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Carolina Brígido

REPORTAGEM

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Gilmar e Barroso expõem rixa entre garantistas e lavajatistas no Supremo

Colunista do UOL

23/04/2021 04h00

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Durou menos de um ano a trégua na relação conflituosa entre Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. Os dois ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) protagonizaram discussão rumorosa em março de 2018, quando Barroso disse em plenário que Mendes era "uma pessoa horrível, mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia". Fizeram as pazes em maio do ano passado, por iniciativa de Mendes. Ontem (22), os dois aumentaram o tom de voz e voltaram a discutir.

No meio das alfinetadas mútuas, Barroso pediu: "Estou argumentando juridicamente. Não precisa vir com grosseria". Mendes deu a cartada final: "Vossa excelência perdeu". De fato, no julgamento do recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Mendes ficou no time vencedor e Barroso, entre os derrotados.

Mendes é o símbolo do garantismo no tribunal, a corrente do Direito que prioriza os direitos dos réus. Barroso é da ala oposta, a que defende a Lava Jato. Dias antes de iniciado o julgamento, era dado como certo que os garantistas ganhariam a batalha.

Apesar de serem de grupos opostos no tribunal, Mendes e Barroso têm o perfil semelhante: em julgamentos acirrados, costumam fazer discursos com o objetivo de convencer os colegas a seguirem seus posicionamentos. Ontem, por saber que o pêndulo pendia para o lado oposto, o voto de Barroso foi bem mais longo que o de Mendes.

Barroso fez defesa acirrada do combate à corrupção e, do lado oposto do ringue, Mendes repetiu as críticas de sempre aos métodos da Lava Jato. Já no final da sessão, os dois partiram para o bate-boca. Barroso defendeu o relator da Lava Jato, Edson Fachin.

No mês passado, Fachin anulou condenações de Lula e decidiu que a Segunda Turma do STF não deveria mais julgar o recurso sobre a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro. Ainda assim, a turma, da qual Mendes faz parte, julgou. Em plenário, Barroso criticou essa atitude - que considerou um desrespeito ao relator. Nos bastidores, a ala lavajatista estava indignada com Fachin ter sido atropelado pela turma. Barroso apenas soltou em público o que estava preso na garganta de vários outros ministros.

O presidente do STF, Luiz Fux, fez de tudo para evitar que os colegas expusessem o "mau sentimento" em público. Quando viu que a discussão saía do controle, encerrou imediatamente a sessão. Para quem está de fora, quando dois ministros discutem, a impressão que dá é de cisão interna - uma mensagem perigosa para um momento em que o tribunal é criticado pelos outros Poderes e precisa responder de forma institucional.

A verdade é que Barroso e Mendes nunca foram amigos. A briga de 2018 expôs essa diferença, que passa não apenas pelo viés ideológico, mas também pela falta de afinidades pessoais. Os dois passaram a nem se cumprimentar pelos corredores do tribunal.

Em maio do ano passado, Mendes e Barroso voltaram a se falar. Partiu de Mendes o convite para o colega proferir uma aula magna pela internet, em evento organizado pelo Instituto de Direito Público (IDP), do qual o ministro é sócio.

O movimento de aproximação tinha começado em 19 de abril do ano passado, quando Mendes retuitou uma postagem do desafeto. Barroso contestou no Twitter as manifestações daquele domingo, endossadas pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), clamando pela volta do regime militar. Diante do RT de Mendes, Barroso demonstrou surpresa a interlocutores próximos.

Normalmente, as brigas entre ministros diminuem quando eles precisam se unir para derrotar um inimigo em comum. No ano passado, o inimigo era Bolsonaro e as manifestações por ele apoiadas.

Nos últimos dias, Barroso e Mendes alimentavam relação cordial de trabalho e tinham inclusive se falado ao telefone. Depois da discussão áspera de ontem, não se sabe se a relação pode ser remendada. .