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Diplomata brasileiro deixa OMC para assumir vice-presidência de PepsiCo

Roberto Azevêdo anunciou que deixará cargo em 31 de agosto, um ano antes do previsto - AFP
Roberto Azevêdo anunciou que deixará cargo em 31 de agosto, um ano antes do previsto Imagem: AFP

Colunista do UOL

19/08/2020 11h05

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O brasileiro Roberto Azevêdo será o vice-presidente executivo e Diretor de Assuntos Corporativos da PepsiCo,a partir de 1º de setembro. Há poucos meses, ele havia anunciado que deixaria seu cargo de diretor-geral da OMC antes do final de seu mandato, o que pegou a comunidade internacional de surpresa.

Ele foi reeleito no organismo internacional em 2017 para um segundo mandato e ficaria no posto até o final de 2021. Com uma entidade abalada por conta dos diversos golpes de Donald Trump contra o sistema multilateral, sua decisão gerou uma onda de rumores dentro da OMC.

Azevedo, por semanas, não explicou para onde iria. Ele, de fato, pediu sua aposentadoria no Itamaraty. Havia suspeita de que ele teria pretensões políticas, o que foi rejeitado pelo brasileiro. Azevedo é casado com a embaixadora do Brasil perante a ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo. Nos últimos meses, ela agradou a ala mais radical do bolsonarismo ao adotar um discurso de ataques contra Venezuela, Cuba e questionar ativistas de direitos humanos e vozes como Jean Wyllys. Dentro do Itamaraty, também se especulou se ela assumiria o Itamaraty.

Num discurso feito aos embaixadores de todo o mundo, Azevedo explicou que estava saindo da OMC para permitir que as negociações sobre a reforma da entidade - exigida pela Casa Branca - pudessem ocorrer sem a contaminação do processo de escolha de um novo diretor para o período a partir de 2021. O temor era de que a eleição dominasse a agenda, deixando a reforma em segundo plano e colocando em risco a entidade.

Azevedo, diplomata de carreira no Itamaraty e embaixador, foi o primeiro brasileiro eleito para dirigir um dos pilares das instituições internacionais. Sua primeira vitória ocorreu em 2013.

A empresa americana explicou a função do brasileiro. "Azevêdo se concentrará em solidificar os esforços de engajamento externo da PepsiCo com governos nacionais e internacionais, reguladores, organizações internacionais e partes interessadas não-governamentais", declarou a empresa.

"Ele também ajudará a avançar a estratégia Winning with Purpose da PepsiCo, fortalecendo a proposta de valor do ESG da empresa e aumentando o engajamento em nível local e comunitário", disse.

"Azevêdo se junta ao comitê executivo da PepsiCo, trazendo ricos insights geopolíticos e uma perspectiva global para suas discussões e tomada de decisões", apontou a multinacional.

"Estamos entusiasmados em receber Roberto, que traz valiosas habilidades políticas e conhecimento técnico dos complexos ambientes sociais, políticos e regulatórios que impactam corporações multinacionais como a PepsiCo", disse o presidente e CEO da PepsiCo, Ramon Laguarta.
"Ao longo de sua carreira, Roberto construiu uma extensa e diversificada rede em todo o mundo e é amplamente reconhecido pelos atores mundiais tanto nas economias desenvolvidas quanto nas economias em desenvolvimento", disse.

"Seus conhecimentos geopolíticos serão inestimáveis para nossas discussões e tomadas de decisão em um mundo em constante mudança, e estamos orgulhosos de tê-lo liderando nosso engajamento com as principais partes interessadas globais", afirmou.

"Estou muito feliz em me juntar à PepsiCo quando o fortalecimento das relações entre empresas, governo e sociedade se tornou essencial para gerar crescimento sustentável e inclusivo a longo prazo", disse Azevêdo.

"A PepsiCo é líder mundial na condução de colaborações e investimentos significativos focados na melhoria de nossa sociedade e do planeta. Juntamente com a equipe de liderança, espero ajudar a PepsiCo a continuar a criar mudanças positivas e impactantes à medida que integramos e avançamos em nossa estratégia comercial global", completou.

Eleito em 2013 para o cargo e sendo o primeiro brasileiro a ocupar um posto de alto escalão em uma das entidades do sistema de Bretton Woods, Azevedo optou por uma estratégia pragmática para evitar que a OMC fosse ainda mais marginalizada. Ao invés de insistir em concluir a Rodada Doha, lançada em 2001, no mesmo formato fracassado dos últimos anos, o diplomata aceitou o desafio de fechar acordos parciais.

A tática acabou dando resultados em seus primeiros anos. Em uma carta indicando sua intenção de ser mantido no cargo em 2017, Azevedo afirmou que acreditava que a OMC está hoje em uma melhor situação que estava em 2013 e que isso foi atingido graças à "transparência e pragmatismo".

Mas críticos alertam que, até hoje, a OMC não lidou com um dos principais problemas no sistema internacional: o desequilíbrio criado pelos subsídios dados pelos países ricos ao setor agrícola. Se não bastasse, nos últimos anos, a China também passou a ser um dos principais alvos de críticas quanto às distorções no comércio de alimentos.

Mas se os seus primeiros quatro anos exigiram uma adequação da entidade, seu segundo mandato foi marcado pela decisão de Washington de ameaçar o sistema.

Cuidadoso antes das eleições para não irritar o governo americano e colocar em xeque sua reeleição, Azevedo optou por não criticar nem o governo americano e nem as políticas propostas. Por meses, o brasileiro insistia que precisava manter seus laços com Washington. "Queremos aprofundar nossas relações com os EUA", dizia ainda em 2017.