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Fernanda Magnotta

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Apesar da justiça para Floyd, desigualdade racial segue asfixiando nos EUA

Manifestantes comemoram condenação do policial Derek Chauvin pela morte de George Floydm em Minneapolis (EUA) - Chandan Khanna/AFP
Manifestantes comemoram condenação do policial Derek Chauvin pela morte de George Floydm em Minneapolis (EUA) Imagem: Chandan Khanna/AFP

Colunista do UOL

22/04/2021 04h00Atualizada em 27/12/2021 11h15

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Teve fim um dos julgamentos mais aguardados dos últimos meses nos Estados Unidos. Na última terça-feira, o júri declarou o ex-policial Derek Chauvin culpado pela morte de George Floyd, assassinado em Minneapolis no dia 25 de maio de 2020. Na ocasião, Chauvin asfixiou Floyd ajoelhando-se sobre seu pescoço durante uma abordagem policial.

Perante a Justiça, o ex-agente foi considerado culpado por todas as acusações que sofreu: i) causar a morte, sem intenção, por meio de um ato perigoso, sem consideração pela vida humana; ii) negligência ao assumir o risco consciente de causar a morte de Floyd; e iii) homicídio culposo. A pena será divulgada nos próximos meses.

Logo após o veredicto, Joe Biden se manifestou. Em um telefonema aos familiares de Floyd, o presidente prometeu a empenhar-se na aprovação de leis que refreiem a violência policial e o racismo nos Estados Unidos. Mais tarde, disse publicamente que a condenação de Chauvin poderia ser considerada "um passo gigante na marcha em direção à justiça na América".

Biden tem razão. Nos Estados Unidos os negros compõem pouco mais de 13% da população, mas, segundo dados do Washington Post, os afro-americanos são mortos pela polícia duas vezes mais em relação à taxa de americanos brancos. A condenação do ex-policial diante de um crime desse tipo é, portanto, profundamente simbólica. Mais do que isso, se trata uma resposta institucional importante no processo de combate ao racismo estrutural no país.

Apesar disso, é importante ter em mente que as raízes do problema são muito mais delicadas e que as respostas desejadas não virão apenas a partir dessa sentença.

Dados do Pew Reasearch Center escancaram o enorme distanciamento social existente entre brancos e negros nos Estados Unidos. A renda média das famílias negras tem sido consistentemente mais baixa do que das famílias brancas ao longo da série histórica. A renda familiar média anual ajustada para uma família de três pessoas, em dólares de 2019, mostra uma diferença de US$ 33,9 mil entre os dois grupos.

Quando o assunto é a riqueza mediana, nota-se que os lares chefiados por pessoas brancas têm níveis de riqueza significativamente mais altos do que aqueles chefiados por pessoas negras: US$ 189,1 mil versus US$ 24,1 mil. Os números também revelam que 19% dos negros norte-americanos vivem na pobreza; entre os brancos o índice corresponde a apenas 7%.

Segundo o levantamento do Pew Reasearch Center, 75% das famílias brancas possuem casa própria. É o caso de apenas 46% das famílias negras. Também há uma diferença de 13% quando o assunto é a obtenção de um diploma universitário. Por fim, vale lembrar que a expectativa de vida de negros é, em média, de 3 anos menor do que entre brancos.

O processo de formação nacional dos Estados Unidos é permeado por violência e preconceito desde os primórdios da estruturação institucional do país, incluindo a adoção de um modelo econômico escravocrata e a normalização de políticas segregacionistas em várias regiões.

A busca por justiça racial repousa, portanto, sobre um tecido social profundamente desigual e que vulnerabiliza uma população inteira. É compreensível, portanto, o alívio trazido pelo desfecho do caso Floyd. Apesar disso, mesmo com a condenação de Chauvin, e para além das paredes do tribunal, ainda há um país que não consegue respirar.