BC demora 1 ano para fiscalizar Banco Luso, citado em inquérito sobre PCC
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O Banco Central marcou para 29 de setembro uma inspeção remota para apurar a conduta do Banco Luso Brasileiro, citado na Operação Fim da Linha, que investiga a infiltração da organização criminosa PCC no sistema de ônibus na cidade de São Paulo.
Na denúncia do MPSP (Ministério Público de São Paulo) levanta-se a suspeita de que o banco participou de uma operação para lavar dinheiro de uma holding ligada a membros da facção criminosa. A instituição bancária nega que tenha cometido qualquer irregularidade.
O MPSP não pode investigar o banco, já que, em tese, se trata de um suposto crime na esfera federal.
Por essa razão, os promotores do Gaeco (grupo de combate ao crime organizado) pediram, no segundo semestre do ano passado, à Justiça de São Paulo que enviasse a denúncia da Fim da Linha ao BC, para que o órgão tomasse as providências que considerasse cabíveis ao caso.
O Banco Central é a autoridade monetária do país e fiscaliza a atuação das instituições financeiras.
Datado de 29 de janeiro deste ano, um ofício assinado pelo funcionário Rodrigo Fabiano de Almeida informa ao juiz da Operação Fim da Linha que uma inspeção direta remota foi marcada para fins de setembro, mais de um ano depois da documentação ter chegado ao BC.
O ofício do Banco Central faz parte dos autos da ação penal da Operação Fim da Linha e vincula a inspeção à denúncia do MPSP.
" Preliminarmente, temos a informar, relativamente ao Banco Luso Brasileiro, que, por conta da denúncia encaminhada pelo GAECO-MPSP, foi programada por este Banco Central do Brasil uma Inspeção Direta Remota de PLD/FT, prevista para 29.9.25 na Instituição."
A sigla PLD/FT significa Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento de Terrorismo. Não se trata, pois, de uma inspeção de rotina, como a comunicação do Banco Luso afirma no site da instituição.
Em resposta enviada à reportagem, o Banco Luso afirmou o seguinte.
"O Banco Luso Brasileiro não foi notificado sobre qualquer inspeção extraordinária do Banco Central. No ano passado, o nome da instituição foi envolvido equivocadamente em notícia sobre suposta lavagem de dinheiro ao crime organizado e prontamente procurou o Ministério Público do Estado de São Paulo para apresentar a documentação de todas as operações sobre as quais poderiam haver dúvidas. O próprio Ministério Público atestou a lisura das operações e emitiu uma certidão de Nada Consta para o Banco."
Procurado pelo UOL, o Banco Central afirmou que "não comenta processos de supervisão."
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Depósitos
O Banco Luso depositou mais de R$ 20 milhões na conta de uma holding chamada MJS em 2015, segundo investigação do MPSP.
A holding teve como sócios Luiz Carlos Efigênio Pacheco, o Pandora, e outros dirigentes da Transwolff, empresa de ônibus acusada de lavar dinheiro para o PCC.
Ainda em 2015, a MJS foi incorporada à Transwolff para alavancar o capital da empresa de ônibus e participar de uma licitação da Prefeitura de São Paulo.
A investigação faz parte da Operação Fim da Linha, deflagrada em abril do ano passado.
Caso haja comprovação de lavagem de dinheiro para facção criminosa, o BC pode impor sanções diversas que chegariam, a depender da gravidade do caso, à cassação da autorização de funcionamento do banco.
Essa punição está prevista na lei 9613/1998, que trata das punições para o crime de lavagem de dinheiro.
Uma investigação na esfera penal também pode ser aberta.
'Smurfing'
Segundo a investigação do MP, à qual o UOL teve acesso, os depósitos de mais de R$ 20 milhões em cheques do Banco Luso na conta da MJS caracterizam "smurfing". Trata-se de uma estratégia de lavagem de capitais que fraciona valores altos em quantias menores para dificultar a identificação de operações financeiras ilícitas.
Segundo extratos da MJS analisados pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) do MP, a Transwolff alavancou seu capital de R$ 1 milhão para R$ 55 milhões com as operações, que incluíram R$ 22,9 milhões em cheques do Banco Luso Brasileiro e R$ 3,9 milhões em depósitos fragmentados.
Aberta em 2014, a MJS teve como sócios Moisés Gomes Pinto, Cícero de Oliveira, o Té, e Carlos Couto Ramos, também réus na Operação Fim da Linha.
O MP diz que auditores da Receita Federal apuraram que a holding "não desempenhou nenhuma atividade operacional, não teve funcionários, não adquiriu nem alienou nenhum bem imóvel, não possuiu ônibus e não figurou como emitente ou destinatária de nenhuma NFe, tudo a evidenciar que foi criada com o único propósito de alavancar a Transwolff e ocultar a origem ilícita do dinheiro aportado na empresa".
Os mais de R$ 20 milhões entraram na conta da MJS através de cheques nominais de 88 microempresas de transportes que pediram empréstimos de R$ 260 mil a R$ 274,4 mil ao Banco Luso Brasileiro para financiamento de compra de ônibus da fabricante Caio-Induscar.
O UOL teve acesso aos contratos de financiamento.
O Ministério Público argumenta no inquérito que, se a MJS queria pedir empréstimos, "não haveria razão para que tais operações fossem realizadas de forma fracionada, ou seja, na modalidade smurfing, mas sim em uma operação única com o montante emprestado".