Carlos Madeiro

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Reportagem

Padre pagava propina a secretários por fraude em doação de comida, diz MP

O Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), do Ministério Público da Paraíba (MP-PB), denunciou à Justiça dois secretários estaduais da Paraíba. Eles são acusados de fazerem parte de um esquema de corrupção no qual receberiam propina de um padre responsável pelo instituto que fornecia alimentação a pessoas pobres.

Segundo a denúncia, apresentada em 16 de dezembro de 2024, Tibério Limeira (atual secretário de Administração da Paraíba) e Pollyanna Dutra faziam parte de uma "organização criminosa" e receberam dinheiro à frente da Secretaria de Desenvolvimento Humano da Paraíba para aprovar as contas do projeto Prato Cheio, mesmo com indícios de irregularidades.

O padre acusado de liderar o esquema é Egídio de Carvalho, que presidia o ISJ (Instituto São José), uma entidade ligada à Igreja Católica e que fornecia os alimentos pagos com recurso público. Ele liderou a entidade entre os anos de 2011 e 2023 e está em prisão domiciliar desde o final de 2023.

Os três foram procurados pela coluna e alegaram que a denúncia não teria provas e que iriam comprovar a inocência na Justiça (leia mais abaixo).

Padre Egídio é investigado por uma série de denúncias de desvio de verbas
Padre Egídio é investigado por uma série de denúncias de desvio de verbas Imagem: Facebook

Além de propina a secretários, a denúncia afirma que o padre usava empresas fantasmas, manipulação de contratos, falsificação de documentos e emissão de notas fiscais frias para justificar os gastos.

A denúncia inclui mais 13 pessoas, que são acusadas de fazerem parte de alguma forma do esquema entre os anos de 2021 a 2023, quando foram firmados 14 termos de colaboração para o projeto Prato Cheio.

Quando foi suspenso por conta das irregularidades, em novembro de 2023, o programa Prato Cheio entregava 8 mil refeições por dia à população de situação de rua em cinco cidades paraibanas.

O Gaeco pede uma reparação de no mínimo de R$ 20 milhões desses acusados por danos morais pela "extrema gravidade do(s) crime(s) praticado(s), somado ao fato de que os prejuízos decorrentes da corrupção são difusos e pluriofensivos (lesão à administração pública, à moralidade e, inclusive, à respeitabilidade do Executivo do estadual da Paraíba)."

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As acusações contra os secretários

Segundo o Gaeco, Tibério era o "ordenador final das despesas e responsável pela análise das prestações de contas do projeto Prato Cheio" quando era secretário de Desenvolvimento Humano. A investigação flagrou conversas de WhatsApp interceptadas, e uma delas demonstraria um pagamento de R$ 50 mil feito em 29 de junho de 2022.

A denúncia aponta que Tibério recebeu o valor do padre em espécie, e para receber o montante, enviou um motorista para recolher o dinheiro. O valor foi anotado por uma tesoureira ligada ao padre, que confirmava a entrega do dinheiro por meio de fotos enviadas a Egídio Neto. Ela também foi denunciada.

Trecho da denúncia do Gaeco mostra conversa do whatsApp em que padre avisa que o motorista do secretária está indo ao local, e depois a anotação do valor dado
Trecho da denúncia do Gaeco mostra conversa do whatsApp em que padre avisa que o motorista do secretária está indo ao local, e depois a anotação do valor dado Imagem: Reprodução

No ano seguinte, em julho de 2023, o Gaeco afirma que foi a vez de Pollyanna, sucessora de Tibério e ainda chefe da pasta, receber R$ 70 mil, que teria sido entregue à mãe da secretária, acompanhada de um motorista.

O aumento no valor em relação a Tibério, diz a denúncia, "decorreria do aumento do número de municípios atendidos pelo projeto Prato Cheio."

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"Nitidamente, trata-se de uma continuidade naquilo já praticado, sendo o pagamento uma constante para manutenção da situação solidificada" afirma o Gaeco.

A aprovação das contas ocorria de maneira rápida, mesmo quando as evidências, como os extratos bancários fornecidos pelo próprio ISJ, mostravam de forma clara que os recursos depositados eram imediatamente transferidos para outras contas bancárias. Tal prática visava atender a outras finalidades, incluindo pagamentos pessoais e a entrega de numerário em espécie a Egídio de Carvalho Neto.
Gaeco

Programa Prato Cheio em distribuição de marmitas na capital, João Pessoa
Programa Prato Cheio em distribuição de marmitas na capital, João Pessoa Imagem: Governo da Paraíba

Os dois secretários vão responder agora pelos crimes de organização criminosa, com ocupação de posição de liderança ou comando, e por desvio de conduta em cargo público.

O Gaeco pede ainda à Justiça que todos os envolvidos percam os cargos públicos e fiquem impedidos de assumir novos por oito anos.

Já o Padre Egídio é alvo de oito ações criminais, que o acusam de desvio de verbas, entre outros crimes, do Hospital Padre Zé e do ISJ. Ele é acusado por fraudes que somariam R$ 140 milhões, no período em que esteve à frente das instituições.

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Acusados negam crimes

Pollyanna Dutra afirmou que sua defesa não teve acesso à denúncia, mas "ressalta que a conduta dela sempre foi retilínea, inexistindo qualquer mácula durante toda sua vida pública."

Ela ainda afirma que está "à disposição do Ministério Público e demais órgãos de controle para contribuir com o esclarecimento dos fatos e a consequente punição daqueles que porventura tenham cometido ilicitudes."

Já Tibério Limeira afirmou que a denúncia apresentada "está montada em supostos documentos que não guardam a menor confiança, visto que não passam de manuscritos sem qualquer validade legal, podendo ter sido produzidos por qualquer pessoa e em qualquer tempo, com objetivos de imputar a alguém um ilícito."

Durante todo o processo, coloquei-me à disposição do Ministério Público, inclusive formalizando pedido para colaborar com o esclarecimento dos fatos, mas, lamentavelmente, nunca fui chamado. Mantenho minha tranquilidade e confiança de que a justiça prevalecerá, trazendo à luz a verdade e reafirmando minha trajetória pautada pela ética e pela responsabilidade pública.
Tibério Limeira

O advogado do padre Egídio, Luciano Santoro, afirmou nesta sexta-feira (17) que não teve acesso à denúncia, mas diz que "certamente se trata de mais uma acusação desprovida do mínimo suporte probatório, como todas as outras", e afirmou que "nulidades flagrantes na coleta da prova que em seu tempo oportuno serão reconhecidas pelo Poder Judiciário."

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Procurado, o governo do Estado não se pronunciou sobre a acusação. O espaço segue aberto para manifestação.

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