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Carlos Madeiro

REPORTAGEM

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No Maranhão, Lula 'abençoa' palanque que une Roseana Sarney e Flávio Dino

Lula, Carlos Brandão e Flávio Dino: trio se reencontra hoje em São Luís - Divulgação
Lula, Carlos Brandão e Flávio Dino: trio se reencontra hoje em São Luís Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

02/09/2022 04h00

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O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) visita hoje o Maranhão para realizar um ato de campanha em apoio ao governador e candidato à reeleição Carlos Brandão (PSB) e ao ex-governador Flávio Dino (PSB), que tenta a vaga ao Senado do estado.

Antes do evento, marcado para as 18h, Lula terá um encontro de praxe com o ex-presidente José Sarney (MDB) —reunião que pode contar também com a presença da filha dele, Roseana Sarney (MDB), que concorre neste ano a uma vaga de deputada federal.

Diferentemente do que aconteceu em anos anteriores, a família Sarney e Flávio Dino não estão em campos opostos e dividem o mesmo palanque, inclusive com o MDB na coligação e apoiando os dois candidatos socialistas no Maranhão.

Dino teve o PT como aliado durante todo o seu governo estadual —ele renunciou em abril para poder disputar a eleição em outro cargo. Mas a proximidade ocorreu apenas após se eleger.

Nas eleições de 2010 e 2014, quando foi candidato ao governo, o PT decidiu apoiar Roseana Sarney e Edison Lobão Filho no estado, respectivamente.

Os acordos, em ambos os casos, foram feitos com a interferência de Lula, que anulou decisões locais do PT. No estado, petistas chegaram a montar um "comitê rebelde" para apoiar Dino em 2014.

Apesar dessa histórica boa relação de Lula com a família Sarney no Maranhão, uma postagem no site oficial do PT anuncia o "time do Lula no Maranhão" e elogia Dino por trazer "a renovação histórica que o Maranhão vive desde 2015".

"O Time do Lula no Estado representa a continuidade do projeto encabeçado pelo governo Flávio Dino (PSB) que rompeu com décadas de coronelismo", afirma o texto, sem lembrar que em 2014 o PT nacional rejeitou Dino e Lula pediu votos para Edison Lobão Filho.

Dino e Aécio no primeiro turno de 2014, no Maranhão - Divulgação - Divulgação
Dino e Aécio no primeiro turno de 2014, em São Luís, no Maranhão
Imagem: Divulgação

Mesmo assim, no segundo turno da eleição presidencial de 2014, declarou voto para Dilma Roussef (PT), deixando de lado Aécio Neves (PSDB) —que havia ido ao Maranhão pedir voto para Dino no primeiro turno.

Hoje, a rusga de parte do PT foi com a escolha de Brandão como o nome da base de Dino para concorrer ao governo, que acabou se dividindo e tem outros dois candidatos que eram aliados do Palácio dos Leões: Weverton (PDT) e Simplício (Solidariedade).

O PT compõe a chapa de Brandão com a indicação do vice, Felipe Camarão —que na verdade ingressou no partido apenas em julho de 2021, após deixar o DEM um mês antes. Ele foi secretário de Educação no governo Dino, e a mudança de partido foi vista como uma manobra de Dino para indicar o nome do partido na composição.

Brandão e Dino conseguiram aliar um grande leque de partidos, tanto de direita quanto da esquerda. A convenção do MDB que ratificou o apoio a Brandão e Dino ocorreu no dia 21 de julho. No mesmo dia, Roseana Sarney tirou até foto ao lado de Brandão, que discursou em agradecimento. Já Dino não foi ao evento.

Segundo apurou a coluna, Dino e Roseana —que disputaram o governo em 20118 e trocaram muitas farpas nesse período— não chegaram a conversar para uma reaproximação. O apoio foi selado com um acordo envolvendo outros nomes.

A ex-governadora Roseana Sarney (MDB) disputa vaga na Câmara pelo Maranhão - Roseana/Facebook/Divulgação - Roseana/Facebook/Divulgação
A ex-governadora Roseana Sarney (MDB) disputa vaga na Câmara pelo Maranhão
Imagem: Roseana/Facebook/Divulgação

Família Sarney em queda

A família Sarney vem perdendo protagonismo na política nacional e não tem nenhum representante em cargo eletivo federal desde 2018, depois de 60 anos com cargos no Congresso, em Brasília, e/ou no governo do estado com José e Roseana Sarney.

Antes de Dino, os Sarney perpetuaram-se no poder. Apenas em 2006 perderam a eleição para o governo, quando Jackson Lago venceu. Ele foi cassado em seguida e perdeu o mandato para Roseana Sarney, que assumiu o cargo em 2009 após decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

O último nome em Brasília da família foi Sarney Filho, que era deputado federal (eleito em 2014) e foi ministro do Meio Ambiente do governo Michel Temer (MDB). Em 2018, se candidatou ao Senado e perdeu. Hoje, é secretário do Meio Ambiente do Distrito Federal.

Cartaz de campanha de Roseana traz foto com Lula  - Reprodução - Reprodução
Cartaz de campanha de Roseana traz foto com Lula
Imagem: Reprodução

O único eleito da família em 2018 foi o deputado estadual Adriano Sarney (PV), que é primogênito de Sarney Filho. Durante o governo Dino, ele fez parte da oposição na Assembleia Legislativa. Ele concorre agora à reeleição, em dobradinha com a tia e apoiando Lula.

Para Arleth Borges, cientista política e professora da UFMA (Universidade Federal do Maranhão), a família Sarney vem amargando um declínio político no estado, o que a deixou sem forças para lançar um nome competitivo ao governo.

"Esse declínio é notório especialmente nas derrotas nas disputas para o governo do estado, tanto em 2014 e 2018, para Flávio Dino", diz.

"A família Sarney também perdeu espaços de poder e de influência consideráveis que tinham no âmbito nacional e davam suporte de valor inestimável para esse poder no plano local", completa.

A cientista diz ainda que a união entre Dino e os Sarneys pode ser explicada pelo caráter considerado "plebiscitário" da eleição de 2022.

"Estamos em um contexto em que a democracia, mesmo nas suas formas mais elementares, está ameaçada por essas ações e visões assumidas pelo presidente Jair Bolsonaro [PL] e seus seguidores", diz.

Nesse cenário, ela cita que o ex-presidente José Sarney se tornou um personagem importante. "Na sua longeva trajetória política, ele construiu relações com a Justiça e com militares, que são setores cruciais para se abrir diálogos nessa defesa da democracia, o que também ajuda a entender essa união", finaliza.