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OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A perversa criminalização da pobreza

Rio de Janeiro, Rj, BRASIL. 23/06/2021; Retrato da familia de Maria Cristina Batista Soares em sua casa no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. Com o aumento da desigualdade social no pais, familias entram no mapa da fome e dependem de doação para se alimentar. - Ricardo Borges/UOL
Rio de Janeiro, Rj, BRASIL. 23/06/2021; Retrato da familia de Maria Cristina Batista Soares em sua casa no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo. Com o aumento da desigualdade social no pais, familias entram no mapa da fome e dependem de doação para se alimentar. Imagem: Ricardo Borges/UOL

16/11/2021 09h00

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Por André Alcântara e Paulo Sérgio Pinheiro

Erradicar a pobreza, a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais são objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação são também objetivos de nossa sociedade, previstos na Constituição de 1988 - onde foram definidas instituições para a promoção e a defesa dos direitos humanos da população.

O Brasil, sob esse governo de extrema-direita, caiu para a 13º posição entre as 15 maiores economias do mundo, e para o 19º lugar no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) entre 50 países (Austin Rating, 2021). Os dados socioeconômicos ratificam a opressão histórica contra jovens, pretos e pobres. Os planos de transferência de renda foram esvaziados, gerando insegurança alimentar. Estima-se que em 55,2% dos domicílios brasileiros as pessoas vivem sob insegurança alimentar - são 116,8 milhões de cidadãos sem acesso pleno e permanente a alimentos (VigiSAN, 2021).

Não houve apenas o congelamento, pela Emenda Constitucional nº 95/2016, dos gastos com a assistência social. Mas também a sua redução, com o enfraquecimento de programas como Bolsa Família. O orçamento da assistência social passou de R$ 109 bilhões, em 2014, para R$ 101,9 bilhões, em 2021 (Siofi/STN, 2021). Ao passo que o encarceramento em geral, e em especial da juventude, aumentou. Da população carcerária com 773.151 pessoas (Infopen, 2019), 284.768 (42,66%) são jovens de 18 a 29 anos, 215.255 (27,84%) presos provisoriamente e 288.488 (40,98%) acusados por crimes contra o patrimônio. O racismo é um fator notório, uma vez que a maioria dos presos é formada por negros.

A população em situação de rua também aumentou. Há 221.869 mil pessoas em situação de rua no Brasil (Ipea 2020), um aumento de 140% de setembro de 2012 a março de 2020. Na cidade de São Paulo, famílias inteiras, com crianças e idosos, moram sob marquises, viadutos, ao redor de prédios e nas praças.

A opressão contra os pobres não é efetivada apenas pela ausência de políticas públicas socioeconômicas dos governos. Diariamente pessoas sem emprego, sem teto, sem alimentação, sem esperança, muitas vezes buscam o que comer nos supermercados, pedindo ou pegando alimentos sem pagar. Esses acabam reprimidos pelo sistema de segurança pública, com o aval da Justiça. E encarcerados por terem furtado bens com pequeno ou sem valor, como carne estragada, macarrão instantâneo ou batata frita. Por terem buscado, de alguma forma, sobreviver.

André Alcântara, advogado, é secretário-executivo da Comissão Arns.

Paulo Sérgio Pinheiro, cientista político, ex-ministro da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, é membro fundador da Comissão Arns.