ONGs acusam Justiça baiana de prender ilegalmente trabalhadores rurais

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Um grupo de sete entidades ligadas à defesa de comunidades tradicionais afirma que o Judiciário da Bahia promoveu a prisão arbitrária e ilegal de dois trabalhadores rurais envolvidos em conflitos de terra na região oeste do estado.
Solange Moreira Barreto e Silva, militante do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) e agente comunitária de saúde, e seu marido, Vanderlei Moreira e Silva, foram presos pela Polícia Federal no Rio de Janeiro, na última sexta-feira (16).
Os agentes cumpriram mandados de prisão determinados pelo juiz Thiago Borges Rodrigues, da comarca de Coribe.
"Trata-se de uma prisão política e de criminalização das comunidades que lutam contra a grilagem de terras e expropriação dos territórios na região oeste da Bahia", lê-se na nota das entidades.
Procurado pela coluna, o TJBA (Tribunal de Justiça da Bahia) afirma que não se manifestará porque o processo corre em sigilo.
De acordo com a Polícia Civil baiana, as prisões têm relação com a invasão de uma fazenda, ocorrida em março (leia mais abaixo).
Fecheiros de Correntina, na Bahia
O casal atua como fecheiros na comunidade de Fundo e Fecho de Pasto de Brejo Verde, na cidade baiana de Correntina, e tinha viajado ao Rio a passeio.
O termo "fecheiro" refere-se a um membro de comunidades tradicionais do Cerrado que desenvolvem métodos de agricultura de subsistência. Essas comunidades praticam agricultura de roça, colheita de frutos nativos e pastoreio de gado sem cercas.
Ainda de acordo com o grupo de entidades, outros quatro membros da comunidade estão com mandado de prisão em aberto.
"Foi realizada uma audiência de custódia sem que a defesa pudesse ter acesso ao teor das acusações, o que é uma violação processual. Os advogados tiveram sua habilitação negada pelo juiz do processo", afirma Juliana Athayde, integrante da AATTR (Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais da Bahia).
As entidades afirmam ainda que o rancho do Fecho de Pasto Brejo Verde foi destruído e queimado por um grupo de homens armados, na semana passada.
"Variantes foram abertas no Fecho de Entre Morros com a presença de segurança armada para intimidar os trabalhadores e impedir o manejo do gado na área coletiva."
Operação policial em Correntina
Na segunda-feira (19), policiais militares e civis entraram no território da comunidade de Brejo Verde e Aparecida do Oeste e arrombaram casas, sem apresentar mandados de busca e apreensão, afirmam as entidades.
"Realizaram diversas ameaças aos familiares dos fecheiros criminalizados e promoveram violência psicológica contra os moradores locais que estão com medo de circular em sua própria comunidade."
Procurada, a assessoria de imprensa da Polícia Civil baiana informou "que não houve registro de denúncias relacionadas a excessos durante o cumprimento dos mandados, realizados com base em decisão judicial."
Em nota divulgada em seu site, a corporação afirma que deflagrou uma operação para cumprir sete mandados judiciais relacionados "à investigação dos crimes de tentativa de homicídio, associação criminosa, dano, furto, esbulho possessório e porte ilegal de arma de fogo."
A Polícia Civil afirma que os supostos crimes "remontam ao dia 5 de março, quando uma família foi surpreendida por cerca de 40 pessoas armadas ao chegar à Fazenda Vira Saia, na zona rural de Jaborandi."
"O grupo invadiu a propriedade, danificou veículos, agrediu fisicamente as vítimas e incendiou uma motocicleta. Também foi registrada a subtração de uma espingarda calibre 12."

Operação Faroeste
Região de fronteira agrícola, o oeste baiano é marcado historicamente por casos de grilagem e conflitos de terra.
"Fazendeiros e empresas por meio de violência e pistolagem tentam expulsar as comunidades de seus territórios limitando direitos fundamentais de centenas de pessoas, ao impedir que estas exerçam seu modo de vida."
A área de Correntina registra 132 ocorrências de 1985 a 2023, de acordo com a Comissão Pastoral da Terra.
Nos últimos anos, a região ficou conhecida nacionalmente pelo rumoroso caso de corrupção judicial revelado pela Operação Faroeste, deflagrada pela Polícia Federal e com ações penais tramitando no Superior Tribunal de Justiça, em Brasília.
Desembargadores e juízes receberam propinas milionárias para vender decisões judiciais relacionadas a disputas de terras.
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