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Jamil Chade

Biden negociará plano global para dar resposta à pandemia da covid-19

Como presidente, Biden está disposto a criar aliança global para combater de forma organizada a covid-19 - Meg Vogel/Imagn Content Services via Reuters
Como presidente, Biden está disposto a criar aliança global para combater de forma organizada a covid-19 Imagem: Meg Vogel/Imagn Content Services via Reuters

Colunista do UOL

07/11/2020 13h45

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A urna nos Estados Unidos (EUA) pode ter definido o ritmo de proliferação da covid-19 nos próximos meses. Essa é, pelo menos, a aposta de parte da cúpula da OMS (Organização Mundial da Saúde) que, meses depois de declarar a pandemia, acredita que finalmente terá o espaço necessário para promover uma resposta global contra o vírus.

Neste domingo, o diretor-geral da agência, Tedros Ghebreyesus, emitiu um declaração por suas redes sociais felicitando Biden por sua eleição. "Meus colegas na OMS e eu esperamos trabalhar com você e seu time", disse. "Crises como a pandemia da covid-19 mostram a importância de solidariedade global ao proteger vidas e renda. Juntos!", completou o diretor.

A equipe de Joe Biden já circulou entre a cúpula da agência um plano ambicioso para liderar o que seria uma resposta ampla à pandemia no mundo. O objetivo: "aliar o mundo para confrontar a crise, enquanto se estabelece uma fundação para o futuro".

Ou seja, superar diferenças políticas imediatas e criar condições para que uma nova pandemia não pegue o mundo de surpresa, inclusive com mais dinheiro para a OMS.

O projeto é visto dentro da agência como um resgate crítico, justamente no momento em que a pandemia volta a ganhar força e ameaça recolocar a economia global de joelhos. "Finalmente teremos um plano mundial contra o vírus", comemora um dos principais operadores da OMS na pandemia, na condição de anonimato.

A ação de Biden não ocorre apenas por solidariedade internacional. A percepção é de que a liderança americana apenas pode ser reconstruída no mundo se o país voltar a se engajar em temas globais.

Ajuda aos países mais pobres

No plano de Biden, há um capítulo explícito sobre a necessidade de que a pandemia seja tratada em todos os locais do planeta, com uma ajuda especial para os países mais pobres. A ação há muitos meses vinha sendo solicitada pelas entidades internacionais, sem uma resposta clara por parte dos governos mais ricos.

Na estratégia do presidente eleito dos EUA, fica claro que o conceito de ampliar a ajuda para além das fronteiras americanas serve justamente para proteger o país.

A meta, portanto, é de acionar as grandes agências americanas e mesmo o Departamento de Estado para "mobilizar uma resposta internacional que ajude as nações vulneráveis a detectar, tratar e minimizar a propagação da covid-19". Isso inclui o envio de missões americanas a esses países.

Um dos focos é a de voltar a dar à diplomacia americana um papel central nas "decisões globais sobre o surto". "Ficar à margem ou empurrar (a crise) para outras nações acaba por nos tornar menos seguros e protegidos", aponta documento obtido pela coluna.

Criação de novo órgão global

O plano de Biden ainda prevê a "criação imediata" de um Conselho Global de Emergência para harmonizar a resposta à crise. O conselho seria liderado pelos EUA, por parceiros do G7 e de outros grupos para dar "apoio à OMS". A meta é a de "assegurar uma resposta coordenada em saúde e economia mundial, especialmente com respeito aos países vulneráveis".

O grupo envolveria especialistas da OMS, dos centros de controle de doenças da África e de outras regiões do mundo, assim como instituições financeiras internacionais, empresas e ongs. Uma de suas propostas é de que tal organismo fosse acionado sempre que a OMS declare uma emergência sanitária global. Desde 2009, essa é a quinta emergência declarada no mundo.

Mais dinheiro para a OMS

No plano Biden, não existem dúvidas de que o governo americano voltaria a pagar suas contribuições para a OMS. Entre as propostas, sua equipe defende que "a OMS disponha de recursos completos, especialmente seu Fundo de Contingência para Emergências".

Seu programa defende que os EUA "voltem a abraçar o envolvimento internacional, incluindo a priorização de financiamento sustentado para a segurança sanitária global - acima e além das dotações de emergência - para fortalecer a capacidade permanente conjunta de vigilância biológica e resposta a emergências sanitárias".

O envolvimento da ONU também é sugerido e Biden pedirá a criação de uma espécie de Facilitador Permanente dentro do Escritório do Secretário Geral das Nações Unidas para Resposta a Eventos Biológicos. O objetivo seria o de " facilitar a coordenação de crises entre organizações de saúde, segurança e humanitárias".

Evitar novas pandemias

Garantir o financiamento não envolveria apenas ações emergenciais. Pelo plano, a meta é a de garantir recursos para a "segurança sanitária". "A Administração Biden construirá uma coalizão global necessária para preencher urgentemente as lacunas globais na preparação para pandemias, aumentar a responsabilidade por esses investimentos e produzir resultados mensuráveis", indica o plano dos EUA.

Também haverá um esforço para construir uma força de trabalho global de segurança sanitária. Esses especialistas globais treinariam juntos para que estejam prontos para ajudar a OMS e governos parceiros a responder às ameaças de doenças infecciosas, independentemente da origem, inclusive em ambientes inseguros ou instáveis.

Nesse enfoque ao futuro, peça central será o compromisso em lidar com as mudanças climáticas e seu reconhecimento como potencial ameaça. "A Administração Biden voltará a comprometer os Estados Unidos com o Acordo de Paris no primeiro dia de seu governo e liderará um esforço para fazer com que todos os principais países aumentem a ambição de suas metas climáticas domésticas", aponta o documento.

Se implementada, a estratégia romperia com meses de um impasse. Desde seu início, a crise sanitária foi acompanhada por uma guerra política intensa, com o governo de Donald Trump usando a pandemia para frear a influência chinesa. Tampouco ajudou no combate global o fato de o presidente derrotado dos EUA terem de forma repetida negado a gravidade da doença.

O resultado foi um fracasso global na resposta à pandemia. Nem na ONU, nem na OMS e nem mesmo no G-20 houve espaço para uma coordenação internacional sobre como o mundo deveria reagir.

Resoluções foram vetadas, declarações em reuniões do G-20 jamais foram publicadas e uma coordenação entre as maiores economias que salvou o capitalismo de um colapso em 2009 não conseguiu se repetir em 2020.

Nas salas de reuniões da OMS, o diretor-geral Tedros Ghebreyesus dizia abertamente que seu objetivo seria o de manter todos na mesa de negociação. Não conseguiu. Trump anunciou sua saída da agência e o congelamento de repasses de dinheiro.

Justamente quando o mundo mais precisava de uma coordenação internacional, o clima era de guerra declarada.

Com Biden, a ordem dentro da OMS é de não abrir uma onda de críticas públicas contra Trump. Mas acelerar os contatos para iniciar uma nova era.