Carlos Madeiro

Carlos Madeiro

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Reportagem

Irmãos inocentes ficaram 3 anos presos no lugar de serial killer de Alagoas

Três irmãos da periferia de Maceió foram denunciados e ficaram presos por três anos apontados injustamente por cinco assassinatos no bairro da Chã da Jaqueira, entre fevereiro e dezembro de 2019. Eles foram detidos preventivamente em 2022 e só foram soltos no início deste mês após a polícia descobrir que eles não tinham relação com os crimes.

Uma nova investigação apontou que os assassinatos, na verdade, foram praticados pelo ex-agente penitenciário Albino Santos de Lima, conhecido como o serial killer de Maceió. Ele que confessou à polícia oito mortes e três tentativas de assassinato.

Albino, que foi preso em setembro de 2024, já era apontado como autor de dez mortes na capital alagoana entre 2023 e 2024. Mas com o aprofundamento das investigações o total de vítimas aumentou para 18.

As oito mortes recém-descobertas ocorreram entre 2019 e 2020. Cinco delas resultaram em denúncias do MP-AL (Ministério Público de Alagoas) contra os irmãos presos por engano —os três se chamam Antônio.

A defesa conseguiu a absolvição deles em seis casos (três de tentativa e três de homicídio), após o Tribunal do Júri alegar falta de provas. Entretanto, em dois outros casos a Justiça mandou os irmãos para júri popular.

A repercussão das acusações contra os jovens à época foi intensa. As mortes ficaram conhecidas como "caso dos irmãos Antônio". A polícia os retratava como um trio que aterrorizava a região com tráfico de drogas e matava "quem tentasse impedir seus crimes."

Lista de alvos do serial killer de Maceió entre 2019 e 2020
Lista de alvos do serial killer de Maceió entre 2019 e 2020 Imagem: Polícia Civil

Laudo aponta inocência

A reviravolta ocorreu após a perícia no celular de Albino, conta o advogado dos irmãos, Arnon de Mello Sobrinho Neto. O serial killer mantinha na nuvem um calendário com as datas das mortes que tinham os irmãos como suspeitos e as fotos das vítimas.

Continua após a publicidade

A coluna teve acesso ao laudo pericial da Polícia Científica. O documento inclui um vasto número de arquivos em imagens. O material aponta que o criminoso monitorava as vítimas antes de matá-las e ainda acompanhava e colecionava matérias de sites e jornais sobre os crimes.

As falsas suspeitas: caso a caso

Arnon explica que a investigação sobre os irmãos começou após uma suspeita apontada pelo filho de uma das vítimas.

"Esse filho supôs que foram eles que mataram o pai, por ter sumido com uma droga dos três. A polícia então pegou depoimentos e indiciou os irmãos por homicídios de todas essas pessoas, mas sempre alertamos desde o início que não existe qualquer prova, nem testemunha ocular", diz.

Os irmãos foram denunciados em cinco processos, veja cada caso:

  • Morte de Genilda Maria da Conceição, em 6 de fevereiro de 2019: como a coluna contou nesta terça-feira (25), Antônio Guilherme foi acusado por conta de um retrato falado do neto da vitima, de 10 anos, e por supostas desavenças com ela. O júri popular estava marcado para o próximo dia 6;
  • Morte de Alisson Santos Silva, em 20 de outubro de 2019: processo estava em fase de depoimentos, antes que o julgamento fosse marcado;
  • Mortes de Maria Vânia e José dos Santos e três tentativas de homicídio em 23 de dezembro de 2019: os irmãos foram absolvidos por falta de provas;
  • Morte de Marcelo Lopes, em 29 de novembro de 2019: absolvidos por falta de provas.
Continua após a publicidade
Câmera de segurança registra assassinato praticado pelo serial killer em Maceió no dia 20 de outubro de 2019
Câmera de segurança registra assassinato praticado pelo serial killer em Maceió no dia 20 de outubro de 2019 Imagem: Reprodução

Há ainda outros três processos com quatro mortes que estão ainda com inquérito aberto, sem indicação de autoria do crime, mas ambos citavam os irmãos como suspeitos.

"Eles tiveram a prisão decretada por conta dessa grande quantidade de assassinatos imputados. Eles ficaram inclusive conhecidos como lideranças que estariam matando geral para manter o controle do tráfico", conta Arnon.

Marcações na agenda online de Albino apontam para crimes cometidos por ele em 2019
Marcações na agenda online de Albino apontam para crimes cometidos por ele em 2019 Imagem: Polícia Civil/Reprodução

Polícia diz que corrigiu erro assim que soube

Segundo o delegado Gilson Rego Sousa, do DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa), os indiciamentos dos irmãos ocorreram porque os delegados dos casos entenderam que havia elementos para apontar autoria. Mas afirma que, assim que houve uma nova apuração, os erros foram corrigidos de imediato.

Continua após a publicidade

"Os colegas delegados que presidiram as investigações desses homicídios à época concluíram pelo indiciamento desses indivíduos com base nos indícios disponíveis na época: retrato falado, reconhecimento fotográfico, testemunhas, etc.", diz.

Tão logo tomamos ciência desses novos elementos, imediatamente comunicamos ao Judiciário e MP-AL para a adoção das medidas processuais cabíveis, com o objetivo de corrigir e reparar essa situação.
Gilson Rego Sousa, delegado do DHPP

Albino em selfie feita ao visitar cemitério onde algumas de suas vítimas foram enterradas
Albino em selfie feita ao visitar cemitério onde algumas de suas vítimas foram enterradas Imagem: Reprodução

Segundo Gilson, que coordenou a nova fase da investigação do serial killer, o acesso da polícia aos arquivos do celular de Albino foram determinantes reabrir investigações dos casos.

Um detalhe ajudou a confirmar as mortes: a Polícia Científica apontou que sete dos oitos casos tinham projéteis disparados por uma única arma de fogo, um revólver calibre 38.

"Após isso, chamamos Albino, mostramos os dados e o confrontamos. Ele resolveu confessar todos os crimes, e fez isso com riqueza de detalhes. Ele sabe inclusive com quantos tiros alvejou cada vítima", diz Gilson, em referência aos oito novos crimes que foram confessados pelo serial killer.

Continua após a publicidade

Ainda de acordo com o delegado, não há mais casos em investigação imputados a Albino.

Somando agora todos os crimes, temos 18 homicídios e seis tentativas qualificadas, que o faz agora figurar no ranking nacional dos maiores serial killers do país.
Gilson Rego

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Deixe seu comentário

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.