Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Ato de Damares ameaça compromisso internacional assumido pelo Brasil
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A decisão do governo de Jair Bolsonaro de excluir a sociedade civil da reavaliação do Plano Nacional de Direitos Humanos ameaça violar um dos pilares do sistema internacional de direitos humanos, guias estabelecidos pela ONU e mesmo compromissos assumidos pelo Brasil.
Na semana passada, o governo anunciou a criação de um grupo de trabalho para propor mudanças nas políticas de direitos humanos no país. O programa, criado em 2009, estabelece diretrizes sobre a proteção de direitos e liberdades, e tem sido a base para políticas de proteção e promoção dos direitos humanos.
Numa portaria de 10 de fevereiro de 2021, o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos estabeleceu que a iniciativa que irá revisar o plano contará com 14 pessoas, todas da pasta liderada por Damares Alves. Imediatamente, ativistas protestaram.
O regulamento ainda proíbe a divulgação de qualquer informação sobre as discussões do grupo até o encerramento de suas atividades, em novembro. Representantes de entidades públicas ou privadas poderão ser convidadas para as reuniões, mas sem direito a votar.
A iniciativa se contrasta com as regras estabelecidas na ONU para a formulação de políticas de direitos humanos. Em 1993, a Declaração de Viena da qual o Brasil faz parte recomenda aos governos que garantam a participação pública nos debates e nas decisões sobre estratégias nesse setor.
Uma década depois, em 2002, a ONU publicou uma guia para ajudar países a desenhar planos nacionais de direitos humanos. A cartilha alerta que tais processos devem contar com um amplo e intenso processo de consultas com a sociedade civil e o público em geral.
"Um plano de ação nacional deve desempenhar um papel central para a sociedade civil", recomenda o guia. "Ele deve abranger a mais ampla gama de participantes de todos os setores da sociedade - ONGs de direitos humanos e organizações comunitárias de todos os tipos, assim como indivíduos relevantes", defende. "Um processo de consulta eficaz durante o desenvolvimento do plano incentivará uma compreensão e aceitação mais ampla do mesmo. O processo de consulta é crucial para a credibilidade e, em última instância, para a eficácia do plano", completa.
No texto, a ONU ainda deixa claro: sem o envolvimento da sociedade civil, o risco de um fracasso dos planos é real.
O guia de 2002, de fato, chega a usar o Brasil como exemplo. De acordo com a ONU, a elaboração do Plano Nacional de Direitos Humanos, de 1997, seguiu as melhores práticas internacionais. "Ele foi preparado durante um período de dois anos pelo Ministério da Justiça, junto com diversas organizações da sociedade civil. A preparação incluiu seminários e debates", ressaltou o guia.
Damares na ONU
Hoje, porém, o Brasil desembarca com uma outra imagem no cenário internacional. A polêmica ocorre às vésperas do discurso de Damares Alves na ONU. A ministra indicou que irá participar, por vídeo conferência, da primeira reunião do ano do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. Segundo a pasta, ela irá relatar aos demais países os "avanços" que promoveu no país nesse setor durante o ano de 2020 e indicar as ações tomadas pelo governo brasileiro diante da pandemia da covid-19.
Mas Damares falará num momento de intensas críticas. No início da semana, sua iniciativa foi denunciada pela entidade Human Rights Watch, que alertou que o governo "deve garantir que quaisquer discussões sobre mudanças das políticas de direitos humanos no país ocorram de forma transparente, com amplo debate e participação da sociedade civil e dos grupos envolvidos".
"O governo Bolsonaro, que vem promovendo uma agenda anti-direitos, anunciou que planeja mudar o Programa Nacional de Direitos Humanos em segredo absoluto e sem a participação de qualquer um que discordar de suas políticas", disse Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil. "Tendo em vista o histórico deplorável do governo em relação aos direitos humanos, existe um risco real de que o resultado desse processo secreto seja desastroso para a proteção desses direitos no Brasil."
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