Topo

Jamil Chade

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Brasil se diz preocupado com bombardeios, mas critica armas para Ucrânia

O engenheiro Oleg Rubak, 32, perdeu a esposa, Katia, de 29 anos, após a casa dele ser destruída por bombardeio da Rússia em Jitomir, na Ucrânia - Emmanuel Duparcq/AFP
O engenheiro Oleg Rubak, 32, perdeu a esposa, Katia, de 29 anos, após a casa dele ser destruída por bombardeio da Rússia em Jitomir, na Ucrânia Imagem: Emmanuel Duparcq/AFP

Colunista do UOL

03/03/2022 12h46

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

O governo brasileiro usou a reunião de emergência do Conselho de Direitos Humanos da ONU, nesta quinta-feira, para lançar críticas veladas tanto aos russos como às potências ocidentais, alertando que o caminho adotado por ambos os lados ameaça ampliar a guerra.

"O Brasil acompanha com extrema preocupação a situação atual na Ucrânia. Expressamos nossa grande preocupação com o elevado número de vítimas civis relatadas e com os milhões de refugiados e pessoas deslocadas internamente", disse o embaixador do Brasil na ONU, Tovar da Silva Nunes, qualificando a situação de um "triste momento de nossa história".

O encontro foi convocado, inclusive com o voto do Brasil, com o objetivo de aprovar uma resolução que irá criar uma comissão internacional de inquérito para examinar eventuais crimes na Ucrânia. O governo russo rejeitou a iniciativa e, nesta quinta-feira, criticou os demais países.

O Brasil, que vem tomando uma postura de equilíbrio, apoiou uma resolução na Assembleia Geral da ONU criticando a Rússia. Mas, após o seu voto, tomou a palavra para questionar a estratégia dos países ocidentais.

Agora, uma vez mais, o tom do Itamaraty foi o de alerta sobre o risco de que as atuais medidas ampliem a guerra.

Sem citar o nome de Putin

Num dos trechos do discurso na ONU nesta quinta-feira, o Itamaraty criticou a Rússia. Mas não citou nem o nome do país e nem de seu presidente, Vladimir Putin.

"As preocupações de segurança de qualquer Estado não podem permitir o uso da força contra a integridade territorial e a independência política de outro. O Brasil não tolerará qualquer violação da Carta da ONU e dos princípios básicos do direito internacional, incluindo o direito humanitário internacional e os direitos humanos", disse o embaixador.

Em Moscou, é justamente o argumento da segurança da Rússia que é usada como argumento para a invasão.

O Itamaraty também demonstrou mal-estar diante dos ataques contra cidades ucranianas. Mas, uma vez mais, não citou o nome da Rússia.

"Relatos de bombardeio pesado em áreas densamente povoadas e de ataques contra a infraestrutura civil são particularmente e profundamente perturbadores", disse o diplomata.

Em seu discurso, porém, o representante do governo brasileiro também criticou o comportamento de potências ocidentais e mesmo do governo ucraniano.

"O fornecimento de armas, as sanções unilaterais e a participação direta de civis em hostilidades podem apenas aprofundar esta crise, em vez de superá-la", alertou. Nos últimos dias, governos europeus anunciaram o envio de armas para Kiev, enquanto o governo local armou mais de 30 mil civis para ajudar na guerra.

Contra a discriminação de refugiados

Ao falar ao Conselho, o Itamaraty também fez um apelo para que os governos da região e vizinhos da Ucrânia não promovam uma discriminação entre os refugiados. "Todos aqueles que fogem do conflito devem ser ajudados, independentemente de nacionalidade, raça, etnia ou status migratório", disse o embaixador.

A ONU confirmou que, nos últimos dias, vem recebendo relatos de dificuldades enfrentadas por africanos e não-europeus para entrar em países como a Polônia.

Para o Brasil, o momento é de buscar também um espaço para negociação. "O Brasil apoiou este debate urgente porque, de acordo com seu mandato, é dever deste Conselho "responder prontamente às emergências de direitos humanos". É também nosso dever "contribuir, através do diálogo e da cooperação, para a prevenção das violações dos direitos humanos"", explicou o diplomata.

"O equilíbrio entre estes dois aspectos de nosso mandato é fundamental para enfrentar efetivamente uma crise que pode ter implicações ainda mais amplas e perigosas", alertou. Ele ainda insistiu que "salvar vidas e garantir o acesso à ajuda humanitária, especialmente entre os mais vulneráveis, deve continuar sendo nossa prioridade". A mensagem foi recebida como um apelo para que o debate não seja politizado.