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Entendendo Bolsonaro

OPINIÃO

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Pacote governista consolida estelionato eleitoral de Bolsonaro

Presidente Jair Bolsonaro (PL) - Alan Santos/PR
Presidente Jair Bolsonaro (PL) Imagem: Alan Santos/PR

Colunista do UOL

09/08/2022 09h41

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* Cesar Calejon

Por definição, as ciências sociais, mais especificamente o campo de estudo da ciência política, define o conceito de estelionato eleitoral como o uso de ideias, medidas ou plataformas que são aplicadas durante o período eleitoral no sentido de eleger — ou de reeleger — determinado governo, mas que, ao fim e ao cabo, após a eleição, são abandonadas radicalmente.

Neste contexto, o "pacote de bondades" bolsonarista, que entra em vigor hoje (9), representa o maior estelionato eleitoral já visto desde a redemocratização do país. Trata-se do que a cultura popular classifica como "171", em referência ao artigo nº 171, do Código Penal Brasileiro, que tipifica criminalmente o estelionato: enganar outras pessoas para conseguir benefícios próprios.

Nesta terça, o Auxílio Brasil de R$ 600, o vale-gás dobrado, o auxílio-caminhoneiro e o auxílio-taxista começam a ser depositados nas contas de milhões de brasileiros e, naturalmente, o bolsonarismo espera ser recompensado com a recuperação da imagem do presidente a menos de sessenta dias do primeiro turno das eleições.

Na prática, durante os quatros anos da sua gestão, Bolsonaro trabalhou menos do que um estagiário em começo de carreira, afundou a economia nacional, disse que "não cria empregos" e colocou o Brasil novamente no mapa da fome e da miséria.

Agora, menos de oito semanas antes do pleito que determinará não somente a possibilidade da reeleição, mas o futuro do atual presidente perante a Justiça, tendo em vista todos os crimes que foram cometidos pela sua administração, Bolsonaro tenta, literalmente, comprar os votos que são necessários para evitar a sua possível prisão a partir do momento que se esvair a blindagem do foro especial.

A partir da sua efetivação, seguramente, o truque eleitoreiro deverá surtir algum efeito. O suficiente para colocar Bolsonaro na liderança da corrida presidencial até o dia 2 de outubro? Altamente improvável. Eficaz para evitar a derrota já no primeiro turno? Possivelmente.

Algumas questões merecem a reflexão neste sentido. O pacote governista beneficia taxistas e caminhoneiros, duas categorias de trabalhadores que, a despeito de pagarem os maiores preços dos combustíveis em décadas, têm demonstrado bastante adesão ao bolsonarismo desde 2018. Assim, o potencial eleitoreiro dessas medidas seria um tanto quanto limitado, considerando que, em algum grau, essas pessoas já seriam bolsonaristas de qualquer forma.

Contudo, os aumentos no Auxílio Brasil e no vale-gás deverão atenuar, momentaneamente, o sofrimento, a fome e a miséria de milhões de brasileiros pertencentes às camadas mais empobrecidas da população brasileira. Nestes extratos, a recuperação bolsonarista pode ser mais significativa, principalmente porque a dimensão imediata da vida socioeconômica afeta a tomada de decisão do voto de forma amplamente acrítica.

Ou seja, as pessoas não entendem com clareza que as suas respectivas vidas pioraram por conta do governo Bolsonaro e, também, não compreendem que o pequeno paliativo momentâneo que agora recebem expirará em poucos meses. Desta forma, resta saber em qual medida a população cairá no conto do vigário do bolsonarismo e se esse efeito será o suficiente para livrar Jair Bolsonaro da derrota ainda no primeiro turno.

* Cesar Calejon é jornalista, com especialização em Relações Internacionais pela FGV e mestrando em Mudança Social e Participação Política pela USP (EACH). É escritor, autor dos livros A Ascensão do Bolsonarismo no Brasil do Século XXI (Kotter), Tempestade Perfeita: o bolsonarismo e a sindemia covid-19 no Brasil (Contracorrente) e Sobre Perdas e Danos: negacionismo, lawfare e neofascismo no Brasil (Kotter).