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OPINIÃO

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Militares ganham de Lula a chance de se redimir da catástrofe bolsonarista

Reunião de Lula e Alckmin com comandantes militares: a ordem agora é libertar a terra yanomami invadida por garimpeiros - Ricardo Stuckert
Reunião de Lula e Alckmin com comandantes militares: a ordem agora é libertar a terra yanomami invadida por garimpeiros Imagem: Ricardo Stuckert

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A catástrofe humanitária promovida pelo governo bolsonarista nas aldeias yanomamis, em Roraima, com o "liberou geral" dado aos garimpeiros para invadir áreas indígenas, contou com a omissão e/ou a má vontade das Forças Armadas para cumprir ordens da Justiça, determinando a expulsão dos invasores e a destruição dos seus equipamentos.

"Forças Armadas no governo Bolsonaro deixaram de agir na terra yanomami em sete ocasiões": é o que revela a reportagem de Vinicius Sassine, da Folha, publicada hoje na manchete do UOL, ao final de uma semana em que as imagens dilacerantes desta tragédia correram o mundo, mostrando corpos esqueléticos de crianças como aqueles que se via nos campos de concentração alemães durante a Segunda Guerra ou nos acampamentos de refugiados em Biafra.

Abandonados à própria sorte, sem comida, água potável e remédios, durante os quatro anos de Bolsonaro, famintos e doentes, ameaçados pelo avanço de garimpeiros fortemente armados, que envenenaram os rios com mercúrio, os yanomamis sobreviventes começaram a receber assistência humanitária logo após a posse do novo governo, que decretou estado de emergência pública na saúde e enviou para Roraima a Força Nacional do SUS.

Na próxima semana, com a ida a Roraima do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, um civil, acompanhado dos comandantes da Aeronáutica, do Exército e da Marinha, para planejar a retirada dos garimpeiros da terra indígena, as Forças Armadas terão a chance de se redimir da cumplicidade demonstrada no genocídio dos yanomamis, já denunciado aos fóruns internacionais.

A decisão foi tomada em reunião com o presidente Lula, na segunda-feira passada, que contou com a participação de outros ministérios e de órgãos ligados à questão indígena e aos direitos humanos. Trata-se de uma prioridade absoluta do novo governo, assim como a defesa da democracia, ainda amaçada pelos esbirros do golpismo.

Múcio e comitiva irão primeiro à comunidade surucuru, onde está estacionado o 4º Pelotão de Fronteira Especial, uma das mais afetadas pelos garimpos clandestinos. Já foram definidos os papéis que cada Força exercerá: ao Exército, caberá realizar o trabalho de campo para identificar e retirar os invasores criminosos, junto com a Polícia Federal; a Marinha prestará apoio com barcos e vigilância nos rios, e a Aeronáutica irá monitorar o espaço aéreo e ajudar no acesso às comunidades distantes.

Ao ser perguntado sobre a possível reação armada dos garimpeiros, o ministro da Defesa disse que torce para evitar um conflito, mas que as Forças estão indo preparadas: "Vamos prontos para enfrentá-los. Temos que cortar o mal pela raiz".

Tudo isso já poderia ter sido feito há um, dois ou três anos, evitando a morte de milhares de indígenas, se as Forças Armadas tivessem atuado no combate ao garimpo ilegal, respeitando decisões judiciais. Em pelo menos sete ocasiões, o repórter Vinicius Sassine identificou a omissão dos militares, a partir de consultas a documentos do Supremo Tribunal Federal, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal.

Quando forneceram os meios solicitados, os militares cobraram ressarcimento pelo uso de aeronaves, como se fossem uma empresa de táxi aéreo. Numa dessas ocasiões cobraram R$ 2,5 milhão da PF pelo fretamento de uma única aeronave, o que, talvez desse para comprar uma outra. Sem pagamento, o Ministério da Defesa de Bolsonaro barrava o fornecimento de aeronaves para a expulsão de garimpeiros, protegidos pelos governos estadual e federal da época.

Sem monitoramento do espaço aéreo, aviões e helicópteros dos garimpeiros faziam a festa nos céus da Amazônia. A ajuda humanitária da FAB foi jogar pacotes com latas de sardinha para os indígenas que não podiam mais pescar pelo envenenamento dos rios com mercúrio. Nos quartéis, como sabemos, ofereciam outras iguarias.

"A convivência com o garimpo ilegal e a desassistência em saúde na terra yanomami provocaram uma crise humanitária, com explosão de casos de malária, desnutrição grave e outras doenças associadas à fome, como infecções respiratórias".

É este o cenário, definido pelo ministro José Múcio como "triste, uma vergonha", que os comandantes militares agora irão encontrar. Mas, desta vez, espera-se que levem suas tropas para ficar lá por tempo indeterminado, e não só por alguns dias, como em outras operações passadas, que permitiram a invasão das terras indígenas e a volta dos garimpos. .

Vida que segue.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que informava a coluna, o território Yanomami fica em Roraima, e não em Rondônia. O texto foi corrigido.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL