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Jamil Chade

Em corte, bilionário acusado de corrupção na África diz que Vale "mentiu"

Beny Steinmetz foi condenado por subornar funionários na República da Guiné e falsificar documentos em compra de mina de ferro - STEFAN WERMUTH / AFP
Beny Steinmetz foi condenado por subornar funionários na República da Guiné e falsificar documentos em compra de mina de ferro Imagem: STEFAN WERMUTH / AFP

Colunista do UOL

12/01/2021 09h44

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Resumo da notícia

  • Em 2020, Beny Steinmetz contratou um parecer do ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro sobre seu litígio com a Vale
  • No centro da disputa está uma das maiores mines de ferro do mundo, na Guiné.

Beny Steinmetz, bilionário israelense acusado de corrupção por um projeto na África, garante que a empresa Vale tinha o objetivo de ficar com 100% de sua exploração na Guiné e que a gigante brasileira "mentiu" no processo que abriu contra o empresário.

Ele está sendo julgado nesta semana em Genebra e acusado de "corrupção de funcionários públicos estrangeiros" e "falsificação de documentos". O empresário, segundo a denúncia da promotoria suíça, teria organizado a transferência de pelo menos 8,5 milhões de dólares de 2006 a 2012 para garantir o direito de explorar a mina de ferro Simandou, na República da Guiné. Por isso, pagou oficialmente US$ 165 milhões ao governo local pela concessão. Mas 18 meses depois, ele fechou um acordo de parceria com a Vale, no valor de US$ 2,5 bilhões.

De acordo com a promotoria pública de Genebra, a partir de 2005, o executivo se envolveu em um "pacto de corrupção" com o ex-presidente da Guiné, Lansana Conté, que esteve no poder de 1984 a 2008, e sua quarta esposa, Mamadie Touré.

A meta era é de retirar a mina da Rio Tinto e garantir que Beny Steinmetz Group Resources (BSGR) ficasse com uma das maiores reservas de minério de ferro do mundo. A acusação aponta que, em 2008, a BSGR teria aproveitado das últimas horas de vida do ditador Lansana Conté para obter a concessão dos blocos 1 e 2 da jazida de minério de ferro.

Mas, em 2011, o primeiro presidente democraticamente eleito da Guiné, Alpha Condé, iniciou uma auditoria dos contratos de mineração e que acabou levando à suspeita sobre Simandou.

A acusação é de que Beny Steinmetz usou estruturas opacas para esconder o pagamento de propinas. O empresário sempre negou as acusações de corrupção e seu advogado Marc Bonnant declarou que seu cliente era inocente. O argumento é de que o executivo jamais pagou Mamadie Toure, quarta esposa do ex-ditador e que hoje vive nos EUA. Além disso, o argumento é de que ela jamais foi esposa de Conte, o que tornaria qualquer testemunho dela como inaceitável sob a lei suíça.

Diante das revelações, a Vale entrou com processo no Tribunal de Arbitragem Internacional, em Londres. A mineradora venceu o processo em 2019 e Steinmetz foi obrigado a pagar US$ 2,2 bilhões em indemnização. O Tribunal apontou que o empresário omitiu informações da Vale ao ingressar na sociedade, entre elas o pagamento de propinas.

Steinmetz contou, no ano passado, com um parecer do ex-juiz e ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro. O brasileiro indicou que a Vale não teria direito ao dinheiro. A coluna apurou que, no julgamento em Genebra nesta semana, o parecer de Moro não será utilizado.

Ainda assim, ao ser questionado pela promotoria de Genebra em plena audiência sobre sua derrota diante do caso apresentado pela Vale, o empresário alertou que sua batalha não terminou. "Existem novas coisas que vão sair e mostrar que a Vale mentiu durante o processo (em Londres)", disse. Ele acredita que ainda tem "possibilidade de ganhar".

Steinmetz não explicou quais seriam essas revelações e nem de que forma a empresa brasileira teria "mentido".

Horas antes, em seu julgamento, o empresário foi questionado se, em 2008, já sabia que iria obter a concessão da montanha de ferro para revendê-la. Ele garantiu que não e explicou que, antes da Vale, investidores chineses chegaram a ser contactados.

Steinmetz também insistiu que, ao adquirir a concessão, não sabia com exatidão a dimensão do que existia na região.

A juíza Alexandra Banna o interrompeu: "mas era conhecido. As reservas eram conhecidas". Sua resposta foi direta: "não". O empresário explicou que a Rio Tinto não havia feito um mapeamento completo. "Ninguém sabia quanto valia", alegou.

A juíza então questionou sobre o motivo pelo qual um governo de um país pobre aceitaria vender a concessão por US$ 165 milhões em um projeto que, logo depois, valeria US$ 2,5 bilhões.

"É assim no mundo", respondeu o empresário. Segundo ele, o ganho para sua empresa foi grande. "Mas o maior ganho é para o país, pois existem impostos, royalties. Muda tudo", disse. "Era um sonho para a Guiné. São países pobres, não conhecem o mercado", disse.

Ele ainda explicou que é "comum" que empresas menores façam um trabalho de risco e, depois para a exploração total, busquem parceiros. "É muito comum. Quase todos são assim", disse.

Em seu depoimento, o empresário indicou que a Vale ficou "muito impressionada" com o trabalho de seus técnicos e que negociações ocorreram em diferentes partes do mundo. Steinmetz explicou que, inicialmente, a empresa brasileira queria ficar com 100% do projeto, o que foi recusado por sua companhia. Sua meta era de manter pelo menos 51% das ações na parceria. Logo depois, houve uma tentativa de um acordo de 50% para cada lado. "Mas a Vale exigiu 51%", disse.

O processo termina no dia 18 de janeiro.

Procurada, a empresa brasileira insistiu sobre o fato de que obteve vitória em seu questionamento contra o empresário. "A Vale reitera que recebeu das cortes arbitral e judicial em Londres e nos Estados Unidos a permissão para prosseguir com a execução da sentença arbitral de US$ 2 bilhões contra a BSGR", declarou.