Soldado é punida com 2 dias de prisão por vídeo lavando viatura da PM-CE
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A soldado Mayara Kelly Gomes foi punida em sindicância da PM-CE (Polícia Militar do Ceará) com dois dias de prisão administrativa por ter publicado dois vídeos em sua conta do Instagram, em abril e junho de 2023. Nas postagens, ela aparece lavando uma viatura e ensinando a fazer um torniquete.
A condenação foi assinada em 26 de março pelo subcomandante da PM-CE, coronel Vandicles Sérgio de Oliveira Júnior. Ele considerou que a soldado cometeu ilegalidade pela "utilização do fardamento oficial, bem como a exposição de viaturas e demais elementos característicos da atividade policial militar sem a devida autorização". Para Oliveira Júnior, ela praticou "atos contrários aos valores militares" e deve ser punida por "violação dos deveres militares".
A defesa recorreu e conseguiu suspender a decisão ontem. Agora, aguarda uma reavaliação do comandante, coronel Sinval da Silveira Sampaio.
Mayara entrou na PM-CE em outubro de 2017. Em sua ficha, teve apenas uma repreensão em 2024. A própria corporação cita na sindicância que "não há registros de infrações disciplinares relevantes que possam prejudicar sua conduta profissional".
A condenação, se confirmada, também vai para ficha funcional da militar, e pode a atrapalhar em eventuais promoções —já que é exigida uma "ficha limpa" pelo período mínimo de 12 meses.
Os vídeos
No primeiro vídeo, publicado em 22 de abril de 2023, Mayara aparece lavando uma viatura e dizendo que hoje, na corporação, as mulheres exercem funções que antes eram feitas apenas por homens.
"As pessoas acham que a mulher na polícia só trabalha no administrativo, mas mal sabem eles que exercemos inúmeras funções que até anos atrás poderiam ser consideradas apenas coisas para homem. Eu, por exemplo, já trabalhei interno. Hoje estou na rua, sou patrulheira e às vezes motorista, e sempre que se é motorista temos uma função ao final do serviço que é lavar a viatura", diz.
No outro vídeo, em 18 de julho, ela aparece colocando um torniquete no braço e explica na legenda que "ele é usado para estancamento de hemorragias severas causado por agentes traumáticos, indicado em situações de amputação, lacerações decorrentes de ferimentos por arma brancas, armas de fogo e explosões."
Em depoimento, ela disse que fez os vídeos "com a intenção de motivar outras mulheres que querem trabalhar na polícia" e citou que sua rede social não é monetizada. Ainda alegou que a publicação de militares em redes sociais é "prática comum" e que os vídeos não causaram dano à reputação da corporação.
O relatório da sindicância, porém, alega que "não prospera a tese defensiva de inexistência de prejuízo à imagem institucional".
A Disciplina Militar se manifesta essencialmente na observância rigorosa das prescrições legais e regulamentares. (...) A ofensa aos deveres funcionais vulnera a disciplina militar, constituindo infração administrativa, penal ou civil, isolada ou cumulativamente, sendo o militar do Estado responsável pelos atos que praticar ou pelas decisões que tomar.
Trecho do resultado da sindicância
Em nota, a PM-CE reclamou do vazamento da sindicância e do "uso político" do caso. Também afirmou que Mayara teve direito a "ampla defesa e contraditório, e ainda possui prazo para recurso correndo, tudo previsto no Código Disciplinar PM".
A PMCE reafirma seu compromisso com a disciplina, a hierarquia, pilares básicos dessa corporação que completará 190 anos mês que vem, além do compromisso com a ética profissional e o respeito às normas institucionais e militares, principalmente no que tange aos dados de seus componentes, que trouxeram a corporação até a idade que tem.
Nota da PM
Repercussão
Após a publicidade da condenação, a soldado recebeu diversas mensagens de apoio e de protesto, marcando inclusive o governador Elmano de Freitas (PT).
Mayara também postou, ontem à tarde, uma mensagem agradecendo o apoio e carinho dos seguidores e disse que "vai ficar tudo bem". A soldado tem 42 mil seguidores no Instagram.

Equívoco, diz defesa
Em nota, a defesa da militar diz que a punição "trata-se de um equívoco interpretativo", já que publicações no Instagram "não configuram condutas previstas nos referidos artigos e incisos".
Destaque que o vídeo em que a policial ensina seus seguidores como fazer um torniquete, na verdade, trata-se de um vídeo de utilidade pública, uma vez que o intuito é meramente informativo, educativo e partiu de vivência própria da militar, que tem um irmão policial militar, que foi atingido por disparo de arma de fogo quando atuava contra o crime organizado e veio a ser atingido na perna.
Nota da defesa
Sobre o vídeo lavando uma viatura, alega que "nada mais fez do que enaltecer o trabalho das mulheres nas polícias militares, não só do Ceará, mas do Brasil".
Como visto, esses dois vídeos que a Mayara publicou, não configuram a transgressão, uma vez que ela não publicou fatos, documentos ou assuntos administrativos, que prejudicassem ou concorrerem para o desprestígio da instituição. Não se observa nos vídeos a publicação de documento interno, não se observa a divulgação de informações de interesse técnico administrativo ou judicial, não se vê nos vídeos divulgação de informação de operações policiais de técnicas policiais de combate ao crime, por exemplo.
Nota da defesa
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