Carlos Madeiro

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Reportagem

Universal é condenada por impor vasectomia a pastor em clínica clandestina

A Igreja Universal do Reino de Deus foi condenada a pagar uma indenização por dano moral de R$ 100 mil a um ex-pastor de Fortaleza que realizou uma cirurgia de vasectomia, imposta como condição para ascender na carreira dentro da instituição.

A decisão original é da 11ª Vara do Trabalho de Fortaleza. Foi ratificada por unanimidade pela Terceira Turma do TRT-CE (Tribunal Regional do Trabalho) e publicada no Diário da Justiça Eletrônico no último dia dia 18 de fevereiro. O órgão entendeu que o procedimento foi preparado e pago pela igreja.

Ao contrário do que pretende fazer crer a reclamada [Universal], os documentos comprovam que o reclamante foi submetido a cirurgia de vasectomia. A prova oral, igualmente, confirma a prática da empresa de condicionar a permanência no emprego à realização de tal procedimento. Inexiste qualquer dúvida sobre a prática abusiva da empresa, que é reiterada em todo o território nacional.
Decisão do TRT-CE

Procurada, a Igreja Universal informou que vai recorrer da decisão e classificou como "fantasiosa" a imposição de vasectomia a seus pastores (leia nota completa no final da matéria).

O que alega o ex-pastor

Na ação trabalhista, o ex-pastor explica que trabalhou em uma igreja em Fortaleza entre setembro de 2003 e maio de 2021. Na época de sua saída, recebia R$ 4.200 mensais, sem carteira de trabalho assinada. Ele ainda alega que foi dispensado sem justa causa e sem recebimento de verbas rescisórias —o que também gerou condenação à Universal.

Sua jornada, diz, era exaustiva: de 5h às 22h, de segunda a sábado; e das 5h às 20h30 aos domingos, sem intervalo para refeição e descanso e sem direito a pagamento de horas extras ou férias.

Sobre o procedimento, diz que foi induzido pela igreja a se submeter à vasectomia, "condição imposta para a consolidação e prosseguimento de sua carreira como pastor na instituição."

Ele alega que foi levado a uma clínica clandestina, onde a cirurgia foi realizada, sem a observância da Lei nº 9.263/96, que regulamenta o planejamento familiar e trata sobre os métodos contraceptivos de esterilização cirúrgica.

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Segundo ele, todos os preparativos para o procedimento, incluindo o custeio, foram de responsabilidade da igreja. Também afirmou que não houve esclarecimento técnico sobre os riscos da cirurgia, nem a assinatura de termo de consentimento para a realização da vasectomia.

Sede do TRT-CE, em Fortaleza
Sede do TRT-CE, em Fortaleza Imagem: Divulgação

Juíza vê "lesão gravíssima"

Em primeira instância, a 11ª Vara do Trabalho de Fortaleza entendeu que as provas testemunhais "corroboram a alegação de que a reclamada exige e arca com os custos da vasectomia dos pastores, como uma política institucional."

A juíza Christianne Fernandes Carvalho Diógenes Ribeiro classificou o ato da igreja como lesão de natureza gravíssima e condenou o que chama de "caráter reiterado e institucional da prática."

Esta prática representa um flagrante abuso do poder diretivo do empregador, ultrapassando todos os limites razoáveis e violando de forma grave os direitos da personalidade dos trabalhadores. Configura-se, assim, um claro abuso de direito.
Sentença de 30 de agosto de 2024

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Igreja nega imposição

Em nota à coluna, a Igreja Universal rebateu os argumentos do pastor denunciante. Veja a nota na íntegra:

"A Igreja Universal do Reino de Deus esclarece que vai recorrer da decisão confiante de que a Justiça e a verdade prevalecerão. E que estes processos - movidos por ex-pastores que foram desligados do corpo eclesiástico da Igreja em razão de um grave descumprimento de regra de conduta - terão o mesmo destino de outros semelhantes, com decisões favoráveis a Instituição.

Reforçamos que a Universal jamais forçou o ex-pastor em questão - ou qualquer outro - a realizar a suposta vasectomia. E que, a fantasiosa imposição de vasectomia é facilmente desmentida pelo fato de que muitos dos nossos bispos e pastores, em todos os níveis de hierarquia da Instituição, têm filhos. São mais de 3 mil filhos naturais de membros do corpo eclesiástico da Universal. O que a Igreja estimula é o planejamento familiar, debatido de forma responsável por cada casal - conforme está previsto em nossa Constituição Federal.

Além disso, quando uma pessoa opta pela vasectomia, como método contraceptivo, é uma decisão totalmente particular, entre médico e paciente/casal, não podendo ter qualquer ingerência de outros neste ato. Posto isto, vale ainda lembrar ao jornalista que, assim como acontece com qualquer instituição neste país, seja religiosa ou não, a Universal também não é responsável por quaisquer decisões particulares de nenhum dos seus oficiais - que gozam de plena capacidade de decisão, sendo totalmente aptos para sua vida civil com absoluta autonomia."

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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