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CPI e múltiplas crises fazem Bolsonaro 'pedir para sair'
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* Cesar Calejon
"Pede pra sair", a frase que foi eternizada pelo filme Tropa de Elite, no qual o personagem Capitão Nascimento constrange, tortura e abusa moralmente dos candidatos a ingressarem no Batalhão de Operações Especiais (BOPE), com dedos cortados, tapas na orelha e todos os tipos de humilhação, parece ser ideal para compreender o atual momento emocional do presidente Jair Bolsonaro.
Acuado pelo relatório final da CPI, no qual ele e boa parte de sua família deverão ser indiciados por uma série de crimes considerando a condução do governo federal durante a pandemia, e por uma crise econômica que vem promovendo um verdadeiro colapso social, Jair Bolsonaro oferece claras demonstrações públicas de que está com muito medo de deixar o Planalto e ser preso.
Na semana passada, ele afirmou que com frequência "chora no banho" e que a primeira-dama Michelle sequer sabe, porque o percebe como o "machão dos machões". Esta semana, demonstrando visível fragilidade psíquica, Bolsonaro afirmou: "o tempo todo eu sou responsável por tudo, se é assim, ache um cara melhor, sem problema nenhum". Essas não foram as primeiras vezes que ele evidenciou questões dessa natureza, mas essas manifestações estão se tornando mais frequentes com a mesma proporção que se fecha o cerco sobre a sua administração.
Sem problema para quem? Após criar uma sindemia no Brasil e ser responsável por catalisar a morte de mais de 600 mil brasileiras e brasileiros não será assim tão fácil se livrar das consequências.
Apesar da sua fragilidade e covardia frente aos desafios que se apresentam, ironicamente, Jair Bolsonaro (e toda uma gama de parlamentares) se elegeu, em alguma medida, com base na mitologia do Capitão Nascimento: um militar extremamente duro e honesto que luta sozinho contra o sistema dos políticos corruptos.
Entre os anos de 2007 e 2010, os dois filmes da sequência Tropa de Elite, do cineasta José Padilha, contribuíram decisivamente para reforçar essa narrativa no imaginário popular, além de estimular uma ode ao anti-intelectualismo sobre a qual o bolsonarismo floresceu.
Em novembro de 2010, o filme de Padilha (Tropa de Elite 2) atingiu a marca dos dez milhões de espectadores e sagrou-se o mais visto daquele ano no Brasil, entre longas nacionais e internacionais. Um dos maiores sucessos de público e crítica do país em todos os tempos. "É milagroso", disse Padilha ao portal G1.
Milagrosa é a solução mágica que Jair Bolsonaro agora espera para se livrar de todos os crimes que lhe serão acusados pela leitura do relatório final da CPI. Essa semana, o Brasil inteiro se emocionou com os depoimentos de pessoas que, ao perderam os seus entes queridos para a covid-19, ainda tiveram que ouvir diversos deboches da principal figura pública do país.
Além disso, toda a degradação econômica, com a inflação, volta da fome e da miséria, altas ininterruptas dos combustíveis, escândalos de corrupção e possíveis greves dos caminhoneiros, crises entre os níveis federativos e os poderes da República assombram o presidente de forma a fazê-lo sentir saudade dos tempos quando ele era apenas um deputado folclórico do baixo clero parasitando o Estado brasileiro.
De qualquer forma, esse tempo passou e o bolsonarismo enfrenta hoje as consequências da tempestade perfeita que ajudou a fomentar. Nesse sentido, a postura de Bolsonaro evidencia que ser corajoso e "machão" quando todos os ventos estão a seu favor é extremamente simples. O problema começa quando se é necessário mostrar força e determinação em momentos de real adversidade. Nesses casos, o "machão dos machões" chora durante o banho, receando aquilo que não pode evitar: o momento de prestar contas finalmente chegou.
* Cesar Calejon é jornalista, com especialização em Relações Internacionais pela FGV e mestrando em Mudança Social e Participação Política pela USP (EACH). É escritor, autor dos livros A Ascensão do Bolsonarismo no Brasil do Século XXI (Kotter) e Tempestade Perfeita: o bolsonarismo e a sindemia covid-19 no Brasil (Contracorrente).
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