo de avaliar a influência da abrupta mudança de comportamento do presidente, mas a sua popularidade continua caindo, batendo novo recorde de rejeição: 53% da população o avalia como ruim ou péssimo, seguindo uma tendência de crescimento negativo desde dezembro passado.

Agora, são apenas 22% os que o avaliam como ótimo ou bom, ou seja: apenas um entre cada cinco brasileiros aprova ainda o seu modo de (des)governar o país.

Num eleitorado de 150 milhões, ainda é muita gente, convenhamos, mas não o suficiente para garantir a sua ida ao segundo turno em 2022, sem suar muito a camisa e jogar no erro dos adversários.

Nem mesmo o aumento da vacinação e a queda no número de mortes nas últimas semanas ajudou Bolsonaro a se afastar do volume morto da impopularidade.

A reprovação ao presidente cresceu 21 pontos percentuais em relação à pesquisa de dezembro e, a aprovação, caiu 15 pontos.

O apoio a Bolsonaro caiu em todas as regiões do país, em todos os extratos sociais e faixas etárias, até entre o fiel eleitorado evangélico.

Neste período, Bolsonaro sofreu uma série de derrotas no Congresso e no Judiciário, entregou o governo aos cuidados do centrão e dos generais, não conseguiu implantar o "voto impresso" e passou a viajar em campanha pelo país, em especial para o nordeste, onde são maiores seus índices de rejeição.

E as projeções para os próximos meses não são nada animadoras. A inflação, a fome e o desemprego continuam aumentando, enquanto caem as previsões para o crescimento do PIB em 2022, aproximando-se de 0%, e a renda dos trabalhadores, com o país correndo sérios riscos de apagão no fornecimento de água e energia elétrica nos próximos meses.

É o que se pode chamar de tempestade perfeita para o governo, a um ano e pouco das eleições. Na semana que vem, para completar, ainda deve sair o relatório final da CPI da Pandemia, com sérias denúncias contra o presidente e seu governo, o que também deve influir negativamente nas próximas pesquisas.

Não sobra muito tempo para o presidente criar alguma imagem positiva do seu governo e começar a mostrar serviço, algo que não faz muito parte da sua índole, ao mesmo tempo beligerante e indolente.

Contido nos últimos dias, quando a barra pesou para o seu lado, a qualquer momento o capitão pode mostrar as garras de novo. Quando se sente acuado, ele costuma dobrar a aposta, e partir novamente para o tudo ou nada, matar ou morrer.

Qual o repórter com coragem de perguntar ao capitão o que ele achou do novo Datafolha? Eu não sou...

Lembro-me de uma repórter que fez essa pergunta ao Lula, na última semana da campanha presidencial de 1994, com nova queda na pesquisa, quando a eleição já estava perdida.

"O que você quer que eu diga, minha filha? Que fiquei feliz? Se continuar assim, eu vou ficar com saldo negativo nas pesquisas..."

Sem nenhum projeto de governo, a não ser o da reeleição, sem perigo de golpe ou impeachment à vista, só restará ao presidente cumprir tabela, para chegar são e salvo ao final do mandato, se possível, fazendo os recuos necessários.

De pesquisa em pesquisa, de recuo em recuo, Bolsonaro vai vendo seu rebanho fiel diminuir, até entre as milícias digitais. Não é culpa do Datafolha.

Vida que segue.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL