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Camilo Vannuchi

Fakecracia em vertigem

18.jun.2020 - Fabrício Queiroz (de vermelho), ex-assessor de Flávio Bolsonaro, no momento em que é preso pelos policiais dentro de um imóvel em Atibaia (SP). Queiroz estava há um ano escondido no local, que pertence ao advogado Frederick Wassef, próximo do clã Bolsonaro - Divulgação/Polícia Civil
18.jun.2020 - Fabrício Queiroz (de vermelho), ex-assessor de Flávio Bolsonaro, no momento em que é preso pelos policiais dentro de um imóvel em Atibaia (SP). Queiroz estava há um ano escondido no local, que pertence ao advogado Frederick Wassef, próximo do clã Bolsonaro Imagem: Divulgação/Polícia Civil

Colunista do UOL

19/06/2020 19h49

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O Brasil chegou a 1 milhão de pessoas infectadas por Covid-19. O ministro da Saúde é um general do Exército e grande parte do segundo escalão da pasta foi preenchida por oficiais das Forças Armadas. O ministro afirmou que a pandemia é mais grave nas regiões Norte e Nordeste porque elas sofrem influência do inverno do Hemisfério Norte.

Por falar em inverno, uma ativista reacionária autointitulada ex-feminista (?) está presa por organizar em Brasília um grupo armado de extrema-direita constituído por apoiadores do Presidente. Deve ter uns 30 integrantes, que afirmam ser 300. Quem a prendeu foi a Polícia Federal, mas a iniciativa foi do ministro Alexandre de Moraes, do STF.

O STF é comunista. #Somos70porcento de comunistas mais os onze da Corte (é nóis, Queiroz!).

Queiroz foi preso. Em Atibaia (SP). Escondido na casa do advogado Frederick Wassef. O advogado tem clientes importantes, como Jair e Flávio Bolsonaro. O clã o chama de Anjo. Nos anos 1990, Anjo teve prisão decretada por suposta ligação com uma seita satânica acusada pelo desaparecimento de uma criança no Paraná.

Investigadores afirmam que Queiroz estava hospedado na casa de Wassef havia mais de um ano. De acordo com a doutrina professada pelo ex-juiz de Curitiba, o imóvel deve ser de Queiroz. Se usou, é dele, oras.

Aliás, ô cabra escorregadio esse Moro. O ex-futuro ministro do STF aproveitou a notícia da prisão do Queiroz para alfinetar o antigo chefe, de quem fora cabo eleitoral e ministro da Justiça. "O importante é que polícias, Ministério Público e Cortes de Justiça possam trabalhar de maneira independente", tuitou.

Em dezembro de 2018, sem provas, mas com convicção, o mesmo Moro tratou rapidamente de suavizar pro lado do chefe dizendo que "o senhor presidente eleito já esclareceu a parte que lhe cabe nesse episódio" (movimentação atípica de R$ 1,2 milhão na conta de Queiroz apontada pelo Coaf).

Coaf, coaf, coaf...

No mesmo dia da queda de Queiroz, caiu também o ministro da Educação, aquele que foi sem nunca ter sido e que será lembrado por escrever errado no Twitter e fazer troça dos chineses usando a figura do Cebolinha. "Vai piorar", alertam as redes sociais. Teremos mais um militar à frente de um ministério, será?

"Diz história apócrifa que as rãs não percebem quando a água começa a ferver", escreveu o cientista social Yascha Mounk, autor de O povo contra a Democracia, em artigo publicado na Folha na última terça (16). "Mais ou menos da mesma maneira, a população brasileira não tomou consciência da extensão em que a possibilidade de ruptura democrática hoje molda a política brasileira. Mas quando especulações sobre o que líderes militares aceitariam (ou não) começam a moldar as decisões dos representantes eleitos do povo, a essência da democracia já foi esvaziada."

Nesta sexta-feira, 19 de junho de 2020, o filme Democracia em Vertigem completa um ano na Netflix. Rodou o mundo, chegou à cerimônia do Oscar e, em doze meses, se tornou uma obra vintage, retrô, quase uma comédia romântica para conferir comendo pipoca enquanto a conjuntura se despedaça. Mentira. Não tem nada de comédia romântica ou trama superada no documentário de Petra Costa. Mas, se havia ali uma vertigem tangível, hoje o cenário é de queda livre e destruição. Democracia em frangalhos.