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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Documento revela reprovação do governo Bolsonaro por potências estrangeiras

Colunista do UOL

12/11/2022 11h33

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Algumas das principais potências ocidentais irão deixar claro seu repúdio às políticas de Jair Bolsonaro, questionando temas como a proteção da Amazônia, situação indígena, violência contra a mulher, ataques contra o movimento LGBT+, jornalistas e mesmo a violência política durante a eleição presidencial.

Nesta segunda-feira, o governo de Jair Bolsonaro será sabatinado na ONU e, durante mais de três horas, governos de todo o mundo, entidades internacionais e nacionais farão um exame do que foi a política de direitos humanos do país.

Documentos submetidos para a ONU e ao governo brasileiro, porém, revelam que autoridades estrangeiras não irão poupar críticas contra Bolsonaro e acenam para uma reprovação internacional da gestão que foi derrotada nas urnas.

Pelo sistema da sabatina - oficialmente chamada de Revisão Periódica Universal - governos de todo o mundo são convidados a fazer perguntas e apresentar recomendações ao país examinado. Mas com o governo brasileiro chegando ao final, as perguntas enviadas pelos países ao Brasil são consideradas como uma forma de - diplomaticamente - criticar Bolsonaro e escancarar o fato de que a comunidade internacional não está satisfeita com o que é feito internamente no país.

A escolha dos temas a serem questionados, portanto, é interpretado como revelador da crise de credibilidade do Brasil no mundo. Ao fazer perguntas, o que essas capitais ainda apontam é para a direção que esperam que caminhe o governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, pelo menos no que se refere aos direitos humanos.

"A lista de cobranças é um atestado de óbito de um governo que sistematicamente violou os direitos humanos", admitiu um dos diplomatas envolvidos na elaboração do questionamento.


Dom e Bruno

Uma das cobranças mais fortes veio do governo do Reino Unido. Em suas perguntas enviadas ao Itamaraty, Londres fez questão de citar as mortes de Dom Phillips e Bruno pereira, na Amazônia. A diplomacia britânica cobra de Bolsonaro respostas sobre quais medidas ele tomou "para enfrentar os crimes ambientais e fortalecer sua proteção aos defensores do meio ambiente e dos direitos humanos na Amazônia no Brasil".

Em outro trecho, Londres também alerta sobre a violência política. "Considerando os casos de violência política na corrida para as eleições presidenciais no Brasil, como o Governo Federal do Brasil planeja reforçar os direitos de seus cidadãos a fazerem campanha livre e pacífica no futuro?", questionou.

Em outra cobrança, Londres quer saber como o "governo planeja fortalecer a prestação de assistência de justiça às vítimas de violência policial", uma forma de denunciar justamente as operações em comunidades nas periferias das grandes cidades do país.

Os britânicos ainda alertam que, dada a situação enfrentada pela comunidade LGBT+ em todo o Brasil, querem saber quais são os planos do governo de "criar mecanismos para incluir pilares para a promoção da diversidade sexual e dos direitos humanos em um espectro de políticas nacionais".

Já o governo da Suíça cobrou respostas diante do "aumento significativa do desmatamento ilegal, a invasão de territórios protegidos e a degradação do meio ambiente como resultado de atividades ilegais".

Berna ainda quer saber quais mecanismos o governo tem implementado para "reduzir o caso da violência por forças policiais, principalmente contra afrobrasileiros".

Governo Biden cobra respostas sobre violência

No caso do governo dos EUA, o que as autoridades americanas querem saber é como está sendo implementado os mecanismos para a proteção de defensores de direitos humanos no Brasil.

A Casa Branca também destaca a situação do movimento gay. "Com dados domésticos mostrando que o Brasil é o país mais mortífero do mundo para pessoas LGBTQI+, o que o Governo do Brasil está fazendo para combater a violência contra membros dessa comunidade?", perguntou.

O meio ambiente também está na lista de cobranças de Biden. "Que medidas o governo está tomando para adotar um plano de ação eficaz para a demarcação e proteção das terras indígenas?", completou.

O assunto também fez parte da lista de cobranças enviadas pelo governo de Berlim. "A Alemanha gostaria de saber que medidas o Brasil planeja tomar para proteger efetivamente o território dos povos indígenas contra invasões, especialmente no que diz respeito ao possível emprego de forças de segurança estaduais e federais", questionou.

"Em seu relatório de 2021 sobre a situação dos Direitos Humanos no Brasil, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos observou que "a situação dos povos e comunidades indígenas é grave e preocupante" e que eles "enfrentam ameaças de invasão de seus territórios" e "na maioria das vezes, [...] carecem da proteção estatal de que necessitam", apontou. Berlim, portanto, quer saber o que foi feito nesse sentido para superar tal situação.

O governo do Canadá também fez uma cobrança no mesmo sentido. "Que medidas o Brasil está tomando para avançar no processo de demarcação de terras indígenas e estabelecer consultas significativas com os Povos Indígenas?", questionou.

Os canadenses ainda revelaram preocupações sobre a violência contra a imprensa, um dos elementos constantes de Bolsonaro durante seus quatro anos de governo. "Que ações o Brasil está tomando para garantir a proteção dos jornalistas e trabalhadores da mídia que têm enfrentado ataques e assédios contínuos", perguntou.

Na Espanha, a preocupação se refere ao "alarmante número de casos de violência contra as mulheres", enquanto outros questionamentos ainda foram feitos por países como Panamá, Portugal, Uruguai, Eslovênia e outros.

No caso das perguntas enviadas pelo governo da Bélgica, o interesse está no tratamento dado à comunidade LGBTQI+, aos indígenas e críticas contra a violência policial durante operações em favelas.

Delegação brasileira terá de dar respostas

O exercício ocorre com todos os membros da ONU e, no caso brasileiro, já estava agendado para ser realizada no final de 2022. A sabatina - conhecida como Revisão Periódica Universal - ainda verá países apresentando recomendações ao novo governo brasileiro, sobre como restaurar políticas de direitos humanos.

Durante a revisão, a delegação brasileira será chefiada pela atual ministra de Direitos Humanos, Cristiane Britto, que esteve ao lado do presidente quando ele fez seu primeiro pronunciamento após a derrota nas eleições.

O sistema de sabatinas existe para que o mundo possa cobrar melhorias em termos de direitos humanos em um país. Recomendações são feitas e os estados tem a obrigação de dar respostas, quatro anos depois,

No caso da revisão do Brasil, o processo ganha um outro componente, com uma espécie de oportunidade para que países que foram humilhados ou criticados por Bolsonaro deem suas respostas.