Topo

Balaio do Kotscho

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Eleições 2022: para atacar Bolsonaro, Moro acabou se autoincriminando?

O ex-ministro e ex-juiz Sergio Moro, agora pré-candidato a presidente da República - Adriano Machado/Reuters
O ex-ministro e ex-juiz Sergio Moro, agora pré-candidato a presidente da República Imagem: Adriano Machado/Reuters

Colunista do UOL

30/12/2021 19h24

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Deu na "Folha" de hoje: "Moro diz que Lava Jato combateu PT, mas recua _ Ex-ministro de Bolsonaro foi declarado parcial pelo STF em suas ações como juiz federal contra o ex-presidente Lula" (página A7).

Com discurso de candidato de oposição que disputa uma vaga com Bolsonaro no segundo turno, o ex-juiz Sergio Moro partiu para o ataque contra o presidente em entrevista à rádio Capital FM, de Mato Grosso:

"Como é que a gente pode defender um governo desse? Com pessoas na fila dos ossos, um governo que foi negligente com as vacinas, um governo que desmantelou o combate à corrupção. Tudo isso por medo do quê? Do PT. Não".

E quando engatou uma segunda, querendo se vangloriar, Sergio Moro acabou falando o que todo mundo já sabia, mas pela primeira vez ele acabou confessando um possível crime contra o PT no processo de Lula.

"Tem gente que combateu o PT na história de uma maneira mais efetiva, muito mais eficaz. A Lava Jato".

Como assim? Quer dizer que o que movia o ex-juiz não era o combate à corrupção, mas o combate a um partido político?

Quem comandava a Lava Jato era ele, dando ordens aos procuradores e policiais federais como revelou o site The Intercept Brasil em matérias publicadas também por outros veículos de imprensa.

É papel de um juiz combater, perseguir, destruir uma pessoa ou uma instituição? Ou ele deve se ater aos autos de um processo, ouvindo acusação e defesa, para depois julgar com imparcialidade de acordo com as provas obtidas?

Ao perceber que avançou o sinal da sua autossuficiência e arrogância, Moro tentou recuar, mas já era tarde.

"A Lava Jato apenas descobriu os esquemas de corrupção e mostrou o que o PT verdadeiramente é".

Ficou pior a emenda do que o soneto. Revelou apenas o seu ódio ao PT em julgamentos parciais e seletivos, como o Supremo Tribunal Federal reconheceu ao anular os processos contra Lula.

"Moro escancara sua parcialidade e confessa que Lava Jato foi pra combater o PT. O projeto político sempre esteve claro, a toga foi só um trampolim. Ajudou a eleger um traste e a destruir o país e agora se apresenta como a solução. Juiz corrupto e cara de pau!", reagiu a presidente do PT, Gleisi Hoffmann.

Se a Lava Jato se propunha a investigar todos os partidos políticos e suas relações com empreiteiras, por que só o PT precisava ser mostrado como é? Quem lhe deu esta tarefa que não consta do Código Penal?

Empolgado com a própria voz, o ex-juiz foi adiante em sua cantilena contra Bolsonaro, o presidente que ele ajudou a eleger e de quem depois virou seu ministro da Justiça, até o rumoroso rompimento entre os dois que ainda está sendo investigado pela Justiça.

Ao ser promovido a "herói nacional" pela mídia, no auge da Operação Lava Jato, onde assumiu plenos poderes para investigar, acusar e condenar os réus a seu livre talante, o juiz federal de primeira instância sonhou alto: para ele, o Ministério da Justiça era apenas o primeiro passo para chegar ao Supremo Tribunal Federal, como o próprio ex-aliado Bolsonaro revelou.

Defenestrado do governo, foi ganhar a vida nos Estados Unidos ao virar sócio de empresa multinacional que trabalha para a Odebrecht, uma das empresas que ele quase levou à falência, entrando por uma porta giratória que está sendo investigada pelo Ministério Público e pelo Tribunal de Contas da União, que querem ver os contratos e os valores envolvidos no negócio.

Em 2018, o seu alvo era Lula, o candidato favorito nas pesquisas, que ele tirou da disputa eleitoral e mandou para a prisão. Agora, é Bolsonaro, a quem serviu quase dois anos sem notar nada de anormal no chefe.

Dirigindo-se aos eleitores, ele faz perguntas: "Agora vai apoiar o presidente atual pra quê? Por quê? Qual que é o motivo? Se é uma questão meramente política? O objetivo é ganhar eleições? Eu acho que tem que ser para servir e proteger a população brasileira, e o nosso projeto vai nessa linha".

Que "nosso projeto" é esse? Parece o Wanderley Luxemburgo falando. Até agora, Moro só disse que pretende criar um tribunal de exceção para julgar crimes de corrupção e montar uma força-tarefa para combater a miséria e a fome. Deve achar que o país é como um tribunal em que só ele manda e os outros obedecem, sua palavra é lei, não existem os outros Poderes.

Bolsonaro também achava isso e quebrou a cara. Ainda com pouco traquejo nas artes da política e da demagogia, o novato candidato se enrolou durante uma entrevista amistosa. Como será quando começarem os debates entre os candidatos?

De algoz implacável dos políticos em geral e do PT em particular, rapidamente ele resolveu assumir o papel de vítima, após as primeiras críticas que está recebendo da imprensa.

"Todo dia agora criam uma fake news contra mim", queixou-se hoje, inconformado com reportagens sobre o senador Álvaro Dias, seu padrinho político, que recebeu doações do contrabandista e doleiro Alberto Youssef, o primeiro delator da Lava Jato _ sempre ele... _ para uma campanha eleitoral em 1998.

Moro alega que "ninguém sabia quem era Alberto Yousseff na época", embora ele já tivesse sido preso por contrabando. "Eu nem conhecia o senador Álvaro Dias", que já tinha sido governador do Paraná, acrescenta.

Em política, coincidências sempre são difíceis de explicar. Mas é bom já ir se acostumando. A campanha ainda nem começou.

Vida que recomeça.

.

.