Porto Alegre garante estoque de 6 meses para "kit covid" sem eficácia
Uma das primeiras medidas de Sebastião Melo (MDB) ao assumir a prefeitura de Porto Alegre, no início do mês, foi adicionar a hidroxicloroquina, remédio sem eficácia comprovada contra covid-19, à cesta de remédios que a rede municipal oferece para tratar... Covid-19.
Também foram encomendadas novas remessas de ivermectina e azitromicina, que tampouco são eficazes no chamado "tratamento precoce" da doença e que, segundo informações da Secretaria Municipal de Saúde da capital gaúcha, já vinham sendo oferecidas na gestão anterior, de Nelson Marchezan Jr. (PSDB).
Em entrevista ao UOL durante a campanha eleitoral do ano passado, Sebastião Melo criticou o então prefeito de Porto Alegre, Marchezan Jr., por fazer uma gestão da pandemia baseada "muito mais na política do que na ciência". Uma vez no comando da cidade, além da decisão de distribuir hidroxicloroquina junto com outros medicamentos sem eficácia contra covid-19, Melo ampliou as medidas de flexibilização de atividades econômicas e de eventos com aglomeração de pessoas.
A taxa de ocupação dos leitos de UTI para pacientes com covid-19 em Porto Alegre está em 84%.
Foram solicitados ao governo federal 25.000 comprimidos de hidroxicloroquina e 25.000 de ivermectina, com previsão de entrega nos próximos quinze dias, além de 52.000 comprimidos de azitromicina, que devem chegar em fevereiro. Com o estoque já existente de azitromicina, a prefeitura estima que terá quantidade suficiente para permitir que os médicos da rede receitem o "kit covid" por até seis meses.
Uma ressalva, porém: a prefeitura se recusa a chamar a cesta de remédios de "kit covid", pois os medicamentos não são entregues em conjunto, como ocorre em outras cidades do país, mas individualmente, a depender da prescrição médica.
Protocolo de "tratamento precoce", sem comprovação científica
Ao decidir disponibilizar a hidroxicloroquina em dez farmácias distritais e em oito Unidades Básicas de Saúde (UBS), a administração de Sebastião Melo baseou-se em protocolo do Ministério da Saúde, de junho do ano passado, que recomenda o chamado "tratamento precoce" da doença em pacientes nos estágios iniciais da doença.
Para receber os medicamentos gratuitamente, os portoalegrenses terão que assinar um termo assumindo os riscos e atestando estar cientes de que não há evidências científicas de eficácia contra covid-19.
Segundo a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), não existe tratamento precoce para a covid-19. A entidade, que em suas recomendações baseia-se nos estudos científicos mais recentes e consistentes, contraindica a hidroxicloroquina (remédio para artrite), a azitromicina (antibiótico), a ivermectina (antiparasitário). O protocolo da SBI segue preceitos semelhantes aos da Sociedade Americana de Infectologia e de outras entidades médicas especializadas.
A pressão do governo federal pela adoção do chamado "tratamento precoce" foi exposta esta semana com a divulgação de um ofício enviado pelo Ministério da Saúde à prefeitura de Manaus em que se qualifica como "inadmissível" não seguir as orientações de tratamento promovidas pela pasta.
Em Manaus, médicos relatam ameaças para prescrever "kit covid"
Médicos do Amazonas dizem sofrer ameaças de pacientes, incitados por autoridades locais, caso se recusem a receitar os medicamentos sem eficácia contra covid-19.
Segundo revelou reportagem do jornal "Estado de S. Paulo" do mês passado, o Ministério da Saúde estudava gastar R$ 250 milhões para a distribuição de "kits covid" em farmácias populares. Os mais de 2 milhões de comprimidos de hidroxicloroquina que o governo federal tem encalhados não seriam incluídos no programa.
Em municípios de todo o país, o "kit covid" — na falta de um tratamento que realmente funcione contra a covid-19 — tornou-se uma maneira simples e barata para os prefeitos venderem ilusões aos seus eleitores.
Entre as cidades que distribuem ou já distribuíram "kits covid" estão Mirandópolis (SP), Ponto dos Volantes (MG), Presidente Medici (RO), São José dos Quatro Marcos (MT), Ceres (GO), Jundiaí (SP), Porto Feliz (SP), Campo Limpo Paulista (SP), Itagi (BA), Nova União (RO), Penápolis (SP), Parintins (AM), Autazes (AM), Cajati (SP) e muitas outras. No ano passado, a prefeitura de Campo Grande (MS), chegou a gastar mais com a distribuição de "kit covid" do que com exames para diagnosticar a doença.
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